Agricultura

Geração de supermilhos

Cultivares mais produtivas, resistentes ao ataque de insetos, tolerantes a herbicidas e ricas em nutrientes. Essas são as características dos novos milhos que já estão dispostos para a produção no campo.

O mais recente lançamento em cultivares de milho no País, da Dow AgroSciences, é transgênico e possui cinco genes estaqueados na cultivar, com a promessa de ampliação no controle de pragas, aliada à resistência a dois tipos de herbicidas. Em outra variedade, igualmente transgênica, a Syngenta introduziu três eventos biotecnológicos que também conferem resistência ampla a pragas e herbicidas. Já em termos nutricionais, a Embrapa Milho e Sorgo, em Sete Lagoas (MG), desenvolveu uma cultivar com uma quantidade de pró-vitamina A cerca de quatro vezes superior à encontrada em cultivares comuns do cereal.

Todas essas tecnologias não fazem parte de projeções futuras, mas, sim, do presente. A variedade da Dow, apesar da estimativa de pouco volume, já estará disposta aos produtores na safra de verão de 2012/2013. O milho da Syngenta foi disponibilizado na safra 2011/2012. Quanto à cultivar da Embrapa, o lançamento será este ano, no entanto uma produção semelhante obtida em campos experimentais já tem servido a população de Capim Branco, cidade com menos de 10 mil habitantes próxima a Sete Lagoas, na região central de Minas.

Núcleo de força

Sob a marca Powercore, termo em inglês que pode ser associado à ideia de núcleo de força, a Dow AgroSciences lançou no início de abril deste ano, o segundo evento em biotecnologia da empresa, aprovado em 2010 pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), órgão vinculado ao Ministério de Ciência e Tecnologia (MCT). Trata-se da primeira variedade transgênica a ser comercializada no Brasil a qual possui cinco genes fixados na planta. Dois destes – cp4 epsps e pat – conferem tolerância aos herbicidas com princípio ativo glifosato e glufosinato de amônio, respectivamente. A tecnologia é um advento das empresas Monsanto e Dow AgroSciences.

Os outros três – cry1A.105, cry2Ab2 e cry1F – codificam proteínas na planta que influem como antagonistas para a ordem de insetos lepidópteros, especificamente para a lagarta-do-cartucho (Spodoptera frugiperda), a broca-do-colmo (Diatraea saccharalis), a lagarta-da-espiga (Helicoverpa zea), a lagarta-elasmo (Elasmopalpus lignosellus) e a lagarta-rosca (Agrotis ipsilon). “A associação de mais genes numa mesma planta potencializa o controle de pragas”, afirma Antonio Cesar Santos, coordenador de Projetos de Biotecnologia para a América Latina e gerente de Pesquisa e Desenvolvimento da Dow AgroSciences. “Uma proteína que controla bem uma praga, por exemplo, não possui a mesma eficácia no controle de outra. Nesse sentido, a associação de outra proteína aumenta a proteção da planta. Então, com a união desses três genes, garantimos um maior espectro de ação”.

Outro aspecto destacado por Santos está ligado à longevidade da tecnologia em função de uma possível quebra de resistência por parte de gerações futuras dos insetos. Calcula-se que uma cultivar que tenha apenas um evento biotecnológico gere um indivíduo resistente na proporção de um para um milhão. Já, com três, essa proporção vai de um para um bilhão.

Em comparação à lavoura convencional sem tratamento nenhum, o aumento da produção chegou a 11,8% em ensaios feitos pela empresa num total de 50 áreas nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste. Outro avanço da tecnologia incide na diminuição da área de refúgio exigida no plantio de organismo geneticamente modificado (OGM). A área de espécies convencionais, que antes tinha de ser de 10% do total cultivado por transgênico, passa a ser de 5%. O refúgio é uma prática recomendada em casos de implantação de lavouras OGM. Aliado a demais técnicas, esse procedimento diminui o aparecimento de resistência das pragas-alvo. “O importante, nesse caso, é destacar que as faixas de plantas convencionais têm de ficar até 800 metros de distância da área de transgênicos”, ressalta Santos.

Da pesquisa à aprovação, Powercore levou cerca de oito anos com um investimento de US$ 800 milhões. A promessa é para daqui a quatro ou cinco anos, a empresa lance uma nova variedade com oito eventos, o Smartstax. Além dos que já existem no lançamento deste ano também devem estar associados os genes cry34, cry35 e cry3B.

Do leite ao grão

O mais recente lançamento da Syngenta no mercado biotecnológico de milho foi o Agrisure Viptera 3 já disponibilizado na safra de 2011/2012. A cultivar, aprovada em 2010 pela CTNBio possui três eventos estaqueados – Bt11, MIR162 e GA21 e confere resistência a herbicida e a cinco espécies de insetos, a lagarta-do-cartucho, a lagarta-da-espiga, a broca-da-cana, a lagarta-rosca e a lagarta-elasmo. Com esta, já são quatro variedades transgênicas disponibilizadas aos produtores rurais do País. Além de Agrisure Viptera 3, também consta Agrisure TL, Agrisure TG (ambas tolerantes ao Glifosato) e Agrisure Viptera.

A concepção deste lançamento partiu da descoberta de uma estirpe de Bacillus thuringiensis (AB88) presente no leite. O micro-organismo, específico do solo, tem sido a grande fonte de genes para os adventos em transgenia na agricultura – é dele que se designa a nomenclatura Bt para alguns eventos em biotecnologia.

“Descobrimos que havia uma bactéria no leite que produzia uma toxina, que controla as lagartas que nós chamamos de lepidópteros”, explica André Bachiega, gerente de Marketing de Portfólio de Milho e Defensivos no Brasil da Syngenta. “Separamos essa enzima e identificamos o gene que a produz. Este foi introduzido em materiais que posteriormente foram produzidos em larga escala. Percebemos que esse seria um novo mecanismo de ação, pois todo o controle de insetos, nos primeiros eventos biotecnológicos, estava baseado na proteína cry [Bt]”.

A partir dessa tecnologia, a empresa apresentou uma nova opção transgênica – o Vip3A – que aumenta o espectro de controle. Além disso, Bachiega ressalta o impacto da ferramenta na redução da incidência de grãos ardidos. O problema é caracterizado pelo ataque de fungos à espiga. “Quando há menor infestação de lagartas – estas que atacam as espigas e abrem caminho para os fungos – há também a redução do grão ardido. Como essa tecnologia controla melhor estes insetos, eles não atacam as espigas e por isso não existe tanta abertura para o fungo. Um benefício que pode ser visível na hora da colheita”, atesta.

Para o Brasil, o milho tem ganhado uma expressiva importância desde que o produto obteve destaque na pauta de exportação. De acordo com Marconi Dias, gerente de Marketing de Milho para a América Latina da Syngenta, com o maior estímulo no mercado, o produtor passa a requerer mais recursos tecnológicos para aumentar a produção e a produtividade na lavoura. “O motivo pelo qual há esse investimento maior na cultura de milho do que, por exemplo, na soja, é porque o cereal atualmente é um dos principais fatores de alimentação humana no mundo. Os Estados Unidos são o grande produtor, no entanto, parte dessa produção é revertida em etanol, já a outra parte é considerada a matriz de alimentação tanto para o consumo humano como para a indústria de ração para fazer a verticalização em carne frangos e suínos”. Como a oferta não tem acompanhado a demanda, o produto tende a se valorizar ainda mais, aliada a ideia de pressão por mais alimentos daqui para frente, em função de todos os prognósticos de aumento da população mundial e a escassez dos recursos naturais.

Supernutritivo

A força no campo convencional está na ênfase em geração de variedades que agreguem o maior valor nutricional dos alimentos. O Milho Pró-vitamina A sai de uma leva de produtos obtidos pelo Projeto BioFORT que conduz pesquisas em biofortificação de alimentos ao redor do mundo. Aqui no Brasil, os estudos têm sido conduzidos por várias unidades da Embrapa há cerca de sete anos, cada qual com o desenvolvimento de variedades que apresentem maiores valores em termos nutricionais. Desse projeto já foram disponibilizadas cultivares de mandioca e de batata-doce com altos teores de vitamina A e arroz, feijão e feijão-caupi mais ricos em ferro e zinco. O milho entra nesta listagem.

O cereal que ainda está em desenvolvimento pela Embrapa Milho e Sorgo possui uma quantidade de pró-vitamina A cerca de quatro vezes superior à encontrada em cultivares comuns em comparação à média mundial. A concentração de carotenoides precursores dessa vitamina nos grãos varia entre oito a nove microgramas por grama. “A média mundial dos milhos chegam a dois microgramas por grama, já aqui no Brasil, a média está em 2,5. A meta é podermos chegar a 15, mais isso ainda levar um pouco mais de tempo”, ressalta Paulo Evaristo Guimarães, pesquisador e um dos responsáveis pelo desenvolvimento da cultivar.

Em áreas experimentais na Embrapa Milho e Sorgo, a novidade vem produzindo bem. De coloração amarela intensa, a cultivar tem sido desenvolvida a partir de um trabalho de seleção onde os grãos que apresentam maior quantidade de pró-vitamina A são priorizados no processo de melhoramento. O processo foi feito com base em cruzamentos convencionais, dos quais eram selecionados as plantas que expressassem a condição de maior valor nutritivo. “Esse milho apresenta ciclo precoce e estamos muito otimistas com suas características agronômicas”, destaca o pesquisador. Entre elas, o período de florescimento é de cerca de 65 dias e 125 de maturação. Em boas condições e com bom nível de adubação, a produtividade chega a cinco toneladas por hectare.

A expectativa é que uma pequena parcela de sementes já estejam dispostas a produtores em meados de outubro a novembro deste ano. Enquanto isso, outra variedade tem já servido a população de Capim Branco. É o milho QPM BR 473, variedade também desenvolvida pela Embrapa Milho e Sorgo bastante produtiva, de ciclo precoce e de grãos na cor amarelo-alaranjada. O cereal possui excelente valor energético e sua proteína é de alto valor nutricional. Por isso, é conhecido como milho QPM, as iniciais de Qualidade Proteica Melhorada.

O alimento está tem sido aproveitado como matéria-prima na fabricação de pães, bolos e biscoitos que são servidos na merenda escolar de escolas da rede pública da região. É o caso da Escola Municipal Professora Rute Braz, que atende mais de 200 crianças dos ensinos Infantil e Fundamental, e que passou a oferecer produtos mais nutritivos na merenda desde 2011. Para 2012, segundo a diretora Fabiane Mendes Ribeiro, a meta é disponibilizar produtos tendo como matéria-prima os alimentos biofortificados, como a batata-doce, a mandioca, o feijão e o milho.

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