Todo o período de clima seco desafia nossos produtores a montarem uma estratégia na propriedade, de forma a garantir disponibilidade de alimento, em quantidade e qualidade suficientes para a manutenção de sua produção, seja ela de leite ou de carne. Uma das formas mais eficazes de se garantir, sem dúvida, é através de ensilagens. Tecnologia bem antiga, largamente utilizada e com uso cada vez maior na nossa pecuária, a ensilagem garante boa forragem em épocas de baixa disponibilidade de pastos ou como parte de uma dieta elaborada, garantindo resultados de produção em qualquer momento do ano. Culturas como milho, sorgo e capim têm sido as mais utilizadas para a ensilagem, variando conforme o conhecimento local ou pela tradição da cultura em determinadas propriedades. O desenvolvimento de novos produtos estão viabilizando também novos empreendimentos em áreas aonde aquelas culturas não estão presentes, aproveitando o imenso potencial que o produto pode proporcionar, em termos de quantidade e baixos custos de matéria seca.
É nesse período, agora, que uma boa parte das propriedades do sudeste e centro oeste estão se movimentando para fazer uma das silagens mais tradicionais no Brasil , as silagens de milho e de sorgo. Por ser a base da dieta que será fornecida aos animais durante a maior parte do ano, e em algumas situações durante todo o ciclo, indicam a importância que se deve dar a esse processo. Quem já está habituado a fazer silagens domina muitos dos aspectos que refletirão em um bom produto final, mas muitas vezes até quem tem essa experiência, merece avaliar em detalhes pontos que muitas vezes passam despercebidos e podem resultar em um produto final, sem todo o seu potencial nutritivo e, não raramente, com muitos riscos presentes.
Muito tem se falado da necessidade de se identificar o melhor momento para o corte da cultura, da interferência do tamanho das partículas no processo de fermentação, das perdas por uma compactação deficiente, além dos problemas relacionados a uma vedação mal feita. Sem dúvida, deve-se ter muita atenção com todos os cuidados mencionados, pois nenhuma silagem será de boa qualidade se eles não forem observados. Alguns outros detalhes do processo de ensilagem, cada vez mais, chamam a atenção de produtores e pesquisadores em relação à qualidade das silagens fornecidas aos animais.
Tecnicamente, o principal objetivo em um silo é o de se conseguir um ambiente sem ar e com PH baixo para que as bactérias e fungos presentes normalmente na cultura e no ambiente sejam controlados e o material ensilado se mantenha conservado. O maior desafio do produtor é entender de fato o que ocorre dentro de um silo e de que forma a escolha de um incoculante bacteriano pode interferir, proporcionando ganhos que justifiquem sua aplicação. A necessidade de se conseguir um ambiente sem ar e que a redução do PH da silagem ocorra o mais rápido possível, se deve ao fato de que ,em ambientes sem a presença de oxigênio, as bactérias patogênicas não se desenvolvem. A mesma situação ocorre quando o PH é baixo.
Uma cultura de milho recém-ensilada tem um PH em torno de 6,0. Já o PH mínimo recomendado, para que haja uma boa conservação da forragem, é abaixo de 4,0, quando, então, temos a garantia de que não estará ocorrendo a multiplicação das bactérias na silagem. O milho, pela sua natureza, é uma cultura rica em açúcares e com matéria seca alta (em torno de 35%), ajudando muito o processo de fermentação, de forma natural. Por outro lado, é uma cultura que necessita de cuidados redobrados no momento da abertura do silo, pois há uma facilidade de ataque por leveduras e fungos. Toda planta contém uma quantidade própria de bactérias que, de forma natural, trabalham para a produção de diversos ácidos, e assim fazem com que o PH da ensilagem diminua, gradativamente, até atingir o objetivo descrito acima. A diferença fundamental, quando se utiliza um inoculante correto é que a velocidade com que ocorre a redução do PH seja acelerada, fazendo com que o PH de segurança seja atingido rapidamente. A rápida velocidade na redução do PH pela adição do inoculante impede que as bactérias patogênicas consigam se multiplicar e produzam toxinas antes mesmo de serem controladas pelos ácidos produzidos apenas pelas bactérias naturais da planta, no caso de silagens não inoculadas.
Um outro ponto, relacionado a essa velocidade de diminuição do PH, que é a conservação dos nutrientes da silagem. Na medida que conseguimos uma redução rápida do PH, mais nutrientes da planta terão sido conservados, resultando em menores perdas. Só para se ter uma idéia, silagens não inoculadas de milho podem ter perdas entre 2% à 5% por fungos, além de perdas no processo de fermentação, variando de 10% à 13% em gases, álcool e efluentes.
Além da necessidade de redução de pH, temos um outro fator que tem se demonstrado muito importante, no caso de silagens de milho e sorgo. Quando a silagem está fechada, o baixo PH e a ausência de oxigênio impedem o ataque de bactérias e fungos do ambiente. Assim que a silagem é aberta e o material entra em contato com o ar, o processo de ataque e crescimento de bactérias patogênicas e fungos se reinicia e, aí, sim, temos, de novo, grandes problemas. O aquecimento que observamos na frente do silo nada mais é do que o reinicio das fermentações que estão gerando, novamente, perda de material e o desenvolvimento de fungos e leveduras que deterioram mais a silagem e produzindo toxinas, em especial as micotoxinas. Perdas de ensilagem pelo ataque de fungos e leveduras são descritas entre 5% à 7%. Para se prevenir disso, mais uma vez, a composição do inoculante será fundamental para que possamos ter um controle mais efetivo desse ataque, quando formos abrir o silo.
Além das perdas diretas do material ensilado, as consequências pela ingestão de uma silagem inapropriada reflete-se diretamente no desempenho dos animais. Relato de casos de problemas reprodutivos correlacionados à presença de micotoxina nas silagens tornam-se cada dia mais frequentes, fruto de uma melhor observação e da grande sensibilidade dos animais de alto potencial produtivo. A importância de uma inoculação, feita com produtos apropriados, irá garantir que, quando a silagem esteja sendo utilizada, esteja protegida contra o ataque de leveduras (que fermentam a silagem e reduzem seu valor nutritivo), além do ataque de fungos que produzem micotoxinas. As mais comumente encontradas é a zearalenona. Essa micotoxina acaba produzindo efeitos de inibição de consumo, além de efeitos como lesões no fígado, redução da imunidade e efeitos na esfera reprodutiva que se caracterizam por menores índices de fertilidade.
Paulo Roberto Soeiro: Médico Veterinário formado pela UFRRJ (Univers. Fed. Rural do RJ) e MBA pela Fundação Dom Cabral, atualmente é Gerente Brasil da Lallemand Animal Nutrition.