Exemplos como a cooperação mútua entre a BASF e a Embrapa, os avanços da soja Inox do grupo TMG, e o peso da Monsanto em pesquisa mostram que o futuro de uma agricultura com melhor potencial está bem próximo.
“SOMOS UMA EMPRESA QUE TEM A EXPERTISE NO DESENVOLVIMENTO DE NEGÓCIOS E PRODUTOS, MAS NÃO DETEMOS TODO O CONHECIMENTO DA ÁREA AGRÍCOLA, COISA QUE A EMBRAPA TEM E COM MUITA RIQUEZA DE DETALHES E PARTICULARIDADES DE CADA LAVOURA. ENTÃO, POR QUE NÃO CONSOLIDAR MAIS UMA VEZ ESSE ACORDO?”, DIZ EDUARDO LEDUC, VICE-PRESIDENTE SÊNIOR DA UNIDADE DE PROTEÇÃO DE CULTIVOS PARA A AMÉRICA LATINA DA BASF.
“SOMENTE EM 2010, A BASF INVESTIU €393 MILHÕES NA BUSCA DE INOVAÇÕES PARA A AGRICULTURA, O QUE REPRESENTA 26% DE INVESTIMENTO DO GRUPO BASF EM TODO O MUNDO”, CONTABILIZA MARKUS HELDT, PRESIDENTE MUNDIAL DA DIVISÃO DE PROTEÇÃO DE CULTIVOS DA MULTINACIONAL.
“A IDEIA FOI UNIR AS FORÇAS DA BASF E EMBRAPA PARA A OBTENÇÃO DA CULTIVANCE QUE ESTARÁ DISPONÍVEL AOS PRODUTORES NA SAFRA 2012/2013. OS INVESTIMENTOS DESSE PROJETO SÃO DA ORDEM DE R$ 20 MILHÕES NO TOTAL”, AFIRMA LEANDRO MARTINS, DIRETOR DE PESQUISA E DESENVOLVIMENTO DA UNIDADE DE PROTEÇÃO DE CULTIVOS DA BASF PARA AMÉRICA LATINA.
BUSCAMOS INDIVÍDUOS QUE PUDESSEM CONFERIR RESISTÊNCIA À FERRUGEM. AS CULTIVARES TMG 7161 RR E A TMG 7162 RR, POR EXEMPLO, FORAM OBTIDAS A PARTIR DE MATERIAL ORIGINADO DE TAIWAN, QUE EMBORA NÃO ESTÁ ADAPTADO AO BRASIL, POSSUI RESISTÊNCIA À DOENÇA”, EXPLICA ROMEU KIIHL, PESQUISADOR DA TMG.
“ESSE AVANÇO ESTÁ EM SINTONIA COM O NOSSO COMPROMISSO DE SUSTENTABILIDADE FOCADO EM AUMENTO DE PRODUTIVIDADE, PRESERVAÇÃO DE RECURSOS NATURAIS E MELHORIA NA QUALIDADE DE VIDA DOS AGRICULTORES”, AFIRMA ANDRÉ DIAS, PRESIDENTE DA MONSANTO DO BRASIL.
O estudo “Perspectivas Agrícolas 2010-2019”, elaborado conjuntamente com pesquisadores e especialistas da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO) e da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), prevê estatisticamente o que há tempos já se alardeava aos quatro cantos do mundo – a escassez de alimentos em nível planetário. A mesma pesquisa vislumbra o Brasil como o ator principal no papel de país com o melhor crescimento da produção agrícola nesta próxima década. No geral, grande parte dos alimentos terão índices de crescimento abaixo ou equiparado à taxa de alta do índice demográfico – o açúcar, por exemplo, tem a previsão de ser o produto com a maior diferença porcentual entre os demais analisados, com alta de 1,4% na produção e 1,8% no consumo.
O incremento estimado do setor agrícola brasileiro chegará a mais de 40% até 2019 quando comparado ao período 2007/2009. Ucrânia tem uma projeção de alta de 29%, ao passo que Rússia e China devem chegar a 26%. Índia também pode alcançar um crescimento significativo de 21%.
Nesse sentido, pesquisas na área de biotecnologia são as mais visadas, especialmente, pelo setor privado, atraído pela demanda por soluções que possam garantir a competitividade no mercado das commodities. Daí, a razão em investimentos da BASF, empresa química alemã, da Tropical Melhoramento & Genética (TMG) e da multinacional americana Monsanto em pesquisa e desenvolvimento de cultivares que atendam à necessidade de maior produção em menor área, com resistência a pragas e doenças, entre outras características.
Acordo de cooperação
Em 17 junho, a BASF anunciou o acordo de cooperação mútua com a Embrapa, com o objetivo de desenvolvimento de novas tecnologias de interesse comum de ambas as partes. Entre as áreas contempladas durante o contrato que inicialmente é de cinco anos, podendo ser estendido a mais cinco, estão biotecnologia, melhoramento genético, fertilidade e mecanização de solos, proteção de plantas e fisiologia vegetal.
O ‘namoro’ entre as duas instituições vem de longa data e já rendeu frutos promissores, como a segunda variedade de soja transgênica do País (e a primeira desenvolvida nacionalmente) resistente a herbicidas e a obtenção de um híbrido de arroz igualmente tolerante ao controle químico de combate a plantas daninhas. Em outra parceria, agora com Centro de Tecnologia Canavieira (CTC), o grupo deverá trazer aos produtores brasileiros uma opção de cana-de-açúcar transgênica com promessa de ser mais produtiva. Para Eduardo Leduc, vice-presidente sênior da Unidade de Proteção de Cultivos para a América Latina da BASF, essa cooperação faz parte de uma estratégia do grupo em unir a força mercadológica com a força da pesquisa. “Somos uma empresa que tem a expertise no desenvolvimento de negócios e produtos, mas não detemos todo o conhecimento da área agrícola, coisa que a Embrapa tem e com muita riqueza de detalhes e particularidades de cada lavoura. Então, por que não consolidar mais uma vez esse acordo? Por isso resolvemos dar continuidade ao que já estava dando certo”, frisa.
A troca de experiências e o inter-relacionamento gerado por esse contrato público-privado também servirá para que a BASF passe a entender um pouco mais sobre os processos e particularidades de cultivo em outras regiões fora da realidade europeia, de acordo com Markus Heldt, presidente mundial da Divisão de Proteção de Cultivos da multinacional. Ele também ressalta a importância do desenvolvimento na área de pesquisa para dinamizar o setor agrícola que está claramente visado por conta das perspectivas de crescimento e pela demanda por mais alimentos.
“Somente em 2010, a BASF investiu €393 milhões na busca de inovações para a agricultura, o que representa 26% de investimento do grupo BASF em todo o mundo. Isso significa uma aplicação de cerca de mais de um milhão de euros por dia na área de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D)”, contabiliza Heldt.
Dessa nova cooperação dois projetos já estão em andamento. Um deles, desenvolvido pela Embrapa Soja, em Londrina (PR), está voltado ao estudo de uma bactéria destinada ao manejo do fungo causador da ferrugem da soja, e outro que avalia um sistema de inoculação a partir de uma bactéria fixadora de nitrogênio para a lavoura canavieira, pesquisa esta conduzida pela Embrapa Agrobiologia, em Seropédica (RJ). Ao longo do contrato, outros trabalhos das demais unidades da Embrapa poderão ser contemplados, justamente por não haver limite de projetos de atuação mútua. Por este motivo, ainda não há perspectivas do quanto será o total dos investimentos.
Cultivance
A filosofia de acordos entre a BASF e demais entidades de pesquisa são resultados do que a empresa denomina como “Open Innovation” – ou Inovação Aberta – o qual se estabelece a partir dessa interação para o alcance de objetivos em comum. “O Top Ciência, por exemplo”, diz Leandro Martins, diretor de Pesquisa e Desenvolvimento da Unidade de Proteção de Cultivos da BASF para América Latina, “abriu o conceito de Open Innovation há cerca de seis anos. Trata-se de uma iniciativa na qual trazemos pesquisadores das mais variadas áreas para estarem em contato com um problema e, a partir de então, eles têm de buscar soluções ou propostas de solução para a BASF”.
A obtenção da Cultivance – a soja geneticamente modificada resistente a herbicidas – destaca-se como uma das primeiras do grupo nessa linha de pensamento. Ao nascer em 1996, o projeto se tornaria o marco para ambas as instituições no desenvolvimento de um produto genuinamente brasileiro. “A BASF identificou um gene de uma planta, que ao passar pelo processo de aplicação de um herbicida, ela de fato não morria. Imaginou-se, então, se houvesse uma soja com essa característica”, pontua Martins.
A ideia foi unir as forças da BASF e Embrapa para a obtenção dessa cultivar que estará disponível aos produtores na safra 2012/2013. Os investimentos desse projeto são da ordem de R$ 20 milhões no total.
Cultivance será uma alternativa à variedade transgênica da Monsanto que é resistente ao glifosato (herbicida também disponibilizado por essa multinacional e que atualmente é o mais utilizado nas lavouras de soja do Brasil). De acordo com Martins, a partir do sistema de produção com a nova tecnologia, o produtor terá mais uma opção de controle químico contra invasoras na plantação, inclusive em termos de manejo de resistência. “Sabemos que hoje há muitas áreas produtoras dessa oleaginosa ou mesmo plantas daninhas em que o glifosato não funciona mais em função da resistência causada a esse tipo de vegetação”, destaca.
Cana transgênica
Na mira da lista dos organismos geneticamente modificado (OGMs) está também uma das lavouras de maior expansão no País – a de cana-de-açúcar. A aliança com o CTC foi oficializada em meados do final de 2009 para o início de 2010.
Entre as diretrizes da pesquisa está a obtenção de cultivares de alta produtividade (em média, 25% mais aptas à produção de sacarose) e tolerantes à seca. A expectativa é introduzir essa novidade no mercado brasileiro daqui a dez anos. O estudo ainda prevê a possibilidade de as empresas avaliarem futuramente a característica de tolerância aos herbicidas nas variedades.
“Trata-se então do conceito semelhante ao da Cultivance”, compara Martins. “O CTC é um centro especializado em cana, que é um campo no qual a BASF não tem muita expertise. Então, nós identificamos alguns genes que podem ajudar a cana produzir mais, e o CTC, com todo o seu conhecimento da planta, incorporará essa característica nela”.
Arroz
A variedade foi obtida pelo processo convencional de seleção (cruzamento entre plantas) e garante, atualmente, resistência ao herbicida da BASF, Clearfield, que mata o arroz selvagem (vermelho) que usualmente costuma crescer em meio à plantação.
A parceria fora iniciada por volta de 2003, e contou com o apoio do Instituto Rio-Grandense do Arroz (Irga), com sede em Porto Alegre (RS), e da Embrapa. O resultado culminou com o híbrido Sinuelo BRS que se destaca por ser muito produtivo que as linhagens convencionais, além de conferir a tolerância ao controle químico do arroz vermelho.
Soja inox
A ideia de produzir uma planta que conferisse resistência ao fungo causador da ferrugem asiática – Phakopsora pachyrhizi – foi um feito de sucesso para a TMG, empresa fundada no ano de 2001, por produtores de sementes e de grãos, pesquisadores e técnicos agropecuários.
A empresa anunciou recentemente as variedades da soja Inox para a região Sul do País, ambas transgênicas, conferindo resistência ao glifosato, Roundup Ready (RR) – são elas a TMG 7161 RR e a TMG 7262 RR. A primeira trata-se de uma cultivar de tipo de crescimento indeterminado, com resistência à podridão da raiz. Ainda possui um ciclo precoce com maturação relativa de 6.1, o que possibilita a prática da segunda safra de milho. É indicada para semeadura a partir de 15 de outubro, em solos de boa fertilidade.
Já a TMG 7262 RR também se caracteriza pela precocidade e por um crescimento indeterminado. A cultivar se enquadra no ciclo de maturação 6.2 e dever ser semeada a partir de 10 de outubro. Para o futuro, a empresa revela lançamentos de variedades de soja Inox resistente a nematoide de cisto e associada à tecnologia Cultivance.
Desde a safra de 2008/2009, a empresa disponibiliza variedades transgênicas adaptadas para a região Sul, como as TMG 4001 RR, TMG 1066 RR, TMG 1067 e TMG 1161. Na região do Cerrado, o grupo se destacou em lançar cultivares da soja RR com tolerância aos nematoides de galhas e de cisto; e também superprecoces, como a TMG 123 RR, que confere tolerância à chuva na colheita e resistência ao nematoide de cisto.
A inserção da tecnologia Inox se iniciou no Cerrado, através das cultivares TMG 801 e TMG 803. De acordo com um dos pesquisadores da instituição, Romeu Kiihl, o processo para se chegar a essa característica de resistência ao P. Pachyrhizi foi bastante árduo, com direito a milhares de cruzamentos de plantas exóticas e plantas adaptadas às condições regionais do Brasil ou de regiões vizinhas como a Argentina.
“Tivemos acesso ao maior banco de germoplasma do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos [USDA], o qual possui uma vasta coleção de plantas de várias partes, resultado da longa história do cultivo da soja no mundo. Nós temos uma cópia desse banco aqui, assim como a própria Embrapa possui. A partir daí buscamos indivíduos que pudessem conferir resistência à ferrugem. As cultivares TMG 7161 RR e a TMG 7162 RR, por exemplo, foram obtidas a partir de material originado de Taiwan, que embora não está adaptado ao Brasil, possui resistência à doença”, explica Kiihl.
Para as variedades do Brasil Central fontes de Taiwan e China tiveram de ser cruzadas com materiais adaptados àquela região. Em termos práticos, a tecnologia confere à planta maiores condições de conviver com a doença no campo.
A resistência não é ampla em função justamente de haver uma variabilidade de raças do fungo, além da própria ação de mutação desse agente patológico de safra a safra. No entanto, a inovação permite minimizar os custos de aplicação de fungicidas pela metade, ou até mais que isso em alguns casos.
Intacta RR2 PRO
Por fim, a Monsanto apresentou ao mercado no início deste ano a mais nova tecnologia da empresa para soja, que promete revolucionar as lavouras do País – resultado de dez anos de pesquisa e estudos e com cerca de US$ 100 milhões investidos.
Trata-se da variedade Intacta RR2 PRO, que reúne três soluções em uma só planta, como (1) produtividade, através da seleção e inserção de genes em regiões do DNA que estimulam essa característica; (2) proteção contra as principais lagartas que atacam a cultura da soja; e (3) tolerância ao glifosato proporcionada pela tecnologia RR.
O produto traz a promessa de viabilizar práticas agrícolas sustentáveis ao reduzir o uso de inseticidas para o controle das principais lagartas da soja. “Esse avanço está em sintonia com o nosso compromisso de sustentabilidade focado em aumento de produtividade, preservação de recursos naturais e melhoria na qualidade de vida dos agricultores. Além disso, mantém a eficácia, o amplo espectro de ação e a flexibilidade da tecnologia RR”, afirma André Dias, presidente da Monsanto do Brasil.
Os estudos dessa inovação começaram nos laboratórios da empresa nos EUA e os testes de campo no Brasil tiveram início na safra 2006/2007. A nova soja da Monsanto foi aprovada pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) no dia 19 de agosto de 2010.
A exemplo do que ocorreu com a tecnologia RR, a Monsanto também pretende licenciar a novidade para outras empresas de melhoramento genético de soja. Como o projeto está na fase final de pesquisa e desenvolvimento, a cultivar deve estar apta a ser comercializada após o registro e as aprovações para importação em mercados estratégicos para a empresa.