A fórmula do menos custos e mais produtividade. É só uma questão de tempo para que o milho geneticamente modificado emplaque nos campos e nas próximas safras. Assim, garantem as empresas de biotecnologia. Nos últimos anos, o milho transgênico vem sendo cultivado livremente em muitos países. Agora, chegou a vez do Brasil.
O Brasil começará a colher a sua primeira safra comercial de milho transgênico, autorizada pelo governo, apesar da polêmica que cerca os alimentos geneticamente modificados (GM). Com isto, o milho safrinha, já terá a tecnologia Bt (gene de uma bactéria, o Bacillus thuringiensis, que ajuda no combate das principais pragas na lavoura da cultura). Como a liberação do material genético, pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), ocorreu um pouco tardia, não houve tempo hábil para multiplicação das sementes, a exemplo do estado de São Paulo. Devido a isto, não há estatística oficial de área cultivada, de grãos a serem colhidos e o resultado efetivamente da produtividade alcançada pelos produtores, que apostaram na tecnologia.
Para as empresas (detentoras da biotecnologia) isto é apenas questão de tempo. Neste momento, o que é importante para elas é levar a tecnologia para o produtor, mas também respeitar a liberdade de escolha dele. Hoje, ninguém é obrigado por quem quer que seja a plantar transgênicos. Compra sementes modificadas quem quer. O principal atrativo é o aumento de lucratividade. “Em média se colhe 10% a mais, com o uso desta tecnologia”, garante o gerente técnico de Biotecnologia da Monsanto, Odnei Fernandes.
No entanto, justifica Fernandes, esta lucratividade pode ser maior, uma vez que sem controle, as principais pragas da cultura do milho, como a Lagarta-do-cartucho (Spodoptera Frugiperda), a Lagarta-da-Espiga (Helicoverpa zea) e a Broca-do-Colmo (Diatraea saccharalis) destroem mais de 60% da safra. Ele aponta que com biotecnologia, isto pode ser reduzido drasticamente. “O milho transgênico foi desenvolvido com objetivo de proteger as lavouras do ataque de insetos, do plantio à colheita, graças à inserção em seu código genético do gene da proteína do Bt, uma bactéria encontrada naturalmente no solo. Ao ingerir a planta do milho, por exemplo, as lagartas-pragas têm o sistema digestivo destruído”, explica Fernandes. “Há mais de 40 anos, esta proteína é usada como pesticida, em culturas diversas. Os pesquisadores só retiraram do campo e levaram para dentro das sementes, tornando-as mais resistentes”, explica o gerente técnico.
Aliás, as primeiras sementes de milho GM foram trazidas por empresas que atuam no ramo, como a Monsanto, que virou símbolo da transgenia. Fundada nos Estados Unidos, a empresa recebeu o rótulo de biotecnologia por deter por muito tempo a patente da única variedade de soja modificada existente no mercado, a Roundup Ready (RR) – um marco por ter sido o primeiro transgênico cultivado pelo mundo, inclusive no Brasil.
Hoje, além da soja RR, a empresa traz ao campo a tecnologia do milho híbrido Agroceres com a tecnologia YieldGard. Com isto, a Monsanto promete revolucionar. “Além da redução das aplicações de agrotóxicos que reduz o custo, o agricultor tem menos gastos com combustível e água e, consequentemente, é menos exposto aos produtos químicos. Outra vantagem é que ao controlar os danos causados pelas lagartas, a tecnologia ajuda também a evitar a infestação de fungos, que provocam o surgimento de micotoxinas, que podem provocar risco à saúde”, esclarece o gerente técnico de Biotecnologia, Odnei Fernandes.
Nas culturas em que a tecnologia já foi lançada comercialmente em larga escala, como a soja, a escolha por variedades geneticamente modificadas entre os produtores é crescente em razão dos benefícios que apresentam. Estudos mostram que, em troca de royalties (a importância cobrada pela patente de produto), as empresas oferecem aos produtores lucros que podem chegar a 25% a mais, em comparação ao lucro obtido com o cultivo da lavoura com sementes comuns.
A opinião de quem produz
Os produtores entrevistados são quase unânimes na avaliação de que o milho GM terá grande expansão nas próximas safras. Mas ainda não há uma decisão com cálculos definitivos de área. Na Fazenda Pantaleão, de propriedade do Grupo Saad, nesta safra, dos 300 hectares (h) de milho, 40 foram destinados aos transgênicos. Segundo o gerente agropecuário geral da fazenda, Julio César Amaro Alves, as expectativas é de aumentar a área cultivada com o milho GM, já na próxima safra.
A propriedade localizada em Bragança Paulista (SP) foi pioneira na produção da variedade da soja da Monsanto e agora colhe os frutos da nova biotecnologia. “Estimamos uma colheita de 157 sacas, de 60 quilos por hectare. Enquanto o convencional chegará a 150 sacas, por hectare. Com a tecnologia, o colmo (o caule) do milho ficou mais resistente. Com isto, conseguimos prorrogar a colheita por mais tempo até atingir a umidade certa. Só isto, gera uma economia nos custos adicionais, por exemplo, com a secagem dos grãos. Quanto mais úmido estiver o grão mais caro fica para o produtor”, diz Alves.
Para o gerente, sem as lagartas-pragas, a planta produz mais energia o que se converte em produtividade. “A lavoura está mais sadia, produzindo mais e sem aplicação de agrotóxicos. Se fosse numa cultura convencional era preciso de duas a três aplicações. Aqui na propriedade, os técnicos recomendam uma, mas a gente não fez nenhuma. O resultado está aí, uma lavoura sadia do mesmo jeito”, diz o gerente.
Outro produtor que decidiu investir na biotecnologia foi o produtor Valcírio Hasckel, da Fazenda Rosaria, também de Bragança Paulista (SP). Hoje são 150 h, sendo que 100 só de milho GM. “Se possível, quero ampliar a área com milho GM no próximo ano”, revela. “Esta tecnologia é uma ferramenta importante, pois gera uma tranquilidade ao produtor. Se, por exemplo, a lagarta-do-cartucho se instalar na cultura, você não controla mais. O produtor investe mais em defensivos para tentar eliminá-las, com isto acaba gerando um desequilíbrio e quase sempre sem resultados”, conta Hasckel.
Na opinião do produtor, que espera colher 15% a mais das 140 sacas por hectare, o milho GM sai na frente, quando o assunto é vantagem. “Mesmo com o manejo adequado, a lavoura convencional perde no mínimo 10% da produtividade. Já no caso do milho transgênico, mesmo sem aplicar nenhum defensivo, a produtividade foi maior”, conta.
Para o representante técnico da Monsanto e engenheiro agrônomo Luis Gustavo Oliveira, é importante destacar que o milho GM não tem efeito sobre outros insetos, como a larva-alfinete, o percevejo, entre outros. Por isso, deve-se fazer o manejo integrado de pragas com aplicações específicas. “Ressaltamos que os tratos culturais entre uma lavoura convencional e uma transgênica são os mesmos. Orientamos aos produtores que sob alta infestação da lagarta-do-cartucho, é possível que ocorra a necessidade de medida complementar de controle. Assim recomenda-se o uso de inseticidas, quando o monitoramento da lavoura indicar 20% de plantas com cartucho, por exemplo. A tecnologia está evoluindo e a tendência que o uso de químicos na lavoura diminua cada vez mais. Na verdade, não queremos eliminar as lagartas e sim controlá-las”, diz o engenheiro agrônomo.
O medo do novo
Do ponto de vista científico, a transgenia impressiona, pois os cientistas encontraram uma forma de alterar a estrutura molecular das plantas e de enriquecê-las com genes de outras plantas ou até outros organismos vivos. Tudo isso, para buscar de um alimento com maior concentração de nutrientes ou mais resistente à ação de pragas. Nos Estados Unidos testam-se misturas de vegetais que podem, além de alimentar, combater doenças, como a hepatite B. Do ponto de vista do produtor o transgênico traz um alívio, com a promessa de reduzir custos e facilitar o manejo da lavoura. Mas, quando o assunto é mercado consumidor ainda falta informação. “Tudo o que é novo assusta. O que podemos afirmar é que no mundo esta tecnologia é segura e foi estudada”, diz o gerente técnico de Biotecnologia da Monsanto, Odnei Fernandes.
Segundo o gerente técnico, em relação à segurança alimentar da variedade de milho GM da Monsanto, quando avaliado pelos órgãos responsáveis foi considerado seguro para consumo humano, animal e também para o meio ambiente. Atualmente a variedade é cultivada em escala comercial nos Estados Unidos e Canadá desde 2003 e foi aprovada para importação e consumo humano no Japão, Coréia, Taiwan, Filipinas, Rússia e México.
As empresas reforçam que há normas de coexistência (aplicáveis a produtos aprovados por organizações que tratam de biossegurança) para o plantio. Na questão da cultura de milho é exigido uma área de refúgio, que consiste em plantios de milho não Bt ou na proporção de, pelo menos, 10% da área total de plantio de milho na propriedade. “Isso é feito para que os insetos que são resistentes à tecnologia não gerem outros imunes e anulem a eficácia do produto. Com a lavoura convencional próxima, os resistentes cruzam com os suscetíveis e mantém o equilíbrio”, explica Fernandes.
Outra exigência é que o produtor deve manter as lavouras do milho GM, a uma distância mínima de 100 metros das lavouras de milho convencional. Este critério é adotado para que não ocorram cruzamentos, entre cultivos comerciais de milho GM e de variedades não-GM.
Recentemente aconteceram especulações de que as distâncias mínimas estabelecidas pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) não eram seguras e que não havia separação no momento do transporte e armazenagem dos grãos convencionais. De acordo com o gerente de Relações Científicas da Monsanto no Brasil, Eugênio Ulian, a separação, bem como a convivência entre diferentes sistemas de cultivo tem sido praticada há muitos anos, principalmente por produtores de sementes e agricultores que produzem produtos específicos, por meio da separação dos plantios pelo tempo ou pelo espaço. “Um bom exemplo tradicional desse tipo de isolamento no Brasil é o dos produtores de milho branco e milho pipoca, que através das práticas mencionadas acima, tem grande sucesso em manter as suas colheitas livres da presença do milho amarelo, que é o tipo de milho predominante em regiões onde as duas cores ou tipos de milho coexistem. O isolamento entre culturas geneticamente modificadas e convencionais é possível e vem sendo bem-sucedida em diversos países, como a Espanha e os Estados Unidos, desde 1995”, comenta Ulian ao rebater as criticas feitas sobre o efeito do plantio do milho GM.
Enfim… a aprovação
A CTNBio aprovou em agosto de 2007 a liberação comercial do milho transgênico Guardian, desenvolvido pela Monsanto. O transgênico é o segundo milho a ser liberado para comercialização pela entidade. Em maio do mesmo ano, a comissão havia aprovado o Libertlink, da empresa alemã Bayer. Em 2009, como era prometida a semente de milho já estava disponível para os agricultores. O milho foi o quarto vegetal geneticamente modificado liberado para plantio e comercialização no Brasil, depois da soja, canola, batata e do algodão, resistente a insetos. Na opinião dos pesquisadores, passado algum tempo, os transgênicos acabam sendo incorporados como prática rotineira, e ninguém consegue pensar como seria viver sem ele.