Pecuária

Inseminação: mais popular do que se pensa!

Em 40 anos de inseminação artificial no Brasil, muita coisa mudou, inclusive o público consumidor. Se no início apenas pecuaristas de elite utilizavam a tecnologia, hoje em dia até “sem-terra” compra botijões.

Nos últimos anos, a inseminação artificial se desenvolveu muito no Brasil e no mundo, e com a chegada da Inseminação Artificial em Tempo Fixo (IATF) o crescimento deverá propiciar crescimento ainda maior. Segundo especialistas, em três anos a inseminação artificial deverá apresentar forte aumento no País. Mas, nos cerca de 40 anos de existência das centrais, muita coisa mudou. A prática começou com os árabes, aplicando a técnica em equinos no século 14. Mas só em 1949, quando foi descoberto que o sêmen poderia ser armazenado por um longo período em temperaturas baixas, o melhoramento genético se acentuou e, na década de 1970, o Brasil começou a receber as primeiras empresas que atuavam nesse segmento. O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento foi o primeiro a estabelecer uma central de sêmen resfriado no Brasil, em 1970. Das particulares, a pioneira foi a CRV Lagoa, em 1972.

De lá pra cá, a genética está se desenvolvendo e já conta com marcadores moleculares para identificar os melhores animais. Em 37 anos de inseminação artificial comercial no Brasil, a CRV Lagoa ganhou destaque no mercado, principalmente por causa do seu touro mais famoso, o Fajardo. Apesar de já ter morrido, o animal não só deixou o nome, mas a marca de mais de 460 mil doses (entre sexado e convencional) vendidas nos 16 anos de serviços prestados. “Ainda há doses do Fajardo à venda. Ao todo, serão 480 mil doses vendidas, sendo que hoje o preço do sêmen convencional está em R$ 350 reais, a dose”, explica Ricardo Abreu, gerente de produto de corte Zebu, da CRV Lagoa.

Excluindo o Fajardo, o touro que mais vendeu doses no Brasil, na área de corte, também é da Lagoa: Enlevo da Morungaba, com 380 mil doses. Mas este ainda tem grande potencial para aumentar a quantidade, já que está com 12 anos de vida. O preço atual do sêmen sai a R$ 100,00, o convencional, enquanto que o sexado é de R$ 1.000,00.

O valor dos semens disponíveis no mercado varia mais de 1000%. Há semens abaixo de R$ 10,00, como é o caso do Absoluto, do criador e proprietário Fernando Luis Quagliato, vendido a R$ 8,00. E há de R$ 3.000,00, como o Basco de Naviraí, vendido pela Alta Genétics. “O sêmen sexado do Basco, um Nelore, por ser um animal jovem, promete trazer muitos resultados para a genética brasileira ainda”, explica Tiago Carrara, gerente de mercado da Alta Genétics.

Mas, doses como a do Basco de Naviraí não são comuns. O valor médio comercializado no Brasil é entre 18 e 20 reais. “A maioria dos pecuaristas compram os produtos na faixa dos R$ 20,00, aquele que compra sêmen acima de R$ 100,00 geralmente é quem trabalha com genética de ponta e precisa obter resultados mais expressivos”, explica o gerente técnico da Central Bela Vista, José Roberto Potiens.

Para se ter uma ideia, cerca de 80% do sêmen brasileiro é vendido abaixo dos R$ 30,00. Na realidade, o maior investimento acaba sendo no botijão, já que o mais em conta não sai por menos de R$ 1.500,00 (Botijão de 600 doses). Os mais baratos provêm da China, mas não são muito confiáveis assim como os demais, que custam cerca de R$ 1.850,00 e são fabricados em países europeus. “Não vale a pena adquirir botijões chineses, porque têm vida útil muito menor em relação aos concorrentes. No final das contas, em um longo período, sai mais em barato pagar mais na aquisição”, afirma Carrara, da Alta Genétics.

Mudanças no mercado

Atualmente, a raça Angus é a que apresenta o maior crescimento de vendas no Brasil. Tal fato se dá ao cruzamento industrial, mostrando a intenção do pecuarista em melhorar o rebanho. “O crescimento da comercialização do Angus é resultado da busca por melhores rebanhos. Como não há condições de colocar touros Angus para cobrir matrizes, principalmente, na região central do País, é necessário usar a inseminação artificial”, explica Carrara, que completa. “Como há alguns anos abateram muitas matrizes, agora os pecuaristas precisam correr atrás do prejuízo e aumentar a produção, e o cruzamento industrial é uma dessas maneiras”.

Há cinco anos, vendiam-se mais doses do Red Angus do que do próprio Angus, até o dia em que se desfez uma crença no campo. “Os pecuaristas acreditavam que o Red Angus era mais rústico do que o Angus, e por ter a pelagem avermelhada ao invés do preto, acreditavam que a raça poderia suportar melhor as altas temperaturas. Mas começaram a perceber que o Angus é tão rústico quanto, e o mercado se inverteu”, comenta Alexandre Zadra, gerente de produto taurino da CRV Lagoa.

Esse aumento foi claramente percebido pelas centrais, que apostam na continuidade de crescimento da procura pela raça. “A Alta Genétics estava de olho no mercado desde o ano de 2007, quando a participação ainda era de 13% do mercado. Víamos a possibilidade de grande demanda por Angus para os próximos anos e, com isso, firmamos parcerias no Rio Grande do Sul e com a Universidade Estadual Paulista – Unesp de Jaboticabal, para melhorarmos nossa oferta ao pecuarista. Hoje, a participação da raça é de 25% do nosso mercado, sendo que 99% do que é vendido de Angus é destinado ao cruzamento industrial”, afirma Carrara.

Apesar dos números do Angus, o Nelore mantém a liderança disparado, com 50% de todo sêmen comercializado no País. São mais de dois milhões de doses por ano, somando os Nelore com Nelore Mocho.

Os mais desejados

Dentre tantas opções de sêmen, há aqueles touros preferidos pelo mercado. O destaque da Alta Genétics é o Bitelo da SS, que é o touro que possui mais descendentes distribuídos nas centrais, já foi o Grande Campeão da ExpoZebu e por três vezes venceu o Progênie ExpoZebu. Atualmente a dose do sêmen é vendida à R$ 1.000,00 pela central.

O touro em evidência da CRV Lagoa, por exemplo, é o Missoni da Guadalupe, que foi o grande campeão nacional da ExpoZebu 2009, com apenas 19 meses de idade. “Foram vendidas cinco mil doses a R$ 50,00 cada, mas ainda está no começo e este touro deve ser muito procurado nos próximos anos”, opina Ricardo Abreu, da CRV Lagoa.

O destaque da ABS Pecplan é um Angus de nove anos de idade, o Bandwidth. O animal foi responsável por vender 57 mil doses em 12 meses. “Sempre demos muita atenção ao Angus na empresa, mas esse ano tivemos problemas na logística na pré-safra, devido ao grande número de doses vendidas”, explica Vasco Beheregaray Neto, gerente de mercado da ABS Pecplan.

Em busca de aumentar o grau de prenhez do rebanho, um problema entre os pecuaristas, ABS elaborou o Fertility Plus, que é uma única dose composta por sêmen de três animais. Segundo Fernando Vilela Vieira, gerente do produto, com sêmen de três touros diferentes, há mais chances da vaca emprenhar. “Alguns semens têm deficiência ou excesso de proteínas e minerais e acabam não emprenhando o animal. Com a mistura de três diferentes em uma dose, acaba criando uma média. Além disso, existe a capacitação espermática do sêmen, que pode ser lenta, moderada ou rápida. Assim como o sêmen, o óvulo também tem diferentes fases e pode não combinar com a fase do sêmen. Com a dose de três touros, a chance de ter algum sêmen na mesma maturação do óvulo é muito maior”, explica. A dose tripla é da mesma quantidade das doses convencionais.

Pesquisas realizadas com matrizes nos EUA mostraram ganho de 9% de prenhez. Já no Brasil, foi constatada uma variação muito grande, chegando a ganhar 20% a mais de prenhez em algumas propriedades e menos de 9% em outras. É o segundo ano do produto por aqui, existem pecuaristas que estão readquirindo as doses. “Usei o Fertility ano passado, tive um leve aumento e volto a comprar nesse ano devido ao preço ser o mesmo”, explica Adriano Vaz de Lima, produtor de São João da Boa Vista, no interior de São Paulo. O pecuarista começou a usar a inseminação artificial há 18 anos e de lá para cá nunca abandonou.

O uso de material genético para melhorar o rebanho está cada vez mais comum no Brasil, apesar de inseminarmos apenas 7% de nossas matrizes. Mas o grande fenômeno é o uso dessa tecnologia por qualquer tipo de criador. Se antigamente apenas as propriedades que trabalhavam com genética tinham este privilégio, hoje até mesmo trabalhadores que receberam a propriedade por meio do Programa do Sem-terra consegue usar a tecnologia. “Nós temos todo tipo de cliente, inclusive um sem-terra que acaba comprando botijões em conjunto com outros produtores e assim atingem o objetivo de melhorar a qualidade do gado”, explica Carrara, da Alta Genétics.

Marcelo Dias Pacheco é um exemplo de pequeno produtor que usa a genética para melhorar a qualidade do rebanho. Proprietário da Fazenda São João da Lapa, o pecuarista de Ipeuva, a 196 quilômetros da capital paulista, possui 100 vacas e utiliza a inseminação artificial conseguindo uma taxa de prenhez de 86%. “Não tem mais como fugir da inseminação artificial. Geralmente escolho três touros para trabalhar por cada ano”, explica Pacheco. O custo da dose desses touros gira entre 15 e 25 reais, chegando a um investimento de R$ 2.000, por ano com reprodução.

Marcelo também é veterinário e presta serviço a propriedades da região. Segundo ele, existem diversos pequenos produtores que se juntam para comprar botijões e sêmen. “Outra coisa que acontece atualmente, é o próprio vendedor emprestar o botijão para o cliente por um dia, já que se trabalha com a IATF”, comenta.

Além dos pequenos pecuaristas que adquirem semens mais em conta, existem os que trabalham apenas com melhoramento genético. É o caso de Francisco José Matta Azenha, que possui propriedade em Presidente Venceslau, interior de São Paulo. Há 10 anos, Francisco apostou no gado PO (Puro de Origem) para realizar reprodução em São Paulo, destinado os melhores para a fazenda em Campo Grande (MS), onde tem criação para abate. “Começamos com a intenção de reproduzir em São Paulo e selecionar os melhores para a fazenda em Campo Grande, mas com a superprodução começamos a vender os reprodutores”, lembra. Em busca do melhoramento, Francisco chegou a comprar sêmen de R$ 8.000,00, mas que segundo ele, não apresentou o resultado esperado. “Hoje, compro doses de R$ 1.000,00 em média. Para este ano, estou apostando no Eliaco da Java, no Bitelo e no Basco de Navirai para melhorar minha produção”, comenta.

Toda essa diferença entre investimentos mostra como o mercado está aberto a todo tipo de produtor. Com sêmen a R$ 8,00 e botijões a R$ 1.850,00, se tornou muito mais fácil para o produtor utilizar a inseminação artificial no rebanho. Segundo os especialistas, em alguns anos só irá sobreviver no mercado quem utilizar tecnologia na fazenda, porque a cada dia a diferença entre o lucro e o custo diminui. A aposta é que a inseminação artificial, principalmente com o advento da IATF (inseminação artificial por tempo fixo), será cada vez mais utilizada e, em três anos, deverá dar um grande salto de crescimento no Brasil.

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