Plantar cana hoje parece uma atividade bastante tentadora. E é. O crescimento da demanda mundial pelo etanol, e as condições que o país oferece transformam essa cultura num negócio de baixo risco e promissor.
Mas, não se engane: há algumas medidas básicas para evitar dissabores futuros. Os novos ares que tomaram de assalto o agronegócio brasileiro apontam para um novo boom na cultura da cana de açúcar em níveis como há muito tempo não se via, ou melhor, só vistos no primeiro grande ciclo da cana, há muito tempo, por conta do açúcar, coisa típica de um país que teima em viver em sistema de monocultura. A euforia gerada pelo crescimento do interesse e, conseqüentemente, da demanda mundial pelo etanol, pode provocar mudanças radicais no perfil da agricultura brasileira. E isso já pode ser sentido no comportamento do produtor rural. Muita gente está trocando outras lavouras pela cana, ou até mesmo tirando o gado do pasto para transformar a área em canavial.
Essa reação do produtor é compreensível e até justificável. A idéia de entrar num mercado altamente promissor e com potencial de crescimento incalculável é tentadora. Mas, como tudo na vida tem um “senão”, é bom o produtor estar ciente de que planejamento, para garantir melhor rentabilidade possível da terra de que dispõe, e faro para identificar os caminhos a seguir e o funcionamento das regras do mercado, serão fundamentais para não quebrar a cara, ou virar refém das grande usinas, que são, na prática, quem manda nesse jogo.
Mas antes de se preparar para vender a sua produção, é importante tomar todos os cuidados necessários para garantir uma lavoura bem instalada, produtiva, saudável e imune às principais pragas e doenças. Além disso, deve-se escolher variedades bem adaptadas a região onde se encontra a propriedade e prover todas as necessidades nutricionais da planta, qualidade do solo e recursos hídricos disponíveis. Uma boa produção é o primeiro passo para se dar bem nesse negócio.
Como se planta
Normalmente, em áreas de renovação, utiliza-se o cultivo mínimo com aplicações de herbicidas para eliminar as socarias. Pode-se também efetuar o roço, encoivaramento e queima dos restos de cultura, seguidos de um revolvimento com arado e, em seguida, procede-se ao sulcamento. Havendo uma indicação de calagem definida pela análise de solo, esta deverá ser realizada com antecedência de, pelo menos, 30 dias do plantio.
Via de regra, a adubação é feita manualmente, e a quantidade de adubo a ser usada é definida pela análise de solo (realizada pelo IPA), podendo ser de dois tipos: fundação e cobertura.
Como pragas importantes para nossa região, temos a cigarrinha da folha e o cupim dos rebolos. A cigarrinha pode ser controlada por ação química (inseticidas) ou biológica, (fungo produzido pelo IPA), enquanto que o cupim, controla-se através do uso de inseticidas.
Normalmente, a maioria das doenças da cana-de-açúcar são de caráter secundário, excetuando-se o raquitismo das soqueiras (bactéria), que é tratado pela ação térmica ou pelo uso de mudas sadias (cultura de tecidos), produzidas pelo IPA.
É necessário realizar a limpa, porque as ervas daninhas(mato) concorrem diretamente com a cultura da cana-de-açúcar, em relação a nutrientes (adubos) e água. Existem duas maneiras de se fazer a limpa: mecânica, através de enxada e cultivador e química, por meio da aplicação de herbicidas de pré e pós-emergência.
Época de colheita
A época de colheita da cana-de-açúcar, ocorre normalmente no período de verão, ou seja, de setembro a março do ano seguinte ao plantio. Em plantios irrigado e de várzea, poderá chegar a 150t/ha, enquanto que, em áreas de encosta, sem irrigação, a cana-planta atinge até 70t/ha.
A colheita é realizada de forma manual com o corte rente ao solo. Cerca de 90% da matéria-prima é cortada e queimada, embora, em alguns casos, seja discutível a utilização dessa técnica. Antes desse procedimento, é muito importante levar em consideração a capacidade de corte e o escoamento da produção, a fim de reduzir perdas de rendimento pela demora na moagem.
A comercialização é realizada diretamente com as usinas produtoras de açúcar e álcool, e/ou nas destilarias que fabricam apenas álcool. Em menor escala, alguns produtores vendem a matéria prima em pequenos engenhos para a fabricação de rapadura e cachaça.
As principais dúvidas sobre “a nova era da cana”
Por que o assunto energia ganhou tanta atualidade?
Do ponto de vista mundial, temos a situação do efeito estufa, pela queima dos combustíveis fósseis, que está aumentando a temperatura do planeta. Há um clima de conscientização no mundo para que se encontre uma solução, seja pelo uso de fontes renováveis de energia, seja pelo sequestro de carbono previsto no Protocolo de Kyoto. O pano de fundo, então, é dado pela questão ambiental. Mas outra questão é a do preço do petróleo, que aumenta por razões políticas e também técnicas — já consumimos metade da metade das reservas conhecidas no mundo; vamos começar a ter exploração cada vez maior das reservas mais caras. Não existe chance de se descobrir uma grande reserva desconhecida — hoje já se sabe onde elas estão. Por isso — o preço do petróleo, o efeito estufa e a necessidade de energias renováveis — há uma oportunidade para o Brasil para os próximos 50 anos: o etanol. Estamos começando a exportar álcool porque os países estão entendendo que a mistura da gasolina com álcool é um bom negócio, do ponto de vista econômico, ambiental, de marketing. A questão que se coloca hoje é se somos capazes de produzir grandes quantidades para atender ao mercado externo em larga escala.
Mas o que é mais eficiente: obter álcool da cana ou do milho?
Nos Estados Unidos, o esforço para obter álcool do milho vale a pena tecnicamente e politicamente. Há um componente político forte, para satisfazer os produtores de milho. Um país, quando faz uma investida como essa, ou busca atender a necessidade de substituir a gasolina, ou atender às necessidades políticas; ou ambas. No início da produção de álcool no Brasil, buscou-se atender o setor sucroalcooleiro e também substituir a gasolina. Vemos hoje que vale a pena o que fizemos porque somos capazes de reduzir os custos de produção. Aprendemos a fazer um álcool barato, nesse volume que estamos produzindo. O mercado mundial produz algo como 40 bilhões de litros; para se substituir 10% da gasolina no mundo, será preciso produzir cerca de 150 bilhões de litros. Se o Brasil for produzir algo em torno de 110 bilhões de litros por ano, teremos de passar nossa área agrícola de 5,5 milhões de hectares de cana para 30 milhões de hectares, aproximadamente. Isso é muito ou é pouco? A área plantada total no Brasil é de 55 milhões de hectares, a gente passaria para em torno de 75 milhões. Mas isso vai ter de ser feito em um período de 10, 15 anos, e seria o equivalente a um Proálcool a cada dois, três anos.
Para que isso seja possível, porém , é preciso investimento. “Ser capaz” significa terra, dinheiro, avaliar o impacto ambiental, o benefício social. Se o País produzir 130, 140 bilhões de litros e vender isso a R$ 1,00 o litro, teremos R$ 140 bilhões por ano, cerca de US$ 50 bilhões. É muito dinheiro, representa 40% das exportações atuais. Imagine se o Brasil, de repente, tivesse uma atividade que gerasse R$ 140 bilhões anuais e mais de 5 milhões de empregos. Em uma janela de 50 anos, o álcool é capaz de gerar muito emprego e muita renda, e com pouco investimento.
Estão buscando outras matérias-primas para produção de álcool, além do milho e da cana?
O mundo produz muito álcool a partir do açúcar da cana e do amido do milho. São as duas fontes mais utilizadas. Mas a matéria-prima mais abundante para isso é fibra, bagaço ou palha de cana; resíduos do milho; casca de arroz; restos de cultura de soja. Uma tecnologia que converta fibra em álcool e uma tecnologia para coletar o resíduo aumentarão a produção com a mesma área plantada. Essa é uma oportunidade para o Brasil. Existe um panorama favorável a isso nestes próximos 50 anos porque o mundo está disposto a encontrar uma solução para os combustíveis, e não sabemos quanto tempo essa oportunidade vai durar. Por isso, temos de fazer um esforço para ter tecnologia própria, aumentar a produção de álcool e exportar.
Qual o perfil do nosso setor sucroalcooleiro?
São 320 usinas, algumas de capital estrangeiro, mas a maior parte ainda de capital nacional privado. Essse perfil já começou a mudar. A produção brasileira de cana é da ordem de 400 milhões de toneladas, sendo que as menores unidades produzem 0,6 milhão e as maiores 6 milhões de toneladas. A maioria das unidades está entre médio e grande porte. Em relação à propriedade das terras, 70% delas pertencem às próprias usinas. Temos 60 mil fornecedores de cana. No geral, a usina tem apenas uma parte da plantação de cana. Há usinas que estão indo muito bem, outras que estão mal economicamente. Diria que 80% da produção está na região Centro-Sul; o Estado de São Paulo deve produzir algo como 55%, 60% da produção brasileira. No Nordeste, a produção se localiza basicamente entre a Paraíba, Pernambuco e Alagoas, sendo este último o maior produtor.