O cruzamento industrial continua mostrando que é um caminho eficaz para a obtenção de animais rústicos e precoces, aptos a reprodução a campo, e produtores de carne de qualidade superior.
Que o cruzamento industrial é uma ferramenta muito eficiente para maximizar a produção de carne, encurtar o ciclo pecuário e, conseqüentemente, aumentar a rentabilidade, somente os neloristas mais ortodoxos questionam. Mas é certo também que sua prática depende de bom planejamento, aporte de tecnologia considerável e domínio total do processo produtivo. Questões como: O que fazer com a fêmea cruzada? Qual a disponibilidade de pastagens para um consumo maior? E quais técnicas reprodutivas serão empregadas? São algumas que precisam de resposta prévia.
Traçado o planejamento, definida a linha de produtos que o mercado demanda e a propriedade pode atender, a escolha correta da raça parceira também é de grande importância. Para uma empreitada que precisa manter as fêmeas em reprodução, inclusive aproveitando-as no comércio de receptoras, e gerar machos precoces e com bom rendimento de carcaça, o gado Santa Gertrudis mostra grande desempenho. É o que podemos constatar a partir das experiências das fazendas Pantano, em Ribas do Rio Pardo (MA), e São Judas Tadeu, em Santa Rita do Pardo, também em Mato Grosso do Sul.
Ambas escolheram o cruzamento industrial como ferramenta de produção de carne de qualidade e em escala. O objetivo é conferir aos trabalhos um salto à frente, em relação à forte concorrência da região, que se encontra entre os principais pólos produtores da pecuária nacional. Ambas escolheram o cruzamento industrial como ferramenta de produção de carne de qualidade e em escala. A Santa Gertrudis, uma raça sintética com origem nos Estados Unidos, mostra toda sua força na imposição de suas características produtivas, tais como fertilidade, habilidade materna e rusticidade e abre uma série de perspectivas aos seus empresários.
Na fazenda Pantano, propriedade da Energo Agroindustrial, empresa do grupo Bardella, cuja atividade principal é o reflorestamento, o Santa Gertrudis entrou basicamente na formação de um three cross diferenciado, já que na maior parte de projetos similares, a estratégia seria de produção de um cruzamento terminal. Na Pantano, as fêmeas F2 não seguem para a terminação e se mantêm na reprodução. Segundo Thiago Amstalden Rubega, veterinário responsável, uma dos principais motivos da escolha do Santa Gertrudis foi exatamente esta possibilidade que ela proporciona. “Precisávamos de uma raça que nos permitisse obter em F2 boas mães, atraentes no mercado de receptoras, mas, fundamentalmente, indicadas para à reprodução a campo em nossas condições”, justifica.
A pecuária da Pantano vem da atividade de uma atividade de cria, recria e engorda a partir de um rebanho anelorado, em regime extensivo. Em 1998, para melhorar a base de matrizes e agregar valor ao criatório, a Energo passou a selecionar a raça Nelore. Porém, em 2004, a partir da introdução da inseminação artificial, o trabalho começou experimentar raças como a Aberdeen, a Red Angus, o gado Simental e o Limousin. Deste trabalho, em geral, as fêmeas 1/2 sangue saíram muito boas, dando sérios indicativos de que a produção de um three cross seria o caminho mais acertado. Foi então que o Santa Gertrudis entrou para o time, por meio de sêmen e da cobertura de touros a campo.
Desde então, das vacas nelore, a cabeceira passou para a inseminação com Nelore, e as demais com Hereford, estratégia que no ano passado sucumbiu frente ao desempenho do Santa Gertrudis, passando tudo para a raça sintética. Na estação de monta de 2006, 1,5 mil matrizes receberam sêmen da raça por meio de IATF – Inseminação Artificial em Tempo Fixo. Dessas, 200 eram 1/2 sangue Santa Gertrudis, 200 de outra raça européia e 1,1 mil Nelore. Apenas 300 reses zebuínas receberam material Nelore de ponta. O restante, sêmen Santa Gertrudis.
Vale destacar que essas 200 1/2 sangue Santa Gertrudis possuem registro de M1 (livro para registro de fêmeas cruzadas que entram em processo de obtenção da raça por meio de cruzamento absorvente), que permite a produção de M2, um 3/4 e depois o 7/8, que considerado Santa Gertrudis PO. Entretanto, o repasse ficou por conta de touros Nelore. Como resultado, na desmama dos produtos em 2006, os machos three cross pesaram em média 260kg, contra 190kg dos Nelore. Entre as fêmeas, 210kg para as cruzadas e 170 para as nelore.
Segundo o vice-presidente da Associação Brasileira do Santa Gertrudis, Luiz Fernando Doneux Júnior, “o desempenho da raça no cruzamento industrial não é novidade, apesar da pouca divulgação. Há empresas de renome do setor trabalhando em grande escala, como as Fazendas Bartira, com propriedades em São Paulo e Minas Gerais. A empresa faz cruzamento industrial e continua o trabalho de seleção da raça iniciado por um dos seus mais tradicionais criadores, no Brasil, que foi a King Ranch do Brasil.
Mas a satisfação dos dirigentes da Pantana veio mesmo com o resultado na produção frigorífica, a partir de uma dieta exclusiva de pasto e mineralização apropriada. Em março deste ano, realizou-se o abate da última leva de 2006, ou seja, do fundo do rebanho. Animais totalmente rastreados pesaram em média 17,9 arrobas aos 30 meses de idade e obtiveram padrão de carne tipo exportação. Em outubro do ano passado tinha sido a vez da cabeceira da safra, que reuniu reses com peso médio de 17,5 arrobas e idade entre 24 e 26 meses, com o mesmo rendimento de carcaça e acabamento de gordura.
Para o gerente operacional da Energo, Célio Siqueira Gios, os números do trabalho trazem um grande alento. “Na verdade, eles mostram que estamos em um bom caminho para alcançarmos nossos objetivos. Entre as metas está conseguirmos ser competitivos na produção de carne de qualidade a partir de animais diferenciados que agregam valor ao nosso patrimônio. Neste caminho, estamos estimulados a continuar nossos investimentos, aguardando dias melhores em termos de remuneração. O aperto de liquidez é geral, mas estamos bem”, justifica.
Outro trabalho que não deixa por menos é o da Fazenda São Judas Tadeu, propriedade de Odair Salla, em Santa Rita do Pardo. Em um rebanho de 5,5 mil matrizes, o touro Santa Gertrudis trabalha em metade delas na cobertura a campo. O sol é forte, mas os animais não escolhem a sombra. Eles caminham o tempo todo e ainda fazem frente aos carrapatos, mostrando enorme adaptação ao cerrado sul-matogrossense. Cerca de 80% dos bezerros nascidos em 2006 estão desmamados e mais uma vez o Santa Gertrudis mostrou sua força na parceria.
Segundo o gerente da propriedade, Antonio Oliveira Filho, o desempenho da desmama foi diferencial evidentemente para o fechamento das contas da fazenda, mas também para o seu processo produtivo como um todo, em função de calorização. Machos 1/2 sangue pesaram em média 240 kg, contra uma faixa ampla dos Nelore entre 180 e 220kg. Entre as fêmeas, 200 kg para as F1 e entre 160 e 180kg para as Nelore. A propriedade conta com o auxílio do creep feeding com farelo de algodão, milho e sal mineral proteínado na época das águas. Na recria, o sal é apropriado à estação seca com coleta de volumoso direto nas pastagens.
A expectativa do pecuarista Odair Salla, em torno da produção frigorífica da São Judas é a melhor possível, graças à boa safra de bezerros 1/2 sangue. “Temos uma bezerrada com grande potencial de engorda e tenho certeza que dando as condições devidas, teremos resultados ainda mais positivos”, destaca. Odair Salla também selecionador de Santa Gertudis PO. Foi justamente da observação de sua seleção que decidiu utilizar a raça sintética no cruzamento industrial.
José Arnaldo Amstalden, superintendente técnico da Associação Brasileira de Criadores de Santa Gertrudis aposta na boa produção da São Judas Tadeu e até sugeriu a produção de M2 para algumas das bezerras observadas no campo. Isso significa que o bom desempenho das fêmeas, a exemplo do observado na Fazenda Pântano, também é decisivo na possibilidade de agregar valor genético ao rebanho e constituir uma base diferenciada de matrizes.