Técnica de plantio direto garante não apenas economia e facilidade do manejo da lavoura. Ela é também uma das práticas no campo que menos agridem o meio ambiente.
Um estudo recente da ONU aponta a concentração demográfica nas cidades e a destruição das florestas, em especial a Amazônica, como os maiores problemas ambientais que a América Latina enfrentará no século XXI. Na esfera global, a preocupação primordial será a escassez de água e a desertificação de enormes áreas causada, principalmente, pelo desmatamento e o mal uso dos recursos naturais. No âmbito da atividade agrícola, o problema está nos mais de dois séculos de uso extrativista das áreas de cultivo, onde a prática indiscriminada da monocultura do algodão, cana-de-açúcar, café, cada uma a seu tempo, deixaram um legado de destruição e abandono para as gerações vindouras de agricultores.
Garantir a sustentabilidade da vida e da biodiversidade dentro das zonas agrícolas é o preceito fundamental praticado pelos adeptos do modelo de agricultura conservacionista que, hoje, tem como seu principal expoente o SPD, Sistema Plantio Direto. Esse conceito vem sendo largamente utilizado por técnicos e extensionistas rurais, tanto na agricultura como na pecuária, na busca de aumentar a consciência do homem do campo, para a preservação dos recursos naturais disponíveis em suas propriedades para seus filhos e netos. Dentro da agricultura este modelo é largamente utilizado no cultivo de culturas anuais como, milho, soja, arroz, feijão, algodão, trigo, aveia, mas, também em menor proporção em culturas perenes como, café, cítricos e cana de açúcar. De alguns anos para cá, outro setores estão atentando para essa idéia, como por exemplo o setor de hortaliças que vem ampliando bastante seus estudos no âmbito do SPD, como forma de torná-lo seu modelo oficial de produção. Sem a necessidade de remoção do solo por arado e gradagens e com a adoção da rotação de culturas, idéia essa tida pelos agricultores e técnicos como essencial para a manutenção do sistema, os resultados em algumas localidades que têm seus produtores engajados com esse paradigma, mostram resultados bastante animadores.
No entanto, a realidade mostra uma gama enorme de produtores que ainda não atentaram para esse conceito, por ceticismo ou por desconhecimento puro da técnica, e que não estão desfrutando dessa realidade, ressalta Márcio João Scalea, gerente técnico de plantio direto da Monsanto do Brasil. Segundo ele, por motivos muitas vezes de falta de sustentação econômica, alguns produtores realizam práticas que oneram a produtividade, além de causar prejuízos ao meio ambiente em regiões já bastante castigadas. Dados da Embrapa Solos, RJ, mostram que dos 42,5 milhões de ha. ocupados pela agricultura com culturas anuais, aproximadamente 40% passam por algum tipo de preparo no solo antes do plantio, situação que ocorre ainda em maior proporção com os 7,5 milhões ha. utilizados com culturas perenes. Com as áreas de pasto a realidade é ainda mais catastrófica, pois, dos mais de 120 milhões ha. cobertos com pastagens cultivada no país, cerca de 80 milhões ha. apresentam algum nível de degradação, situação que se agrava em partes do Brasil Central e das regiões Norte e Nordeste.
Scalea observa ainda que devido a rapidez na aplicação do SPD, sua prática vem contribuindo sobremaneira para a integração lavoura pecuária e proporcionando a recuperação gradativa de grandes áreas nos estados do RS, PR, SP, GO. E isso de forma rentável tanto para quem arrenda a terra, no caso o agricultor que ganha o direito de trabalhá-la por período estabelecido em contrato. Segundo o técnico, para o agricultor isso é extraordinário, pois é como se ele adquiri-se uma área com um tamanho duas três vezes maior que a sua, podendo triplicar sua produção de uma safra para outra. Para o arrendatário, no caso o pecuarista, o negócio também é interessante, pois garante a ele receber dentro de 4 – 5 anos suas terras de volta, totalmente renovadas com seus micro e macro nutrientes e cobertas com pastagem abundante. A idéia vem dando tão certo, que já existe até uma bolsa de arrendamento na região do vale do Paranapanema em São Paulo, com 32 municípios filiados, só para produtores que precisam de terra. O engenheiro agrônomo da Monsanto do Brasil, observa que no sistema de plantio convencional este esquema não funciona porque, o processo abarca toda uma série de procedimentos como aração e gradagem, tempo este que indisponibiliza a terra para plantio.
A prática do SPD está garantindo a preservação de áreas de plantio que melhoram substancialmente em intervalos de 2 a 4 anos e, em alguns casos, com um manejo relativamente simples do solo, explica Segundo Pedro Luiz de Oliveira Machado, engenheiro agrônomo e pesquisador da Embrapa Solos, RJ. Segundo ele, o plantio direto tem demonstrado de forma incisiva que o manejo convencional das terras nem sempre é o mais correto. Há muito tempo que o plantio direto vem se democratizando no sentido de ocupar seu espaço entre pequenos, médios e grandes produtores rurais. “A prática é “mais natural” porque a partir do momento em que revolve-se menos o solo, e não se altera a sua estrutura está se manejando o solo de uma forma menos agressiva, evitando sua degradação, já que o revolvimento excessivo do solo proporciona o surgimento da erosão, desde a laminar até a formação de voçorocas, que podem tornar a área irrecuperável”, conclui. São realizados anualmente, analises do solo em diferentes regiões, a fim de aperfeiçoar as estratégias de manejo da fertilidade para a produção de alimentos, sem esquecer os cuidados com o meio ambiente. Outro estudo de importância executado pela Embrapa Solos é o de avaliação da contribuição das frações da matéria orgânica na agregação do solo. A agregação do solo é um fenômeno importante no combate à erosão. Estes estudos de fracionamento físico da matéria orgânica também servem como indicadores de degradação do solo, explica Machado. “Os pesquisadores buscam checar se existe um indicador de degradação da matéria orgânica do solo que forneça uma espécie de aviso antecipado da degradação antes que ela se consolide, alertando ao agricultor de que determinado manejo de solo acarretará sua degradação completa em cinco ou dez anos”, conclui.
Para o pesquisador, a diminuição da erosão do solo através do plantio direto, em relação ao convencional, já bem documentada pela pesquisa, tem como resultado prático um decréscimo do aporte de fertilizantes e corretivos a médio prazo pelo aumento progressivo da fertilidade natural do solo, proporcionando maior rentabilidade no sistema. Então, a questão do plantio direto justamente por não permitir uma ação direta no solo e mantê-lo coberto (por palha ou resíduos da própria cultura) e basear-se, fortemente, na rotação de culturas deve ser uma questão incorporada na pesquisa de uso das terras. “A Embrapa Solos está há bastante tempo desenvolvendo pesquisas em apoio ao plantio direto. Estas pesquisas já estão fornecendo subsídios importantes”, enfatiza. segundo ele, um dos principais trabalhos feitos é o de comparação entre o Plantio Direto e o convencional (aração e gradagem). “Hoje é possível além de ver a quantidade da matéria orgânica do solo também observar a qualidade deste componente. Temos condições não só de avaliar o Plantio Direto em relação ao convencional, mas também, dentro do Plantio Direto, podemos avaliar diferentes rotações de cultura. Ou seja, tanto no Plantio Direto quanto no convencional, avaliamos a contribuição de diferentes adubos verdes na qualidade da matéria orgânica e o efeito disto na melhoria das propriedades físicas e químicas do solo”, explica.
Dados obtidos pela Embrapa Soja de Londrina, PR e pelo IAPAR, Instituto Agronômico do Paraná, utilizando técnicas convencionais de isolamento de microorganismos mostram que o Plantio Direto realmente causa um aumento considerável da biodiversidade do solo. Segundo os técnicos, isso já era esperado, uma vez que o Plantio Direto cria condições mais favoráveis ao crescimento de organismos e fauna do solo (minhocas, formigas, etc.) que praticamente são ausentes das áreas de plantio convencional em virtude da desagregação e da compactação do solo nestas áreas.
A solução encontrada pelos técnicos para esse problema foi a criação de um manejo no pós colheita. Essa técnica consiste na aplicação de um herbicida a base de “glifosato”, poucos dias após acolheita da cultura de verão, desde de que está área fique sem ter nenhuma lavoura implantada. O técnico mostra que essa técnica é indicada para áreas onde se vá deixar sem cobertura durante o inverno ou em lavouras onde haja um intervalo de pelo menos 60 dias entre a colheita de verão e o plantio da cultura de inverno. ” O manejo pós colheita garantirá melhor controle de plantas daninhas durante a cultura de inverno e também durante a cultura de verão subsequente, reduzindo a necessidade de misturas e aumentando a eficiência de herbicidas pós emergentes”. Outros benefícios que essa técnica oferece destaca-se: a redução de plantas daninhas perenizadas no momento do plantio da cultura de verão; Eliminação de fontes de inóculo para doenças bem como de fonte de alimentação para pragas que venham a atacar as culturas subsequentes: Melhoria da plantabilidade na cultura de verão, já que não haverá plantas perenizadas para atrapalhar o plantio, além da redução significativa do banco de sementes no solo.
Outra forma encontrada pelos agrônomos e que vem sendo utilizada com eficácia para controle das plantas daninhas em SPD é o manejo complementar. A técnica consiste em dividir o manejo pré plantio de verão em 2 aplicações, sendo uma primeira feita entre 3 e 4 semanas antes do plantio e a segunda no dia do plantio (aplique e plante). Essa prática garante os seguintes benefícios segundo o técnico: Eliminação de necessidade de misturas para controle de plantas difíceis, gerando maior segurança aos aplicadores bem como antecipando a aplicação de plantio em muitas situações; Forte controle do primeiro fluxo de germinação de plantas daninhas que teriam que ser controladas na pós emergência da cultura de verão, o que faz com que os herbicidas pós emergentes da cultura tenham muito melhor performance; Melhoria no controle na pós colheita da cultura também no caso de plantas daninhas resistentes aos herbicidas pós emergentes convencionais. “Caso se faça dois manejos antes do plantio, reduz-se e muito a quantidade de plantas a serem controladas, reduzindo portanto as perdas em decorrência desses agentes”.
Uma prática que vem mostrando resultados satisfatórios, não nas regiões de Cerrado, mas também em outras regiões como parte do Paraná e São Paulo, onde a temperatura limita a implantação de uma cultura como a aveia, por exemplo, é a cobertura das áreas de plantio com sorgo híbrido. Segundo o técnico, essas espécies trazem a vantagem de sua grande precocidade, aliada a rusticidade e resistência à seca, possibilitando a produção de excelentes palhadas em intervalos inferiores a 30 dias. Isso já é feito com o milheto só que está cultura é mais tardia e mais susceptível a alterações de temperatura.” O plantio no pós é uma recomendação muito interessante, pois permite em poucos dias a dessecação e o plantio com boa palhada”, ressalta o técnico da Monsanto. Outro forte aliado do plantio direto é certamente a biotecnologia que causou uma verdadeira revolução na agricultura nos últimos anos.