Projeto de milhões de cabeças de gado no Pará deverá ser exemplo de administração de negócio para o pecuarista de corte brasileiro. Comercializando cerca de 160 mil animais em 2010, com 195 mil vacas para emprenhar, projeto é líder mundial em quantidade de bovinos.
São 500 mil hectares de pasto, com mais de 450 mil cabeças de nelore espalhadas pelo sul do Pará, divididos em grupos de cinco mil animais e com a meta de produção de 160 mil bezerros em 2010. Difícil imaginar algo tão grande, mas não poderia ser diferente para este que é o maior projeto de pecuária extensiva do mundo.
A detentora deste posto é a Agropecuária Santa Bárbara que, além dos sete conjuntos de fazendas no Sul do Pará, possui dois centros de genética, sendo um em São Paulo e outro em Minas Gerais, além de um rebanho para terminação em Mato Grosso.
O projeto sempre foi fundamentado em algo extremamente profissional, desde o seu início em 2004. Os primeiros trabalhos se basearam em pesquisas de mercado em busca de possíveis áreas de retorno financeiro e, ao mesmo tempo, pesquisas de localidade, clima e solo. “Identificamos que a região sul do Pará tem um bom clima e solo, porque chove entre 2.800 milímetros (mm) a 3.000 mm por mês. Além disso, as condições de crescimento do negócio na região são favoráveis. Ao final, fizemos uma pesquisa de mercado e decidimos investir na venda de bezerros”, comenta Lúcio Cornachini, superintendente de agronegócios da Santa Bárbara.
Segundo ele, o preço da arroba do boi estava em baixa, e era a época em que os frigoríficos estavam começando a fechar às portas. “Não queríamos ficar nas mãos de empresas que estavam falindo e deixando de pagar seus clientes. Achamos arriscado investir altos valores e não ter a certeza de receber”, conclui Cornachini.
Com isso, a decisão foi comercializar bezerros, um mercado promissor em uma área forte da pecuária. A partir daí, o grupo focou no trabalho de criar animais até a desmama.
Para começar, a Santa Bárbara reuniu diversos investidores e adquiriu fazendas vizinhas no Pará, em busca de formar grandes propriedades, e, assim, trabalhar com grande número de animais. Ao todo, se formaram sete propriedades, sendo seis localizadas perto das fronteiras com Tocantins e Mato Grosso, e uma mais próxima da fronteira com o Amazonas.
A maior parte do rebanho é formado pelo próprio gado que era criado nessas fazendas antigamente, e o restante são alguns touros e vacas comprados para aprimorar o rebanho. “Ainda há poucos lotes em que precisamos incrementar o gado em relação à genética, mas isso é uma questão de tempo”, comenta Cornachini. Em 2009, por exemplo, foram adquiridos quatro mil touros, mas em 2010 já se espera vender o excedente de produção.
Manejo
As 450 mil cabeças de gado estão divididas nos sete conjuntos em lotes entre 80 e 130 mil animais. Para facilitar o manejo, divide-se o gado em grupos de cinco mil cabeças, com quatro funcionários para cuidar de cada lote. A alimentação do gado é à base de pasto e sal mineral. “Todos os animais são criados à base de brizantão e mombaça, além de sal branco. O pasto é rotacionado e são 24 dias de repouso até que a bezerrada volte ao piquete. E não importa se é fase de crescimento, prenhez, touro, todos recebem apenas sal e pasto”, comenta Carlos Rodenburg, presidente da empresa.
As fazendas utilizam o sistema de rotação de piquetes para otimização do espaço, onde possui média de 2,5 unidades animal por hectare (UA/ha). A média nacional é de 0,8 UA/ha. Nos planos de crescimento da empresa, a expectativa é de se chegar a quatro UA/ha.
A reprodução do gado é feita em parte com inseminação artificial e o restante com repasse de touros. Em 2009, foram inseminadas 52 mil vacas, representando 28% do rebanho, mas a ideia do grupo é aumentar essa porcentagem. O restante é repassado com muitos touros provenientes dos próprios centros de genética do Sudeste.
E é devido à qualidade do rebanho que os bezerros saem da fazenda com aproximados 210 kg. “Para se ter uma ideia, a média nacional de peso de bezerro desmamado é de 170 kg. Temos um ágio de 40% e vendemos por R$ 676,00 a cabeça”, comenta o superintendente.
Por maior que seja o projeto, a empresa pretende dobrar de tamanho em quatro anos, atingindo rebanho de 1,2 milhão de animais. Para chegar a este número e alcançar os quatros UA/ha, a empresa pretende trabalhar com adubo. “Vamos realizar estudos para incrementar a produção de pasto, em busca de maior disponibilidade de alimento para o gado”, comenta Cornachini.
A expectativa em relação a 2014 é que se insemine artificialmente pelo menos 50% do rebanho, para que a qualidade dos bezerros se mantenha em alto nível, já que é isso que garante a boa venda dos animais. Em 2009, a empresa vendeu a bezerrada para nove diferentes clientes da região. Já para 2010, apesar do maior número de animais, a expectativa é que se venda para apenas quatro compradores. “Já estamos ‘apalavrados’ com quatro pecuaristas que foram nossos clientes em 2009, e que já negociaram a compra em 2010”, confirma o superintendente.
Profissionalismo
A Santa Bárbara se caracteriza por ser uma empresa do campo. O primeiro sinal é a formalização dos funcionários, registrando-os com carteira assinada. Até mesmo os tocadores da boiada tiveram que abrir empresa para ter como receber o pagamento e fornecer nota fiscal. Os trabalhadores também ganharam casas novas e escolas para os filhos.
Esse tipo de investimento não é comum na pecuária e pode surtir a dúvida se é viável gastar tanto nesta área e ainda ter retorno financeiro. Para a Santa Bárbara, o investimento é fundamental para criar vínculo com os funcionários, dando uma condição de trabalho que nenhum funcionário quer perder, e por isso, renderão mais no serviço.
Invasão
Em 2009, a empresa sofreu com a invasão promovida por um movimento de sem-terras em uma das propriedades. Os invasores destruíram casas de funcionários e durante meses acabaram atrapalhando o andamento da fazenda. “O que precisamos é de segurança. Fizemos um grande investimento no negócio, mudamos a realidade dos nossos trabalhadores construindo casa e escola para a família deles, algo que eles nunca viram por aqui”, aponta Cornachini.
A empresa chegou a repensar o investimento, e quase abandonou a pecuária na região devido à ausência de atuação do poder público. Segundo a Santa Bárbara, o governo demorou a agir e agora trabalha em conjunto para que isso não volte a acontecer na região. “Tivemos de conversar muito com o poder público, porque, sem segurança, não teríamos como continuar investindo milhões de reais ali”, comenta o superintendente.
Atualmente, um pequeno grupo invasor ainda se mantém em uma área restrita da propriedade.