Novas pesquisas e variedades querem elevar e incentivar a produção de laranja e tangerina “in natura”, que hoje passam por avaliações antes de serem plantadas.
Frutas para consumo exigem uma série de características que agradem o consumidor. Essa é uma ideia que tem de estar bem clara para o melhorista e, principalmente, para os produtores. Assim sendo, um bom planejamento, desde a escolha da variedade, local de plantio, técnicas de manejo e o mercado a ser atingido, é um fator que garante o sucesso do empreendimento. Estas e outras informações encontram-se no trabalho “Citricultura de mesa”, dos pesquisadores do Instituto Agronômico de Campinas (IAC), Fernando Alves de Azevedo, Rose Mary Pio e José Dagoberto De Negri. Segundo eles, o Brasil é o maior produtor de citros do mundo, sendo São Paulo o destaque na produção.
Entretanto, o que é produzido neste Estado está voltado basicamente para uma citricultura de indústria, ou seja, o mercado do suco de laranja. Já o restante deste, o in natura, exige hoje frutos sem sementes, quer sejam de laranjas ou tangerinas, sendo que a demanda também é que elas sejam fáceis de descascar.
“O Brasil, antes da instalação das indústrias de suco em São Paulo e do incentivo dos americanos para a produção de frutos de variedades para a produção da bebida, exportava a variedade de laranja bahiae, por conta da preferência dos ingleses por frutos menores, foi selecionada a baianinha, que surgiu de uma mutação da própria bahia”, afirma Azevedo.
O pesquisador diz que atualmente São Paulo e outros Estados brasileiros vêm incentivando seus produtores a plantarem variedades de mesa, disponibilizadas pelo trabalho “Citricultura de mesa”, e que poderão fazer com que o Brasil também figure como um grande produtor e exportador desse tipo de fruta.
As variedades encontradas hoje no setor de citros passam por um grande destaque na área das laranjas, que mostra ser principal fruta do segmento. Encontram-se entre elas, tipos usados para a extração de suco como, por exemplo, laranja-pera, valência, natal e hamlin; as laranjas sem acidez como, laranja lima, serra d´agua, entre outras; as de umbigo que são as bahia e as de mesa que são compostas pelas laranjas baia, navel, baianinha, entre outras.
De acordo com o pesquisador do Centro de Citricultura do IAC, Rodrigo Rocha Latado, que publicou recentemente um trabalho focado na variedade sanguínea, as laranjas podem ser divididas em dois grandes grupos, em função da coloração da polpa. São elas, as brancas ou claras e as sanguíneas. “As claras seriam caracterizadas por uma coloração alaranjada na polpa e no suco, devido a presença de carotenoides, que são pigmentos com cor que podem variar entre o amarelo e o vermelho. Caratenoides de modo geral, possuem baixa solubilidade em água e elevada solubilidade em solventes orgânicos”, esclarece.
Já sobre as sanguíneas, ele explica que são caracterizadas pela coloração vermelho-intensa da polpa e do suco, devido à presença do pigmento antocianina, solúvel em água. “As antocianinas são pigmentos pertencentes à família dos flavonoides e possuem uma série de funções na natureza, tais como a proteção de plantas contra o ataque de patógenos, proteção contra os danos causados pela radiação UV e a pigmentação de flores, frutos e sementes, com as finalidades de atração de insetos polinizadores e de dispersão de sementes” diz o pesquisador.
Latado conta que estes compostos têm grande importância na dieta humana, pois participam na constituição de cores e sabores dos alimentos e podem ser consideradas também como agentes terapêuticos. “Antocianinas possuem ainda a capacidade de proteção contra o estresse oxidativo, doenças do coração, certos tipos de câncer e outras doenças relacionadas, devido a capacidade de inativação de radicais livres”.
O pesquisador cita que as variedades sanguíneas mais conhecidas e utilizadas não só no Brasil, mas em todo mundo, são as tarroco, moro, sanguigno doppio, sanguinella e sanguinelo.
“Essas ainda não podem ser comercializadas. Apesar de estarem registradas, ainda estão passando por avaliação”, conta Latado. A única variedade das sanguíneas que já está em produção semicomercial é a do tipo mombuca. “Existem alguns talhões plantados com um número entre três e cinco mil plantas. A indústria de suco está interessada nessa produção, e logo esse interesse vai se difundir pelos produtores.”
O pesquisador diz que ainda não existem relatos disponíveis sobre o potencial produtivo e da caracterização agronômica das sanguíneas no Brasil e que nesse sentido, centros de pesquisas tem ampliado uma rede experimental em diferentes regiões do Estado de São Paulo, para avaliação desse grupo. “Com isso, será possível examinar o efeito do clima no desempenho agronômico destas variedades e nas características físicas e químicas dos frutos, visando identificar e selecionar os materiais superiores e as melhores regiões para o cultivo comercial, o que poderá resultar no lançamento de novos tipos variáveis.”
Quanto à presença da coloração violácea (roxo, arroxeado) e a sua intensidade na polpa, Latado diz que isto depende de vários fatores, mas que o principal deles fica por conta do clima da região em que são cultivadas as frutas. Regiões de clima ameno e (ou) que apresentam maior amplitude térmica diária são as que mais favorecem a formação de frutos com maiores teores de antocianina, resultando numa coloração mais intensa. “Isto pode ser comprovado pelo fato de várias variedades sanguíneas apresentarem frutos com forte coloração arroxeada quando cultivadas nas regiões de clima mediterrâneo e apresentarem frutos com coloração vermelha clara, quando cultivadas em regiões mais quentes como, por exemplo, no município de Cordeirópolis, em São Paulo”, conta Latado.
Em contrapartida
Outra que aparece bem no cenário nacional é a tangerina. O estudo mostra que elas representam um grupo que se presta basicamente para consumo como fruta de mesa. “No Brasil, poucas variedades comerciais pertencem a esse grupo, o que faz com que a participação do País no mercado externo seja irrisória e poucas opções são dadas aos consumidores brasileiros” diz Azevedo.
As tangerinas ponkan e murcottrepresentam 80% dos plantios no Estado de São Paulo, fazendo da região a maior produtora. Já a mexerica-do-riotem pouca representatividade nos pomares paulistas, mas ganha destaque na citricultura gaúcha com a obtenção de variedades adaptas ao Rio Grande do Sul.
A cravo foi de extrema importância no passado, porém, hoje mesmo apresentando características de sabor bastante adequadas para consumo in natura, tem presença de pouca expressão no mercado. A causa disto deve-se ao fato de se tratar de uma variedade precoce, ou seja, como os produtores antecipam demasiadamente a sua colheita – colhendo os frutos ainda verdes – acabam por inviabilizar a compra da variedade pelos consumidores.
Latado declara que grande parte dos citros tem seus determinados períodos de plantio e, como em qualquer cultura, existem as que são colhidas antes da hora. “A tangerina cravo é a mais precoce, porque o desejo de consumir é grande e a primeira fruta que chega ao mercado é que te mais valor. Mas, colhê-la antes a deixa com sabor um pouco alterado”. A época de colheita depende do local em que a fruta é plantada. “Em meados de abril e maio já a venda dela. Quem quer dinheiro com fruta tem de produzir fora de época, mas isso não é uma tarefa fácil, porque, dependendo do local, não é possível fazer a plantação”, explica.
As variedades de mesa, diferentemente daquela voltada para a industrialização, requer um manejo muito grande e intenso de ações diferenciadas, para obter seu fim maior com uma fruta de qualidade. Isso faz com que se possa classificá-la muito melhor como uma fruticultura de mesa. “O conjunto de ações ou atitudes desenvolvidas no pomar podem ser definidas como práticas ou tratos culturais, o que, em última análise, denominamos manejo do pomar. Nessa abordagem, levam-se em consideração apenas as principais práticas que devem ser empregadas nos pomares para fruta fresca sem, minimizar a importância das demais operações”, esclarece Azevedo.
Segundo Latado, a citricultura no Brasil é quase toda baseada para indústria, porque quem produz citros para mesa são outros países que tem clima mais apropriado. “Fruta de mesa precisa ter casca, cor, e sabor. Por aqui, o que chamamos de indústria, na verdade é a fruta de mesa que vai para indústria virar suco”. Para ele, o País não tem clima pra competição internacional, mas não está preocupado com isso, porque o mercado brasileiro da fruta de mesa em grande parte é voltado para a venda interna, com isso ele se torna suficiente.
Sementes zero!
As variedades sem sementes, tanto de laranja quanto de tangerina são importantes para o comércio local e principalmente para a exportação. Sobre isso, o pesquisador diz que para mercado de mesa, o objetivo é pegar as variedades do Brasil e produzir sem sementes. “Atualmente a laranja-pera, que já tem poucas sementes, tornou-se a principal opção do produtor. Se tem um grande interesse nela e o melhor de tudo é que mesmo tirando suas sementes, ela não perde o gosto”, declara.
Já as variedades sem sementes da tangerina, principalmente as clementinas, são as mais importantes para o comércio local e principalmente para a exportação. As diversas seleções de clementinas permitem uma ampliação do período de safra atendendo, dessa maneira, principalmente o mercado europeu em boa parte do ano. Dentre as variedades cultivadas pode-se destacar fina, nules, esbal, oroval, marisol, entre outras. Além das seleções de clementinas, no Brasil, alguns híbridos de tangerinas têm se mostrado com bom potencial em países da Europa e Ásia e Oceania.
Atenção dobrada na lavoura
Assim como qualquer boa cultura, os produtores de citros também devem sempre estar alerta às doenças que invadem os pomares. E para isso o pesquisador do Fundo de Defesa da Citricultura (Fundecitrus), Silvio Lopes, coordenador de mestrado sobre controle de doenças e pragas do citros, aponta que são quatro as principais doenças que atingem as plantações destas frutas. “As doenças de huanglongbing ou greening, cancro cítrico, leprose e clorose variegada dos citros (CVC), são as piores doenças que o produtor pode enfrentar. Claro, que não podemos esquecer que há também doenças causadas pelos fungos, como, por exemplo, a pinta preta que atinge as frutas manchando-as. Com isso, perde-se o valor comercial da fruta além de derrubar os frutos pelo campo, causando perdas”, diz. A podridão floral também pode preocupar por derrubar o fruto antes mesmo de se formar, pois a doença derruba a flor. Segundo o pesquisador, as duas são doenças manejáveis, e com o tratamento adequado pode-se minimizá-las.
Em relação à tecnologia, Lopes disse que agir preventivamente e usar todos os meios tecnológicos disponíveis são de extrema importância. “Novos produtos vem sendo testados e as vistorias estão sendo ajustadas para entrar no pomar. Há épocas em que os sintomas ficam mais evidentes e hoje existe um aumento na densidade de plantio. Antes eram 300 plantas por hectare, atualmente este número encontra-se na casa das 600 a 700 plantas”, afirma.
Por fim, Lopes diz que o produtor tem de estar bem informado, independente se ele está começando ou se já está há muito tempo no plantio de citros e que hoje a tecnologia está ao alcance de todos. “Existem diversos cursos desenvolvidos para ajudar os produtores. Os cursos têm como objetivo aperfeiçoar quem já conhece as doenças e ajudar a quem está começando”.
Doenças
– Greening: É causada por bactéria, não tem cura. As maneiras de proteger o pomar são eliminando plantas doentes e buscar reduzir o inseto causador da doença. É muito difícil reduzir a população da doença, pois ela se espalha muito rápido e requer ação conjunta pra minimizar as perdas. Considerada por muitos como a pior doença de todas.
– Canco Cítrico: É causada por bactéria e pode sobreviver até fora da planta, O manejo envolve arrancar a planta doente e as plantas próximas, num raio de 30 metros. O produtor tem que sempre estar alerta antes de entrar no pomar, sempre lavando a mão para não levar as doenças que vem de fora para dentro do pomar.
– Leprose: Doença causada por vírus e por um acaro que vive nas plantas. Desta maneira, o vírus é transmitido de uma parte pra outra das folhas. O controle é via acaricida, e é necessário eliminar as partes doentes.
– Clorose Variegada dos Citros (CVC): É causada por bactéria e vive dentro da planta, mais especificamente em seu sistema vascular e é disseminada por insetos. Causa diversos danos como, os frutos ficam pequenos e duros, gerando assim queda na produção. A doença foi descoberta em São Paulo e hoje se encontra em todo Brasil.