A indústria de máquinas e equipamentos estima uma alta de 15% no faturamento deste ano. Esse crescimento, no entanto, não será o bastante para recuperar as perdas acumuladas em 2009, quando o setor teve um faturamento de R$ 64 bilhões – o que representa uma queda 17,9% em relação a 2008.
Ao descontar a inflação, a retração real é de 20%. Essa foi a projeção dada pelo presidente da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), Luiz Aubert Neto – no último dia 24 de março, durante encontro com jornalistas – ao apresentar o desempenho dos diversos segmentos da indústria em 2009 e as perspectivas para 2010. E em entrevista exclusiva concedida à repórter Fátima Costa, o presidente da entidade falou abertamente sobre o setor de máquinas e implementos agrícolas, o apoio e incentivos de programa do governo federal e ainda sobre as novidades da Agrishow 2010. Luiz Aubert Neto é engenheiro mecânico de produção, graduado pela Faculdade de Engenharia Industrial (FEI), com pós-graduação em Administração Financeira e Contábil pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Desde maio de 2007, ele ocupa a cadeira de presidente da Abimaq.
Revista Rural – Diante dos números apresentados hoje pela entidade, qual é a situação atual das indústrias de máquinas e equipamentos?
Luiz Aubert Neto – As indústrias de máquinas e equipamentos se encontram em uma retomada de investimentos, com destaque para os setores de mineração, cimento e papel e celulose, alguns dos mais afetados pelos efeitos da crise, no ano passado. A própria indústria de máquinas e equipamentos vai destinar R$ 8,7 bilhões em investimentos em seu parque industrial, um crescimento de 20% sobre 2009. Há ainda uma estimativa de que as encomendas comecem a ter impacto no faturamento do setor nos próximos meses. Dados da Abimaq apontam que o Nível de Utilização da Capacidade Instalada (Nuci) da indústria de bens de capital foi de 81% em fevereiro, ante 80,98% em janeiro e 79,26% em fevereiro de 2009. O nível de emprego do setor também deve aumentar para atender a essa demanda. No mês passado, o indicador subiu 0,7% em relação a janeiro, o que elevou o quadro para 239 mil funcionários.
Rural – Já que falamos em crescimento, se comparamos os números de 2009 é o que vale a quanto em comparação a 2008? (não entendi a pergunata… Seria: … Em comparação com 2008, como ficou o saldo no setor em 2009?)
Aubert Neto – Em relação a 2008, o setor precisa se recuperar e necessita crescer pelo menos 20%, para igualar os resultados. A indústria de máquinas e equipamentos estima uma alta de 15% no faturamento deste ano. Esse crescimento, no entanto, não será o bastante para recuperar as perdas acumuladas em 2009, quando o setor teve um faturamento de R$ 64 bilhões – o que representa uma queda 17,9% em relação a 2008. Ao descontar a inflação, a retração real é de 20%.
Rural – Aparentemente, o setor de máquinas e implementos agrícolas vive um bom momento, uma situação bem contrária a de 2009. Há um fator determinante para que isso aconteça?
Aubert Neto – O setor agrícola vive de fases. Há momentos em que ele está lá em cima e tem momentos que se encontra lá embaixo. Mesmo assim esse aumento que estamos vivendo agora é muito significativo e é uma forma de recuperar as perdas do ano passado. Por quê? Porque tudo que for comparado a 2009 terá números positivos, cerca de 30% a 40% a mais. Porém, quando se fala em percentual é preciso tomar cuidado. O setor de máquinas e implementos agrícolas ainda está muito mal e qualquer aumento que estiver acontecendo, é lógico que é bom. É uma sinalização boa, mas é preciso notar se isso será constante. Enquanto tivemos problemas de Custo Brasil [termo usado para descrever o conjunto de dificuldades estruturais, burocráticas e econômicas que encarecem o investimento no País, dificultando o desenvolvimento nacional, aumentando o desemprego e a evasão de divisas], câmbio e taxa de juros, diria que será uma luta inglória e que teremos de saber como se virar com isso.
Rural – Quais são os principais problemas enfrentados pelo setor?
Aubert Neto – Sem dúvida, o câmbio. O mês de janeiro deste ano representou a pior exportação dos últimos dez anos do nosso setor. Estamos perdendo mercado lá fora. Em função da crise econômica, tivemos uma queda natural, mas perdemos muito. As importações de máquinas, principalmente provenientes da China, estão crescendo muito e prejudicando a indústria nacional. Além disso, os altos tributos aplicados no Brasil também afetam o setor na exportação. O resultado disso será um crescimento contínuo no déficit da balança comercial do nosso segmento. No bimestre, o saldo negativo está em US$ 2,1 bilhões, uma alta de 15% sobre o mesmo período de 2009 (US$ 1,8 bilhão). Essa situação tem prejudicado a indústria nacional tanto nas exportações como na disputa com os importados pelo mercado doméstico. O câmbio continuará sendo fator determinante para explicar a queda de faturamento do setor.
Rural – O senhor citou durante a coletiva de imprensa que se o governo elevar a de taxa de juros, o setor sofrerá muitos mais danos. De que forma isso poderá afetar o setor?
Aubert Neto – A correlação é direta: se subir a taxa de juros os números do setor cai. Já estão falando da taxa de juros de 12% ao ano. Agora, para que comprar uma máquina, se eu posso aplicar o meu dinheiro em fundos como Tesouro nacional, no qual ganharei 12% ao ano? Aumentou a taxa de juros, os investimentos caem do dia para a noite. Não podemos perder essa oportunidade. Se o Brasil não se preparar para o futuro, gerar riquezas e rendas, se continuarmos com essa política com taxa de juros, sendo a mais alta do mundo, com o câmbio e Custo Brasil alto, continuaremos sendo o país das oportunidades perdidas.
Rural – O setor também enfrenta outro problema em relação ao preço do aço. Esse é um dos fatores que afetam diretamente as indústrias, que estão importando aço mais barato, mesmo após a crise. Como o setor enfrenta essa dificuldade?
Aubert Neto – Hoje, nós temos o aço mais caro do mundo. Se compararmos com o aço da Alemanha, o produto brasileiro chega a ser entre 20 a 30% mais caro. Perante isso, há um grupo de indústrias (a maioria sócia da Abimaq), que estão se unindo para importar aço, uma vez que sozinhas elas não conseguem. Juntando-se, as indústrias passam a ter cota de importação. Um bom exemplo é o da Câmara Setorial de Máquinas e Implementos Agrícolas, que está criando uma cooperativa para importar aço, na tentativa de baratear a produção de máquinas e implementos. Com isso, há uma possibilidade de trazer a siderurgia para conversar. É uma forma de negociar. Ninguém quer brigar com ninguém, um depende do outro. Se eu não compro aço, a siderurgia não terá para quem vender. É uma forma inteligente de sentar e negociar, para que todos saiam ganhando. O que aconteceu durante a crise financeira, prejudicou a todos e a situação de lá para cá não mudou. O que a indústria de aço no Brasil fez durante a crise? Ao invés de abaixar os preços, preferiu mantê-los. Em qualquer lugar do mundo em que o setor usa-se de monopólio e oligopólio [produção que se concentra num pequeno número de firmas], em que empresas dominam o mercado e criam uma dependência de seus produtos como acontece aqui – em que 80% das empresas do setor são pequenas e médias empresas – não há alternativa do que uma ação em conjunto.
Rural – A indústria de máquinas e equipamentos foi um dos setores mais afetados pela crise financeira mundial, sobretudo, por conta da queda da demanda externa e do real valorizado perante o dólar. Qual foi o mês que o setor sentiu mais?
Aubert Neto – O que realmente impactou foi janeiro de 2009. Esse mês foi o “fundo do poço” para todos. Uma vez que, entre a crise se instalar e começar a ter queda de faturamento, há um período, uma vez que as indústrias têm períodos dos pedidos, fabricação e das entregas das máquinas. Neste segmento, não se consegue entregar máquinas agrícolas tão rapidamente, em alguns casos sim, mas outros só é possível entregar como é o caso das colheitadeiras de canas, no período de 90 a 180 dias. Entre a crise, que veio em setembro de 2008 até chegar janeiro, os números foram caindo, aos poucos, porque ainda tinham pedidos de carteira.
Rural – Além dos setores de máquinas agrícolas quais foram os outros setores que mais foram prejudicados?
Aubert Neto – Dos 30 setores da câmara setorial que temos. Tivemos aqui só em 2009, apenas dois que cresceram e eram setores ligados à Petrobras, que foram os setores de óleo e gás. Eles avançaram, no ano passado, com altas de 18,1% em bombas e motobombas, e de 2,6% para bens sob encomenda e que tiveram a Petrobras como grande cliente. O resto, que estava fora de segmento, sentiu muito e estão sentindo até agora em 2010. No final de 2009, outros setores começaram a impulsionar como as siderúrgicas, cimento, mineração, papel e celulose, que retomaram investimento, com esses números que estamos divulgados agora.
Rural – Como as empresas ligadas a Abimaq reagiram à crise financeira?
Aubert Neto – Tivemos de tudo. Temos empresas que estão sentido até agora, que estão com problemas de caixa, tem empresas que cortaram de 30% a 40% o quadro de funcionários e outras que foram vendidas para concorrentes. Houve também empresas que estavam com mais capitais e que conseguiram passaram melhor pelo “tsunami” que tivemos. Porém, quem mais sofreu mesmo foram as pequenas e médias empresas. Essas continuam sofrendo, com os problemas que ainda temos, como: linha de crédito, câmbio, taxas de juros e infraestrutura, redução de jornada de trabalho, custos que afetam investimentos.
Rural – Porém, houve incentivos por parte do governo para auxiliar o setor. Quais foram?
Aubert Neto – O governo lançou medidas efetivas. A retomada dos investimentos foi possível, especialmente, aos financiamentos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que por meio do Programa de Sustentação do Investimento (PSI) proporcionou condições de empréstimo melhores aos clientes, onde é possível comprar máquinas e equipamentos com a taxa de juros de 4,5% ao ano, com prazo de até 10 anos para amortização e aliado a isso veio à redução do Imposto sobre Produto Industrializado (IPI). Essas ações diminuíram os custos e incentivaram os investimentos, foi por isso que o setor se recuperou. Se não fosse o PSI e a desoneração do IPI, a queda de 2009 seria pior.
Rural – O ano de 2009, também foi marcado por ações que auxiliaram e favorecendo a agricultura familiar. No que essas ações contribuíram para o setor ou que venha contribuindo?
Aubert Neto – Todos os setores ligados ao “Programa Mais Alimentos” – que é uma parceria da Anfavea [Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores] e a Abimaq – se analisarmos todos os fabricantes de máquinas de até 75 cavalos (cv) que o programa contempla, nós não tivemos crise (a frase está truncada…). Pelo contrário, contrataram mão de obra e para cada cinco tratores vendidos, houve a venda de um implemento agrícola. Nesse segmento, eles sentiram menos. Todo o programa que é bem feito naturalmente apresenta resultados. O “Programa Mais Alimentos”, financia até R$ 100 mil e que podem ser pagos em até dez (checar se é dez ou oito…) anos, com juros anuais de 2% e três anos de carência. Agora, estamos pleiteando para financiar até 150 mil reais e acredito que deveria aumentar mais. Com isso faríamos o setor crescer. Tudo isso é uma revolução silenciosa. A partir do momento que você consegue dar uma ferramenta ao produtor, você melhorar sua produtividade e sua competitividade e não dá mais para parar. Lembro até hoje, de um caso de uma família que foi uma das primeiras a ser contemplada pelo programa, hoje ela não está com somente com um trator, está com três. Isso é o quê? É uma revolução silenciosa no campo que vem ocorrendo no Brasil.
Rural – Houve também a participação do BNDES, órgão do governo federal. Isso também foi importante?
Aubert Neto – Sem o BNDES isso não era possível, a participação do governo foi fundamental. Há outros bancos que estão participando como o Banco do Brasil. E como há uma participação dos bancos públicos, logo se abriu concorrência entre os bancos privados, que estão atuando no segmento e dando apoio e crédito.
Rural – Quais são as perspectivas do setor para 2010?
Aubert Neto – As previsões para o desempenho da indústria neste ano são positivas. Hoje a projeção de crescimento está entre 15% e 20% no faturamento do setor em 2010, como resultado da recuperação econômica e da tendência de substituição de máquinas e equipamentos mediante linhas de financiamento especiais, além dos impactos na cadeia dos programas de investimento em infraestrutura do governo.
Quando comparado a fevereiro de 2009, o faturamento nominal apresentou um aumento de 23,5%, não chega a ser muito animador, uma vez que 2009 foi um ano muito ruim. Se comparado com fevereiro de 2008, o faturamento do setor registrou queda de 14%. Em relação ao mesmo período de 2009, os dados do primeiro bimestre de 2010 mostram o crescimento de 53% das importações da China, que deve alcançar ainda neste ano a segunda posição entre os maiores exportadores de máquinas e equipamentos ao Brasil, ultrapassando a Alemanha. As exportações, por exemplo, totalizaram R$ 7,6 bilhões. O desempenho foi 40,5% menor em relação a 2008. As importações, por sua vez, somaram R$ 18,7 bilhões, 14,3% abaixo ante o ano anterior. Com isso, balança comercial do setor teve um déficit de US$ 11,1 bilhões, com retração de 22,1% sobre 2008.
Rural – Ano eleitoral, projetos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), Copa do Mundo em 2014, as Olimpíadas de 2016 e a exploração do pré-sal devem incentivar o setor de máquinas e implementos agrícolas?
Aubert Neto – Em 2010, tem tudo para ser um excelente ano. Só que falo tudo na condicional: se, talvez e quem sabe. Dependemos de certas ações que vem do governo, é uma delas é a política de câmbio e a taxa de juros. Se ela aumentar, abortaremos os investimentos. Com o câmbio depreciado, iremos longe e poderemos encostar-nos aos números de 2008 e mais poderemos crescer não só neste ano, mais nos próximos. Para isso, é preciso o governo fazer as desonerações básicas. Realizando isso, o setor agrícola vai junto, pois tudo que gera riqueza, aumenta o salário e o consumo. A agricultura e a construção civil indo bem, e que são os dois setores básicos, tudo vai bem.
Rural – Já que abordamos o setor agrícola, uma das grandes discussões em 2009 foi o evento da Agrishow. No ano passado, a feira foi atingida no auge da crise internacional e foi uma das causas, apontadas pelos grandes fabricantes de máquinas e implementos agrícolas em não participar da feira. Na sua opinião, esse foi o fator determinante para que as grandes empresas do setor não participassem do evento?
Aubert Neto – Olha, não posso falar por eles, mas acredito no seguinte: os grandes saíram, mas os pequenos continuaram. Na minha opinião, quem mais deveria acreditar não acreditou. Os pequenos acreditaram na feira, apesar da crise que se instalava naquele momento. A Agrishow 2009 foi uma boa feira. Entretanto, nesta próxima edição, estamos saindo dessa crise e vemos sinais melhores vindo por aí. Estamos batendo recordes na Agrishow 2010, todos dos últimos 15 anos. Já são 170 metros mil de área vendida, nunca tivemos isso. Os números são 40% acima de 2006. Neste ano, a feira será completamente diferente. Ainda não será a ideal, há muito que fazer, tem muito para melhorar, mas ela estará bem diferente das outras edições. Há mais infraestrutura, espaços para estacionamentos e duplicação de estrada, apesar de toda a “encrenca” que tivemos para chegar nisso. É preciso lembrar que as empresas reafirmaram a intenção de participar a cada dois anos da feira, devido aos altos custos. De 100% de custo na participação da feira, 20% é da área de exposição, porém, 80% são gastos com estande, frete, locação de espaço, hospedagem e alimentação do pessoal (cerca de 100 funcionários), esses são gastos adicionais e que estão em torno da cidade. Isso eleva o custo para a realização do evento e gera muitas polêmicas. O pessoal tem de tomar cuidado, pois o “peixe morre pela boca” é preciso conversar para evitar problemas como o que aconteceu.
Rural – O senhor concorda que foi de um comum acordo a Agrishow continuar na cidade de Ribeirão Preto e São Carlos receber a 1ª Feira de energia renovável?
Aubert Neto – O final da novela foi isso. Ribeirão Preto fica com a Agrishow e São Carlos ganhou o projeto da cidade da energia, uma grande bandeira do Brasil voltada para a área tecnológica e energia renovável, sustentável. Acho que são dois grandes pólos tecnológicos que o Brasil terá: um na área do agronegócio e outro na área de energia sustentável. Na área do agronegócio já somos líderes em vários segmentos, na área de energia falta muito ainda. A Agrishow tem 15 anos de existência e a cidade da energia, estamos gestando ainda, mas quando ela nascer, nascerá forte e dará bons frutos.
Rural – Vocês anunciaram que há uma captação de recursos da Abimaq, em torno de R$ 22 milhões para a cidade de São Carlos se tornar o pólo da 1ª Feira de energia renovável. Isso realmente acontecerá?
Aubert Neto – Temos o compromisso da captação de recursos, só que antes tem o compromisso do governo federal e estadual para a cidade sair do papel. O governo precisa fazer a infraestrutura. Há duplicação de estradas e investimentos na ordem de R$ 70 milhões, sem isso não há como fazer nada e os valores estão reservados e esperando.