Com o verão cada vez mais próximo, umidade e temperatura criam um ambiente propício para doenças e infestações de pragas no pasto.
A volta do período das águas – que estende-se tradicionalmente de outubro a março na maior parte do Brasil – traz o retorno não só do verde e melhor oferta e qualidade das pastagens, como também favorece o número de casos de doenças infectocontagiosas e a presença de parasitas no meio ambiente. Planejar antecipadamente o manejo sanitário do gado é a saída para que os animais não venham a ter sua eficiência produtiva comprometida devido a esses problemas.
Para o médico veterinário Raul Santana, da Embrapa Pecuária Sudeste (São Carlos/SP), é importante esclarecer a correlação proporcional que existe entre umidade e a prevalência de doenças principalmente de origens bacterianas e virais. Isso porque, muitos dos organismos responsáveis por essas moléstias necessitam de uma umidade mínima para permanecerem viáveis no ambiente. “Como exemplo disso, podemos citar a leptospirose que tem grande relevância, sobretudo em bovinos leiteiros nos períodos mais chuvosos. A atuação é quase que desprezível na seca devido à sensibilidade da leptospira à luminosidade e dessecação”, aponta.
Quando o assunto são os ectoparasitas, a correlação também é válida. Os carrapatos, por exemplo, necessitam de uma umidade média acima de 60% para sobreviverem, conforme explica a doutora em Parasitologia Animal e pesquisadora da Embrapa Pecuária Sul, Claudia Gulias Gomes. O ciclo de desenvolvimento da espécie Rhipicephalus (Boophilus) microplus |(é junto), carrapato que ataca bovinos, dura de 18 a 35 dias, com média de 21 dias, passando pelas fases de larva, ninfa e adulta. As fêmeas ao se desprenderem dos animais caem no pasto e ali depois de alguns dias é iniciada a postura de ovos e, consequentemente, a liberação das larvas. Com condições de ambiente favoráveis, todo esse processo ocorre mais rapidamente.
“O tempo que ela pode aguardar as condições ideais para colocar seus ovos varia muito, podendo chegar de dois meses a mais de cem dias. É claro que nesse intervalo muitas fêmeas vão morrer. A relação do tipo de pasto com o carrapato tem a ver com a formação do microclima que vai interferir diretamente ou não na sobrevivência daquele parasita na pastagem. Quando você tem uma forrageira mais baixa, a incidência do sol faz com que a umidade próxima ao solo seja menor, por conta da evaporação da água e isso prejudica a manutenção do carrapato ali. Os pastos mais altos tendem a formar um microclima perto do solo, favorecendo o carrapato. Deve-se evitar a superlotação de animais em uma mesma área, pois quanto menor o local para ele pastejar, maior serão as chances do encontro do parasita com o hospedeiro”, afirma a pesquisadora. Ainda segundo ela, há estudos que comprovam que em algumas espécies de pasto existem características que dificultam a subida e fixação da larva na planta.
Uma curiosidade é que cada carrapato chega a dar origem a quase três mil ovos e a maioria são viáveis. Por isso, para um combate eficiente é fundamental estar atento ao controle da primeira geração, que varia de acordo com cada localidade, mas em geral tem início no mês de outubro. Para determinar a periodicidade e intervalo do tratamento, seja por banhos carrapaticidas ou fórmulas injetáveis ou pour-on, deve considerar, além do ciclo desse parasita, as características de clima da região e o período de efeito residual da base química a ser utilizada. “O carrapaticida atua na fase em que os indivíduos estão sob o animal, o controle no pasto se dá indiretamente. Quando se faz a introdução de novas pastagens, o trabalho do solo também acaba diminuindo bastante a infestação da população no campo”, alerta Claudia Gomes, recomendando ainda que o correto sempre é que o produtor procure uma orientação técnica, para esquematizar a estratégia de controle mais adequada ao sistema.
Resistência
A identificação da substância a ser utilizada é prioridade, dada a resistência parasitaria que esses seres conseguem alcançar. Desde 1997, a Embrapa Gado de Leite (Juiz de Fora/MG) disponibiliza, juntamente com uma rede nacional de instituições parceiras, o carrapatograma, principal teste para diagnosticar as fórmulas que atuam da melhor forma em determinado rebanho.
O produtor interessado envia em potes plásticos por SEDEX, amostras de fêmeas ingurgitadas do carrapato dos bovinos (mamonas, jabuticabas – explica melhor) ao laboratório. Após 35 a 40 dias, a propriedade recebe os resultados do teste, que é gratuito, com informações sobre o momento certo de entrar com tratamento, preparar e administrar adequadamente o banho carrapaticida. A Embrapa reforça que utilizando corretamente o produto recomendado, a propriedade contará com uma droga eficiente por até dois anos, findos os quais geralmente se desenvolve o processo de resistência. Recomenda-se que o teste seja repetido a cada ano.
Endoparasitas
Parasitas internos, principalmente os gastrintestinais, também encontram melhores condições para completar seu ciclo na incidência do período das águas. O médico veterinário Raul Santana ressalta que ainda na época seca já se deve fazer o tratamento e prevenção desse mal, devido à queda da presença de parasitas no meio ambiente no período em questão. “Serão indicadas vermifugações estratégicas para reduzir a população de indivíduos e, consequentemente, a infestação e contaminação da pastagem nos períodos úmidos. De preferência o uso de um único princípio e que sejam obedecidas as recomendações dos fabricantes para reduzir a resistências dos parasitas aos medicamentos”, destaca.
O primeiro passo, antes de iniciar esse tratamento, é exatamente a análise da eficácia do produto, que pode ser identificada por meio do exame de contagem de ovos por grama de fezes (OPG). Uma análise antes da mostra e outra depois da mesma passar por um processo de tratamento com o produto mostrará qual será a carga de vermes antes e depois da aplicação, permitindo saber se há ou não resistência parasitária na propriedade.
De acordo com a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), unidade Rondônia, os principais sintomas causados pela presença de vermes no organismo são animais tristes e abatidos, que apresentam pelos secos e eriçados, abdômen aumentado, falta de apetite, emagrecimento progressivo durante muito tempo, desenvolvimento retardado, com diarreia, fezes escuras e às vezes com sangue. Eles ainda procuram objetos como terra, madeira e outros como alimento e podem mostrar anemia acentuada, desidratação, chegando até a morte.
Os bezerros com idade de zero a dois anos são mais susceptíveis aos parasitas, por isso, a Embrapa Rondônia aconselha o controle a partir dos 2 a 3 meses até o desmame, com vermifugação a cada 60 ou 90 dias. Após o desmame, o controle estratégico prevê que a 1ª vermifugação deve ser realizada na segunda quinzena de maio, época de vacinação contra a Febre Aftosa; 2ª vermifugação na primeira quinzena de julho; 3ª na segunda quinzena de agosto ou setembro e a 4ª na primeira quinzena de dezembro. Após algum tempo a quarta vermifugação poderá ser realizada, porque os animais terão a verminose controlada.
Nos bovinos de corte, em razão do manejo diferente, em áreas maiores, os bezerros serão vermifugados a partir do controle estratégico, com as três primeiras aplicações. Para o controle biológico, é recomendada a utilização do besouro Digittonthophagus gazella, o popularmente conhecido “Rola-bosta”.
Combate com substâncias naturais
A Embrapa Pecuária Sudeste e outras unidades da instituição têm pesquisado medicamentos naturais para combate a parasitas de bovinos e ovinos, que eliminam ou reduzem o uso de produtos químicos no controle de parasitas em animais. As vantagens apontadas são a diminuição de resíduos no meio ambiente e nos produtos alimentícios de origem animal, como carnes, leite e derivados. A técnica também pode significar redução de custos para o pecuarista, além de maior vida útil do medicamento, pois a resistência do parasita é menor no caso de vermífugos naturais.
O produto natural pode ser utilizado com o princípio ativo das plantas, isoladamente, ou associados a formulações químicas. Em alguns casos, a planta pode ser utilizada diretamente como vermífugo natural. Também há em andamento estudos com marcadores moleculares para a resistência à parasitas externos em rebanhos Nelores e cruzados.