A grande procura por sementes é resultado do bom momento vivido pelo mercado, porém, há sempre ameaças para as próximas safras.
Como em toda a boa safra, na época de comprar sementes se o mercado estiver inflacionado, é sinal que tem muito produtor adquirindo, o que deve resultar em uma safra grande e automaticamente preços baixos. Mas, se for o contrário e as sementes estiverem com preço baixo, indica que a demanda é fraca e, portanto, a safra será pequena, mas os preços, em contrapartida, podem surpreender. A regra não contabiliza as condições climáticas durante o desenvolvimento das lavouras, que podem exercer grande influência sobre a produtividade e os preços, mas, ainda assim, nunca falha, garantem os agricultores.
Essa situação foi vivida pelos produtores de feijão no sudoeste goiano, em julho deste ano. Na região foram colhidas cerca de 20 mil toneladas de feijão, durante a segunda safra, que foi plantada em abril. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que a média de produção ficou em torno dos 35 sacos por hectare. A saca de 60 quilos que começou a ser comercializada a R$ 85 já alcança R$ 150. Em janeiro deste ano, o preço chegou a R$ 200.
Os preços do feijão carioca subiram 15,30% no período de referência do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA-15), fechando alta de 66,53%. A redução de áreas plantada, que deram espaço para a soja e o milho, e a queda da safra nas regiões produtoras em função de problemas climáticos motivaram os agricultores que haviam deixado a cultura de lado a voltar a trabalhar com a leguminosa. Mas é aí que pode surgir o gargalo. Analistas acreditam que isso ocasiona alta dos preços.
De acordo com Alessandro Cruvinel, gerente adjunto de mercado Embrapa Produtos e Mercado, o preço do produto oscile muito em comparação às demais culturas. Típico da alimentação brasileira, o feijão é cultivado por pequenos e grandes produtores em todas as regiões e “diferente das commodities, nas quais os preços são regidos pelo mercado internacional, a leguminosa não tem válvulas externas que regulam o mercado”, diz Cruvinel.
Outro problema que isso pode gerar é um déficit do produto destinado para semente. O bom preço do feijão faz com que o produto destinado como semente seja vendido como grão. A possibilidade do aumento de área também infelizmente estimula o uso de sementes fora do sistema de certificação legal que na prática pode gerar lá na frente produtividade mais baixa.
No mercado da região sudoeste goiano, em Rio Verde, por exemplo, município distante a 238 quilômetros da capital Goiana (GO), o quilo do feijão cultivado para semente é mais bem caro por volta de R$ 5,00 a R$ 7,00. “E nesse momento, que o sementeiro se beneficia para garantir rentabilidade”, afirma.
Para o mercado, a expectativa de maior plantio na safra que vem se deve a ação de agricultores que tradicionalmente, plantam feijão apenas quando o mercado sinaliza bons preços como aconteceu em janeiro deste ano, quando a saca bateu o preço recorde. Conclusão: “A oscilação de preço resulta em oscilação de demanda por sementes que aliado ao uso de sementes fora do sistema de certificação, resulta um setor não muito organizado”, afirma.
Um problema que segundo ele pode ser evitado. “Teria que haver um planejamento antes da produção e com o maior uso de sementes certificadas haveria o estímulo ao setor sementeiro em garantir o suprimento”, diz Cruvinel.
Para o agricultor Flávio Faedo, que mantém uma propriedade com 2.200 hectares, no município de Rio Verde, e cultiva milho, soja e feijão, a situação já foi normalizada pelo menos nesta segunda safra. “Não houve tanta especulação como se fala por aí”, diz. “Tivemos uma produtividade alta. O clima foi desfavorável no início do ano, já no final de maio a chuva que caiu ajudou a compensar as perdas iniciais”, afirmou Faedo.
No último levantamento da Conab, realizado em junho, a área cultivada com feijão na safra 2011/2012 deve ficar em 3,4 milhões de hectares, 14,7% menos que a safra anterior. A produtividade média da safra nacional de feijão está projetada para 873 kg/h, 6,6% menor que na última temporada. Mais da metade, ou 65% da produção nacional, se refere ao feijão-carioca, entre 15% e 17% ao preto e 15% é de feijão-de-corda. Dados do Ministério da Agricultura apontam que o Brasil é o maior produtor mundial de feijão com produção média anual de 3,5 milhões de toneladas.
Atualmente, no Brasil a periodicidade da cultura é dividida em três partes, sendo estas “feijão das águas”, seca e de inverno. No município de Rio Verde, 1.500 hectares da leguminosa já foram colhidos, agora existem áreas irrigadas, com previsão de colheita no mês de setembro. Para a próxima safra, a situação é incerta. “Com os preços do milho e da soja também valorizados, os produtores podem preferir esses grãos em detrimento do feijão”, diz Cruvinel.
Em outras culturas, o problema se repete
Em janeiro deste ano, não foram só as sementes de feijão que fizeram faltam. Muitos produtores não conseguiram comprar as sementes da variedade que gostaria. A forte demanda por sementes de milho de alta tecnologia para a atual safra provocou escassez de alguns tipos de produtos no Estado do Mato Grosso, por exemplo. A aposta em mais um período de bons preços incentivou os produtores a buscar híbridos de melhor qualidade, o que pegou a indústria de surpresa.
No município de Sorriso, Mato Grosso, as distribuidoras de sementes, confirmaram a falta do produto. E com a ausência ocorre o seguinte problema: o produtor é surpreendido com o cancelamento de vários contratos. “Quem optou por plantar uma variedade de alta produtividade, pagou mais caro. Tem produto que subiu até 30%”, explica Naildo Lopes, coordenador da Comissão Gestão da Produção da Aprosoja.
Ele concorda também que com o avanço da demanda, há oferta de produtos de qualidade inferior. “Com medo de faltar no mercado as empresas vendem o têm. Daí, surgem as sementes com baixa qualidade e a ascensão das clandestinas”, diz. Agora está todo mundo ouriçado, mas o excesso de área plantada gera outra situação. “Na safra quem vem haverá uma oferta maior e com certeza a tendência será dos preços caírem”, diz Lopes. A afirmação parece ser verdadeira, uma vez que os ciclos se repetem sem que os produtores adotem estratégias diferenciadas para evitar perdas em anos de safra gorda e preço baixo ou optem por novas lavouras.
Por outro lado, alguns agricultores que começaram a comprar insumos e sementes para o plantio do ano que vem estão verificando preços muito superiores aos praticados no ano passado, o que pode refletir aumento de demanda e intenção de plantio maior na próxima safra.