Se no meio de uma roda de criadores de Caracu você perguntar porque os pecuaristas optaram por esta raça para segmentar os seus rebanhos, pode ter certeza que a grande maioria irá citar junto com a resposta que criar Caracu é, antes de tudo, uma tradição de família. De geração a geração, a raça vem conquistando cada vez mais seu espaço dentro da pecuária nacional. Presente no Brasil desde 1534, o gado de origem européia enfrentou e venceu durante todo este tempo os mais diversos desafios, tais como: o clima quente, alimentação escassa e doenças. Por conta disso, tornou-se um animal extremamente rústico e adaptável às condições brasileiras de criação. “O Caracu é o mais adaptado dos adaptáveis”, resume em poucas palavras a pecuarista Isabel Penteado, da Fazenda Aurora.
O amor pela raça se faz presente na vida dos criadores como uma espécie de herança genética que se reforça com o passar do tempo. “Eu costumo dizer que eu não crio Caracu, mas sim que sou criado por ele”, declara o pecuarista Sady Loureiro, neto e filho de criadores da raça. “E para não deixar a tradição acabar, agora já é o meu filho, Sady Neto, quem toma conta de nosso plantel. Já é o terceiro Sady no Caracu”, brinca o pecuarista.
Como Sady, o pecuarista Moacir de Melo, da Fazenda Santo Agostinho, também está passando ao filho toda experiência adquirida durante anos com a raça, tanto que, atualmente, ele tem como sócio de sua propriedade localizada na cidade Palmas, PR, seu próprio filho, Virgílio César de Melo. “Em 1940, meu pai iniciou seu trabalho junto ao Caracu. Estou dando continuidade ao que já vinha sendo feito e passando ao meu filho todo o meu conhecimento e paixão pela raça”, diz Moacir. Ele, que além de pecuarista também é advogado, preconiza em seu trabalho a produção de novilhos precoces, que vão para o abate com idade entre 17 e 18 meses. O criador define sua atividade como uma espécie de válvula de escape para os problemas enfrentados no seu dia-a-dia. “É realmente um remédio para o stress”. Além disso, o pecuarista destaca as inúmeras qualidades inerentes à raça. “Ela tem características que a tornam única. A vaca, por exemplo, é muito dócil, rústica, excelente mãe e muito boa de leite. É um animal pouco exigente em relação à alimentação e de fácil manejo”, conclui.
Estes são apenas alguns exemplos de como esta tradição está sendo passada através dos séculos. Mas, o aprimoramento da raça e os bons resultados que ela apresenta, principalmente em relação na sua participação no cruzamento industrial com raças zebuínas, vem fazendo com que novos criadores optem pelo Caracu.
A casa do caracu
A cidade de Palmas, PR, pode ser considerada o centro de referência da raça. Lá está instalada a sede da ABCCaracu – Associação Brasileira de Criadores de Caracu, que completou 25 anos de existência. O aniversário contou com uma comemoração digna das tradições do Caracu, no Parque de Exposições Pé Vermelho, durante a Exposição Nacional da Raça. Durante o evento estiveram presentes técnicos, veterinários e selecionadores de todo o país.
De acordo com Lício Isfer, criador há 17 anos e ex-presidente da Associação, o papel principal da entidade nestes 25 anos foi o fomento da raça. “Durante todo este período, estamos promovendo o Caracu, colocando-o em destaque e mostrando suas qualidades”. Segundo o criador, os usuários da genética Caracu estão todos muito satisfeitos, pois hoje, a raça se nivela a todas as raças européias, com a vantagem de estar em uma situação privilegiada por ser um gado adaptado. “Mas, não adianta só dizer que temos uma raça boa, é preciso mostrar resultados e estamos em uma situação ideal para fazer isso, pois quem usa o Caracu hoje usa tecnologia de ponta”, declarou.
A entidade teve sua primeira sede na cidade de Curitiba, em 1980. Seis anos depois, a sede foi transferida para Palmas, sob a presidência de Antônio Evilazio Reis. Hoje, ela conta com 210 associados no Brasil, sendo 46 em Palmas, e tem como presidente o pecuarista Flávio Fioravanti Junior, o Flavito. Bisneto de um dos sócios-fundadores da primeira associação, ele comentou o nível dos animais ali apresentados na exposição. “Estamos mostrando que a evolução no Caracu é muito grande, nunca ví tantos animais de qualidade reunidos em nenhum outro lugar”. Quanto ao trabalho desenvolvido pela Associação, ele comenta que há 25 anos a entidade vem brigando pelo desenvolvimento da raça, apoiando os criadores e colaborando com a pecuária brasileira. “Estamos encabeçando junto com os pecuaristas, eventos, leilões e projetos de melhoramento genético, buscando sempre a conquista de novos mercados”.
Para apoiar os trabalhos da associação, o Núcleo Sul-Brasil de Criadores de Caracu, que tem como presidente Alípio Magalhães Maciel, proprietário das fazendas Rincão da Roça e Andaraí, busca ampliar a presença da raça nas exposições da região sul do país. “Estamos na ativa há quase três anos. Divulgamos a raça em exposições, feiras, artigos e anúncios em revistas, com o objetivo de mostrar ao público em geral que o Caracu é uma raça viável para os pecuaristas da nossa região. Eu, particularmente, crio este gado há vinte anos, mantendo a tradição do meu pai e do meu avô, e me sinto muito orgulhoso de participar do desenvolvimento da raça”, ressaltou.
Na opinião de Manuel Pimpão Almeida, que nasceu com sangue de Caracu na veia, como ele mesmo diz, a história da ABCCaracu e de Palmas entrelaçam. “A evolução da raça e da cidade ocorreram juntas. A Associação entrou não só no aprimoramento genético, como também no contexto histórico de Palmas, pois ajudou no desenvolvimento do município. Tivemos um salto extremamente grande. Como exemplo disso, podemos citar o crescimento e a construção do Parque Pé Vermelho, que teve grande participação da entidade”. Manuel conta que seu tio-avô foi um dos primeiros criadores de Caracu em Palmas, por volta de 1917, e que ele próprio ajudou a elaborar a redação dos estatutos da associação quando ela se refez. “‘É uma raça bonita, gostosa de olhar no campo e uma espécie de curinga para o cruzamento com outras raças, pois dispõe de um ótimo material genético”. Esposa e parceira na criação, Raquel Cunha Almeida está há 46 anos com Manuel “vivendo Caracu”, “Já temos três filhos e quatro netos para dar seqüência no trabalho”, disse ela.
Nos dias 17 e 18, aconteceu sob a responsabilidade de Roberto Vilhena Vieira o julgamento da raça. Segundo ele, fazer um animal campeão é muito difícil, ainda mais em uma exposição nacional onde o animal concorre com os melhores exemplares da raça. Sobre o Caracu, Vieira ressalta que esta é uma raça que vem apresentando avanços significativos nos últimos anos. “Este gado, além de ter uma genética de alta qualidade capaz de atender a todas as expectativas dos pecuaristas para a produção de carne, conta com uma caracterização racial muito moderna, apresenta carcaça comprida, profunda, larga e muito musculada, além de expressão racial e correção de aprumos”, disse.
A nacional do Caracu deste ano premiou animais de diferentes criatórios. O premiado Grande Campeão Mocho foi o touro Dourado da Renascença, da Empreendimentos Renanscença. O titulo de Reservado Grande Campeão Mocho ficou com Iamotécnico da Pagliosa, de Nilson Antônio Pagliosa. Nas fêmeas, os títulos de Grande Campeã Mocha e Reservadas Grande Campeã Mocha ficaram com Jabuticabeira da Pagliosa e Tulipa da Pagliosa, respectivamente, ambas do criatório de Nilson Pagliosa. Entre os aspados, o Grande Campeonato Macho foi Cassino da Renascença, Fazenda Renascença. De acordo com o proprietário da Fazenda Renascença, o futuro do animal após a vitória já é certo. “Ele continuará presente em feiras e exposições e conforme for se destacando, provavelmente, irá para coleta de sêmen”. O Reservado Grande Campeão aspado foi o touro Cadeado do Rosal, da fazenda Rosal do Cruzeiro. A Grande Campeã aspada foi Jasmim da Guaraúna, também da Fazenda Rosal do Cruzeiro. O titulo de Reservada Grande Campeã ficou para Doçura do Rincão da Roça, da Fazenda Rincão da Roça.
Na Nacional, foi firmado um acordo entre a ABCCaracu, Embrapa Pecuária Sul (Bagé, RS) e Emater RS. “O Caracu está profundamente adaptado às nossas condições climáticas e após um longo trabalho de seleção conseguimos fazer dele uma raça completa e competitiva no mercado. Nosso objetivo, com a presença da Embrapa é divulgar, com comprovação técnica, todas as qualidades da raça, principalmente no Estado do Rio Grande do Sul, onde o Caracu pode ter uma presença cada vez maior”, afirmou Lício Isfer.
Fioravante, atual presidente da Associação, que nasceu bebendo leite de Caracu, diz que o comprador exigente que deseja melhorar o seu rebanho pode apostar, sem sombras de dúvidas, neste gado. “A raça se garante por conta de três características básicas: adaptabilidade, rusticidade e qualidade de carne. Ela é hoje uma opção viável para cruzamento a campo no Brasil, um touro pode cobrir até 40 vacas”, resumiu Flávio.
Na noite do dia 18, uma grande festa marcou a comemoração do aniversário da Associação. Além de pecuaristas, autoridades locais estavam no jantar de confraternização que antecedeu o Leilão Nacional da Raça Caracu. No remate foram comercializados 16 animais, sendo 5 machos e 11 fêmeas, além disso, houve também venda de 130 doses de sêmen. O faturamento total do remate foi R$ 155.340. As vendas de fêmeas renderam R$ 114.380, com uma média de R$ 10.398, já as vendas dos machos totalizaram R$ 32.620, média de R$ 6.524 por reprodutor. As vendas de sêmen alcançaram R$ 8.340. O lote mais disputado foi a fêmea Cristal C, vendida por Jurandir de Araújo Filho à Murilo Chaves Loureiro, o maior comprador do remate, pelo valor de R$ 42.000. De acordo com Flávio Fioravanti Júnior, o leilão superou o esperado. “Batemos o recorde nacional em valor de animal. A exposição confirmou que o gado tem liquidez e procura”, diz.
No dia 19 de março, ocorreu o Leilão de Fêmeas da Raça Caracu 2005, no qual foram ofertados 98 animais. O total contabilizado no evento foi R$ 169, 5 mil, com uma média de R$1.740 por animal. “O mais importante a se pensar após esta Nacional é no potencial de produção de carne de qualidade do Caracu. A presença de técnicos, veterinários, os especialistas da Embrapa que garantiram total apoio a introdução do nosso gado no Rio Grande Sul, por ser a solução para as adversidades locais, nos anima para dar continuidade ao trabalho”, conclui o presidente.
Em relação a 2005, Flavito aposta em uma retração de mercado, mas muito menor que no ano passado. No entanto, se o assunto é o potencial da raça, ele promete trabalho acelerado no aprimoramento genético para carne e leite. Exposições, palestras, leilões em novas praças e já tradicionais receberão apoio da ABCC. “Os esforços serão para provar que o cruzamento industrial com Caracu é uma excelente opção para o segmento de corte, divulgando os resultados de abate, ajudando no preparo de pessoal e fomentando a entrada de novos adeptos”, projetou.