Pecuária

Leite: produtor adota a cultura da qualidade

Menos de um ano após a vigência da Instrução Normativa 51 editada pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, que instituiu critérios para a produção, controle de qualidade, armazenamento e transporte do leite, constata-se que os novos procedimentos vêm fixando uma nova cultura do setor produtivo que passou a priorizar o aspecto qualitativo da atividade.

A produção de leite do Espírito Santo, embora represente apenas dois por cento do volume nacional, assume expressiva importância social pelos cerca de 30 mil postos de trabalho que são gerados pela atividade. A produção estadual atinge a 395 milhões de litros anuais, mobilizando 16 mil produtores, enquanto a produção nacional alcança 25 bilhões de litros por ano.

Para o presidente em exercício da Federação da Agricultura e Pecuária do Espírito Santo (Faes), Júlio Rocha Júnior, o mercado para os pequenos e médios produtores precisa ser mais bem planejado. “A atividade leiteira no Estado tem que deixar de ser vista apenas como umas das responsáveis pela ocupação da mão de obra e geração de renda para a agricultura familiar para ser trabalhada com mais profissionalismo. Isso requer a adoção de tecnologia para aumentar o retorno no preço do litro do leite”, disse o dirigente da entidade.

A produtividade média de uma matriz leiteira no Espírito Santo é de 1.140 litros por ano. O rebanho leiteiro soma 347 mil vacas sendo que 75% da produção é fornecido por pequenas propriedades com produção diária de até 100 litros. A mudança de comportamento dos consumidores, a reestruturação da logística de industrialização e distribuição de lácteos e a abertura do mercado internacional vêm determinando uma rápida transformação na cadeia agro-industrial de leite no Brasil.

Em agosto de 2005 o governo do Estado reduziu o ICMS do leite de 12% para 7%, beneficiando cerca de 16 mil produtores. O presidente da Faes, Júlio Rocha reconhece que a desoneração tributária foi uma importante medida de apoio e contribuição ao setor. Mas a pecuária leiteira capixaba ressente de políticas de médio e longo prazo que incluam necessariamente a capacitação técnica do produtor

Resfriamento

O presidente do Sindicato Rural de Cachoeiro de Itapemirim e também produtor de leite no município, José Garcia, relata que a IN 51, só veio a contribuir. “Praticamente 560 dos produtores de Cachoeiro de Itapemirim já adotaram os tanques de resfriamento, a adaptação está sendo boa, pois os produtores estão percebendo que o melhoramento na qualidade do leite contribui principalmente com o aumento do preço que é pago aos produtores. No momento o valor está variando de R$ 0,40 a R$ 0,45”, diz José Garcia que informa ainda que a adaptação aconteceu, através dos cursos oferecidos pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Rural, Administração Regional do Espírito Santo (Senar-AR-ES) sobre Qualidade do Leite.

Segundo o produtor de leite, Jonas Altoé, de Cachoeiro de Itapemirim, a profissionalização da atividade leiteira no Estado já vem ocorrendo gradativamente. “O produtor já está percebendo que se não se profissionalizar perde com produtividade e qualidade, consequentemente, o valor do preço por litro de leite também cai”, confirma.

Já o produtor de Alegre, Romário Martins de Oliveira, observa que nos últimos anos houve um crescimento considerável do setor no Espírito Santo. “Porém, vivemos hoje uma crise no agronegócio do leite, talvez pela falta de incentivo do poder público, uma vez que, temos conhecimento de que países vizinhos como a Argentina, devido a esta proteção estatal, concorrem conosco de maneira desleal, colocando seu produto subsidiado em nosso mercado”, indaga o produtor.

Romário Martins declarou que o maior impacto decorrente da implantação da IN 51 decorreu do investimento requerido para a aquisição do equipamento de resfriamento. Um tanque de mil litros observou o produtor, custa cerca de R$ 18 mil. Para ele o investimento se justifica porque o além de melhorar a qualidade do produto o equipamento permite flexibilidade do horário de ordenha proporcionando condições de melhor administrar os turnos da mão de obra.

Fiscalização falha

Para o presidente da Cooperativa Agropecuária do Norte do Espírito Santo (Coopnorte), João Marcarini Filho, a fiscalização é falha. “A questão da qualidade do leite, não se resume ao resfriamento do leite na propriedade. Começa na higiene da ordenha e saúde da vaca. Além disso, não existe uma fiscalização profissional – se age segundo o interesse e a conveniência -, sem falar da Inspeção Municipal e Estadual que não existe no setor leiteiro. Os próprios municípios não têm controle do leite produzido”, informa João Marcarini.

Não somente a seca dos últimos meses, mas a falta de profissionalismo também é um fator que vem prejudicando a atividade para o presidente da Coopnorte. “As secas sempre existiram no Espírito Santo, então pergunto: Por que ela sempre encontra o produtor de leite desprovido de reservas de comida? Porque o produtor não tem nenhum critério técnico para trabalhar a atividade leiteira, ela fica à deriva de estação climática favorável, com isso, toda a cadeia sofre a influência da improvisação do produtor”, indaga João Marcarini.

Foco no leite

O presidente da Cooperativa de Laticínios Selita, Rubens Moreira, explica que a pecuária de leite no Espírito Santo ainda é desmerecida por muitos órgãos governamentais. “O sul do Estado já tem tradição na produção de leite, o norte está se consolidando, mas a pecuária de leite no Espírito Santo ainda não está no foco dos órgãos governamentais. No ano passado, o governo do Estado deu uma grande contribuição com a redução do ICMS, mas é necessário avaliar a competitividade dos lácteos do Estado no mercado brasileiro e internacional e trabalhar no sentido de melhorá-la”, salientou Rubens Moreira.

O preço recebido pela cooperativa em fevereiro e pago em março está na faixa de R$ 0,50, livre no bolso do produtor. Segundo Rubens os preços pagos pela Selita, são um dos melhores do Brasil. “A remuneração poderia ser melhor se não fosse o problema do aumento das importações no ano passado, que está vinculado à desvalorização do dólar e a redução da competitividade do Estado em relação a Minas Gerais e Rio de Janeiro”, justifica o presidente da Selita.

Com o objetivo de promover a melhoria da qualidade do leite e derivados, garantir a saúde da população brasileira e aumentar a competitividade dos produtos lácteos em novos mercados, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) criou O Programa Nacional de Melhora da Qualidade do leite (PNQL) com base na Instrução Normativa 51, que estabelece critérios para a produção, identidade e qualidade do leite.

Entre as exigências do programa, estão a obrigatoriedade do resfriamento do leite cru e seu transporte a granel, além do atendimento a requisitos básicos de sanidade e de estrutura física para o acondicionamento do leite nas propriedades rurais. Houve também uma mudança radical nas normas de plataforma (contagem bacteriana, crioscopia, acidez, redutase, células somáticas etc.), assim como a introdução de normas de origem (animais controlados, refrigeração na propriedade e coleta a granel).

Atendendo a legislação, o Serviço Nacional de Aprendizagem Rural – Administração Regional Espírito Santo (Senar-AR-ES) -, com o apoio do Serviço de Apoio às Micros e Pequenas Empresas do Espírito Santo (Sebrae-ES), realiza vários cursos voltados para o produtor de leite para que conheçam os parâmetros de qualidade adotados nessa legislação e quais são os mecanismos de controle.

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