O oeste de Santa Catarina apresenta as maiores concentrações de suínos de todo o Brasil. A região é o berço no País do sistema de criação integrada aos frigoríficos e mantém sua importância nessa cadeia, abrigando aproximadamente cerca de 3,7 milhões de exemplares, o que corresponde a quase 30% do plantel nacional. A outra faceta desta participação significativa é o elevado volume de dejetos líquidos produzidos pelos animais, alojados, sobretudo, em pequenas propriedades. E a quantidade destas fezes e urina provenientes de suínos varia em função de características, como idade, tamanho, tipo de alimentação e manejo recebidos.
Segundo estudos, estes animais destinados ao abate, que tem de 25 a 100 quilos, produzem média de 7 litros de dejetos, diariamente. Além disso, de acordo com alguns especialistas em gestão ambiental, a carga poluidora dos dejetos suínos chega a ser 25 vezes maior do que o esgoto humano. Imagine então, uma granja de 300 matrizes instaladas, em ciclo completo, por exemplo, produziria cerca de 45 mil litros de dejetos por dia, equivalente à poluição de uma cidade de 75 mil habitantes.
De acordo com o pesquisador Paulo Armando de Oliveira, da Embrapa Suínos e Aves, unidade da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, vinculada ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, com sede em Concórdia, Santa Catarina, toda esta característica implica em cuidados redobrados com o manejo. E encontrar uma solução para os dejetos suínos é um dos principais desafios para todos os setores envolvidos com a suinocultura.
Hoje, porém, já é possível encontrar estas alternativas que funcionam com eficiência e servem até de alternativa de renda para as pequenas e até grandes propriedades. Uma granja de suínos instalada em Leme, interior de São Paulo, teve uma preocupação especial com a questão dos dejetos suínos e buscou a melhoria, sobretudo a do meio ambiente. Com 1.700 matrizes, a Fazenda Santa Rosa, instalou através do projeto da AgCert, empresa especializada em soluções ambientais (que está atuando desde 2003 em parceria com suinocultores na implantação de projetos) um biodigestor, que além de evitar a contaminação do meio ambiente, produz um adubo orgânico líquido que pode ser utilizado em hortas em pomares. “A nossa principal preocupação, como grandes criadores, era com o meio ambiente. Os efluentes (mais conhecidos como chorume) muitas vezes eram aplicados sem critério nas lavouras da propriedade”, comenta Pedro Roberto Gabone, gerente da Fazenda Santa Rosa.
“Atualmente, esta responsabilidade com o meio ambiente no tratamento dos resíduos da atividade da suinocultura está cada vez mais sendo cobrado do produtor, no que se refere à legislação ambiental”, lembra David Jacob, da Agcert Soluções Ambientais.
Com o biodigestor, em um processo de biodigestão dos rejeitos, que permite uma estabilização biológica do dejeto com possibilidade de sua utilização como biofertilizante, o produtor também tem o benefício de gerar até o biogás (cujo gás preponderante é o metano) que possui alto poder calorífico, e possibilita a sua utilização na propriedade rural em sistemas de aquecimento e geração de energia. “Hoje, este gás é utilizado como combustível para duas motos bombas e para secagem de grãos, na cultura do milho. Calculo hoje uma grande economia por mês”, esclarece Gabone.
Neste sistema, o produto final passa por tratamento complementar, como lagoas de estabilização. Via de regra, o sistema tem um abatimento de 70 a 80% da carga orgânica, ou seja, ele reduz o poder poluente do dejeto nestas percentagens.
Processo do Biodigestor
De acordo com o gerente de produção da granja Santa Rosa, Fernando Rebelato, são nos galpões dos suínos que são retirados a cada dois dias os dejetos através das laminas de água. E num processo automatizado, que se encaminha os dejetos canalizados, por tubos, e das pocilgas para os biodigestores. “Nos biodigestores, totalmente fechados, os dejetos entram em processo de fermentação por bactérias anaeróbicas (que se desenvolvem em locais sem oxigênio). O processo natural transforma material orgânico em biofertilizantes e gás”, diz David Vanni Jacob, Gerente de Operações Ambientais.
O gás metano, por exemplo, é conduzido para geradores termelétricos, que o queimam, transformando-o em energia elétrica. Parte deste gás, convertido em carbono, não aproveitado é queimado e é 21 vezes menos agressivo à atmosfera que o gás original.
Para Jacob, a procura por estes mecanismos são feitos em grandes propriedades, com uma média acima de 375 matrizes de cio completas. O custo fixo para o projeto varia de cada propriedade e de fatores internos, como tamanho, solo, quantidade de água utilizada para a limpeza da criação.
Num período de um ano e meio muitos produtores já foram visitados pela empresa para abrigar o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo, o MDL. Destes 320 já assinaram contrato. É produtor, segundo a empresa, enxergam de imediato os benefícios que vão além da remuneração das reduções das emissões de gases do efeito estufa: Eles estão entrando em uma nova era da suinocultura, com propriedades limpas.
Soluções em pequenas proporções
Já nas pequenas propriedades, com a não utilização do biodigestor, o criador pode reverter isto em benefícios próprio e com muito mais obtenção. Na Granja Querência, localizada em Salto, interior de São Paulo, mesmo com a produção em torno de mil matrizes a aposta foi simples e para aproveitar todos os dejetos suínos como fertilizantes, com resultados positivos. “Os dejetos podem ser considerados, primeiramente um problema, mas a realidade é outra quando se tem benefício que se consegue dentro da própria produção”, afirma Weber Dalla Veccchia, diretor da granja.
Lá na Granja Querência, todos os resíduos retirados nos galpões são despejados na caixa de decantação, por gravidade. Além disso, eles utilizam um decantador, para separar o lodo, que é aplicado através da fertirrigação (com tubulações e encanamentos, ligados a emissores chamados de gotejadores) na cultura no campo, como nas pastagens e também nas ervas cultivadas, uma particularidade da propriedade para a utilização de tratamentos homeopáticos e fitoterápicos dos suínos. O custo com a construção das caixas de decantação, é relativamente baixo, e pode ser feito em uma pequena área, utilizando até materiais da própria granja. Já as lagoas necessitam ser feitas em áreas médias da propriedade.
Com o líquido, que passa por diversas lagoas, algumas com 50 centímetros de profundidade, a carga orgânica é reduzida. O sistema mostra uma maior velocidade à degradação de matéria orgânica e à remoção de poluentes e patógenos. Além disso, é mais eficiente no tratamento da água e ocupa menor espaço. “Ele é especialmente indicado para quem tem grande volume de suínos, mas não possui muita área para utilizar o lodo”, disse o diretor da granja.
A água obtida no final do sistema não é potável, mas tem níveis muito mais baixos de matéria seca, nitrogênio, fósforo e coliformes fecais do que o líquido resultante do outro sistema. “Às vezes, esses níveis são tão bons que permitiriam que a água retorne para a propriedade para a reutilizá-la, na lavagem das instalações, por exemplo”, revela Vecchia.
Na granja, o aproveitamento dos dejetos suínos fecha um ciclo da própria criação.