Os processos existentes para a castração passam por métodos físicos (com técnicas cirúrgicas e emasculação – burdizzo), químicos (com a injeção de substância tóxica nos testículos) e, mais recentemente, a imunocastração.
Controlar o comportamento dos animais e melhorar a qualidade do acabamento de carcaça são alguns dos principais benefícios da castração. Além dos métodos físicos e químicos, agora os pecuaristas têm uma nova alternativa, imunocastrar o rebanho.
É comprovado que a castração é um dos fatores que interfere diretamente no acabamento de carcaça dos animais, resultando em uma maior quantidade e qualidade de gordura. Não é à toa que aqueles que passam por esse processo são preferência nos frigoríficos. Muitos desses estabelecimentos chegam até a depreciar o valor pago por animais não-castrados, chamados também de animais inteiros. Um levantamento apresentado pelo zootecnista Gustavo Aguiar, da Scot Consultoria, revela que entre os meses de fevereiro e início de maio de 2011, em São Paulo, a diferença média entre o boi casado de animais inteiros e castrados ficou em R$ 0,24 por kg. Em porcentagem, a carcaça do castrado valeu 3,9% a mais. Transformando a diferença média de quilos por arrobas (@), esta ficou em R$ 3,55 por arroba.
De acordo com Paula de Almeida Barbosa Miranda, médica veterinária e especialista em zootecnia, responsável pela sanidade do rebanho da Embrapa Gado de Corte, em Campo Grande (MS), estudos confirmam como principal vantagem da castração o aumento da deposição de gordura na carcaça. Esse fato, segundo ela, está diretamente relacionado à manutenção da coloração desejada da carne, além de trazer melhorias na maciez e no sabor, o que determina melhor aceitação do produto pelo consumidor. “Animais inteiros abatidos tardiamente apresentam maior proporção de musculatura e menor deposição de gordura de cobertura. Isso leva ao escurecimento da parte externa dos músculos durante o resfriamento, depreciando o valor comercial da carne. Já nos frigoríficos, essa desvalorização reflete em descontos no preço da arroba de animais inteiros em relação ao que é pago pela arroba de animais castrados”, explica.
Outro ponto benéfico apontado pela especialista diz respeito ao controle de comportamentos sexuais indesejados. Isso ocorre porque a retirada dos testículos bloqueia a produção de testosterona, que é o hormônio responsável pela libido. Esse bloqueio evita a agressividade e a sodomia (comportamento de um animal montar sobre outro) além de possibilitar a formação de lotes com presença de indivíduos de ambos os sexos, sem que ocorram fecundações indesejadas.
Métodos tradicionais
Os processos existentes para a castração passam por métodos físicos (com técnicas cirúrgicas e emasculação, ou burdizzo), químicos (com a injeção de substância tóxica nos testículos) e, mais recentemente, a imunocastração, realizada através da vacinação. Cabe ao pecuarista, com o auxílio de um médico veterinário ou zootecnista, escolher a maneira mais adequada à realidade de sua produção. Neste contexto, Paula Miranda ressalta que, muitas vezes, o método de castração utilizado é reflexo de uma questão cultural de determinada região. “Em muitos locais há o costume de se optar por certo método baseado em experiências familiares e na disponibilidade de mão de obra treinada. Pesquisas apontam que, no Brasil, 70% das castrações são cirúrgicas e 30% são feitas por esmagamento do funículo espermático, através do burdizzo. No entanto, o fator preponderante a ser levado em consideração a se optar por um ou outro é o custo-benefício da técnica”, conta, observando que ao se optar por um método físico ou químico é importante que se faça uma análise do custo médio por animal de cada procedimento.
Quando o assunto é o bem-estar animal, a médica veterinária aponta que ambos métodos (cirúrgico e burdizzo) apresentam vantagens e desvantagens, sendo que a castração cirúrgica provoca um alto nível de estresse no animal. “Além disso, o processo de cicatrização decorrente desse método é lento e pode se agravar caso associado à miíases (bicheiras), comuns nos períodos de mais chuvas – e/ou a infecções, prejudicando o ganho de peso no pós-operatório”, diz. Nos cuidados, ela indica realizar a vacinação contra clostridioses previamente à castração. “Outra recomendação é que se faça a ligadura do cordão espermático, principalmente nos animais mais ‘erados’, com o intuito de evitar óbitos por hemorragia”.
Na castração com burdizzo, ela afirma que é comum ter de se repassar os animais por falta de eficiência do método. Isso ocorre quando a execução não é realizada de maneira correta e a correção do problema é dificultada pela formação intensa de fibrose no funículo espermático. “Também, durante a cura do corte, há formação de edema, com aumento da sensibilidade à dor. Foi comprovado que esses dois métodos citados causam aumento na presença de cortisol plasmático e diminuição na ingestão de alimentos e no ganho de peso nos primeiros 35 dias pós-castração. Porém, o aumento do nível de cortisol plasmático é mais prolongado nos animais castrados cirurgicamente. O nível de cortisol está diretamente relacionado a condições de estresse”, alerta.
No caso da química, com administração local de substâncias que cessam a espermatogênese, ela cita como vantagem a facilidade na manejo, proporcionando maior segurança aos animais e aos manejador. “Apesar de eliminar o problema de hemorragias, miíases e infecções e de ser um procedimento pouco doloroso, edemas testiculares têm sido observados. Esse edema, que é decorrente de uma reação inflamatória no local, também provoca dor e estresse e pode retardar o processo de cicatrização”.
Imunocastração
A imunocastração dos bovinos é uma novidade recente. Em meados do mês de abril, a Pfizer Saúde Animal anunciou no País a chegada de uma vacina voltada a esse fim que suspende temporariamente a fertilidade de machos e reduz o comportamento sexual e agressivo.
Para que a vacina surta efeito desejado, é necessário que se aplique duas doses injetáveis (dose e reforço). “A primeira delas atua sensibilizando o sistema imunológico do bovino, para que ele comece a produzir o efeito desejado após a segunda dose”, descreve Fernanda Hoe, gerente de produto da Unidade Bovinos da companhia. Ela considera que é importante esclarecer que a substância não exige período de carência para abate, pois é um produto não hormonal que não deixa resíduo no organismo do animal.
Se comparado aos demais métodos, Paula Miranda descreve que o manejo para a imunocastração é menos estressante. O estresse, segundo ela, é semelhante ao de manejos de vacinação convencionais. “No entanto, este possui efeito temporário e reversível de cerca de três a cinco meses, podendo ser prolongado por mais cinco, a depender do número de doses administradas. Antes de se optar pelo uso do produto é necessário que se faça uma programação para que os animais alcancem peso de abate anteriormente ao retorno das funções testiculares. Caso contrário, o investimento torna-se sem fundamento, pois os animais voltam a sofrer os efeitos da testosterona, podendo levar à perda das características de carcaça desejáveis alcançadas durante o tempo de ação do produto”, explica.
Por se tratar de uma novidade no setor pecuário brasileiro, a médica veterinária da Embrapa acredita que essa alternativa poderá ser promissora principalmente para terminação de animais destinados a mercados mais exigentes quanto às questões de bem-estar animal, possibilitando o produtor agregar valor aos seus animais e tornando o uso do produto economicamente viável. Para ela, resta saber se os frigoríficos aceitam como castrados animais que receberam esse tratamento, pois no atual sistema de classificação a simples presença de qualquer um dos testículos classifica os animais como inteiros, independentemente do funcionamento ou não das gônadas.
Respondendo a essa pergunta, Fernanda Hoe diz não haver problemas nesse sentido, já que todos os exemplares que recebem a vacina seguem aos estabelecimentos com um atestado que comprova a data e a listagem dos animais que recebem a administração do produto. “Fora isso, o imunocastrado pode ser identificado por suas características visuais. Uma delas é o próprio tamanho e peso dos testículos que apresentam redução quando o indivíduo passa por esse procedimento. Análises de carcaça dos imonucastrados comprova que esses apresentam carcaça equivalente a daqueles castrados cirurgicamente”, resume.
Quando castrar?
A idade à castração vai depender do tipo de sistema adotado na propriedade, salienta Paula Miranda. Para ela, vale lembrar que em sistemas de abate de novilho superprecoce, estudos demonstraram que animais inteiros confinados após a desmama apresentaram desempenho superior aos castrados e que a castração não alterou o porcentual de carne do traseiro e nem o acabamento de gordura das carcaças. “Em média, os inteiros produzem cerca de 10% a mais de peso do que os castrados, pois são mais eficientes em conversão alimentar e, portanto, ganham peso com maior velocidade. Desse modo, nesse tipo de exploração, a castração se torna uma prática desaconselhável”, conta.
“Nos casos de sistemas convencionais, onde os animais são abatidos após os 24-36 meses, a idade não deve exceder os dois anos, pois quanto maior o intervalo de tempo entre o início da puberdade (13 a 15 meses para cruzados e 18 meses para Nelore) e a castração, menor será o aproveitamento dos efeitos benéficos da diminuição da influência da testosterona sobre o comportamento e a qualidade de carcaça”, aconselha, destacando que quando os animais são castrados à época da puberdade, eles não chegam a desenvolver os caracteres sexuais secundários, melhorando os resultados.
Se o produtor optar por castrar seus animais ao nascerem, a médica veterinária cita que existe desvantagem de não se aproveitar o benefício da testosterona na melhoria da conversão alimentar. “Foi observado que animais que passam por esse procedimento aos oito ou 12 meses apresentaram peso ao abate cerca de 3% superior àqueles castrados com 1,5 meses. As vantagens da castração ao nascimento são a maior facilidade de contenção, cicatrização e recuperação mais rápida e menores riscos de hemorragias”.
Já na desmama, ela coloca como ponto desfavorável a sobreposição de dois manejos bastante estressantes e a proximidade à baixa oferta de alimentos. “Por outro lado, conter e manejar esses animais é mais fácil do que aqueles com idades superiores. Quando castrados posteriormente aos 12 meses, têm-se uma maior dificuldade no manejo, com aumento do estresse e maior dificuldade na formação da cicatriz”, finaliza.