O Brasil é hoje um dos poucos, se não o único, país emergente da América do Sul com chances reais de conquistar seu lugar entre as grandes potências agrícolas do planeta. Impulsionado por uma demanda mundial crescente por produtos oriundos da atividade agrícola, o agronegócio está se tornando um setor de importância chave para a economia do país.
Dentro desse contexto, alguns setores se destacam por garantir 05Rev85 Marexcepcionais superávits em sua balança comercial, com reflexo direto na geração de divisas e consequente melhora dos indicadores econômicos ligados à sua produção.
Entretanto, a luta inglória das nações latino-americanas, caso da Argentina, Paraguai, Uruguai, Bolívia, Colômbia e até mesmo o Brasil para enquadrar-se nas regras impostas pelos grandes compradores mundiais de commodities, esbarram, quase sempre na falta de interesse e/ou nos artifícios da política de comércio agrícola para frear o ímpeto desses fornecedores. As inúmeras batalhas travadas no âmbito da OMC, Organização Mundial do Comércio, para tentar coibir tais práticas, dão uma mostra da voracidade desses gigantes do mercado mundial para controlar a indústria de produtos manufaturados. As novas regras que regem o comércio mundial de bens agrícolas, lastreadas sobre a égide da Rodada Uruguaia, que serviu de base para formar o acordo sobre agricultura (AsA), possuem como regra geral, acesso a novos mercados, medidas de apoio interno aos produtores e não subsídios às exportações. O terceiro item do acordo, entretanto, constitui-se atualmente no principal gargalo que impede o crescimento dos países emergentes, por causar distorções sérias no comércio bilateral entre as nações.
A cadeia da soja brasileira é o exemplo que melhor ilustra esse movimento mundial de aumento na procura por grãos, tanto como fonte de nutrientes para uso na alimentação quanto para aplicação na geração energia. Nos últimos sete anos, as exportações do setor cresceram 450%, fato este que impulsionou a sojicultura, atraindo investidores e produtores ligados a outras áreas, caso da pecuária e demais culturas de verão. Esse fato contribuiu sobremaneira para elevar a produção, que saltou de 27,327 milhões de toneladas em 1996/97, para 49.781 milhões de toneladas na safra 2003/04; com um crescimento médio de 7% e perspectivas de superar a marca de 61 milhões de toneladas na colheita 2004/05. No que concerne ao volume de área colhida, os levantamentos da Conab, Companhia Nacional de Abastecimento, mostram, também uma expansão territorial significativa, em igual período, passando de 13.157 milhões ha. em 1997/98 para 22.721 milhões de hectares. Essas previsões são reforçadas continuamente por especialistas de mercado e representante políticos que apostam que os números da atualidade podem ser facilmente ampliados dada a conjuntura favorável para esse grão no mercado para diferentes fins industriais.
Produção desbravando fronterias
No âmbito doméstico, a descoberta do mercado mundial da oleaginosa, transformou a cultura num verdadeiro bandeirante, a desbravar fronteiras país a fora, fato este que teve reflexo na produção de todos os estados produtores. A região que melhor expressou essa evolução foi o Centro Oeste, onde o volume colhido saltou de 12,889 milhões t 1997/98 para 27,923 milhões t em 2004/05. O Mato Grosso foi o estado que marcou o maior crescimento nesse ínterim, com variação positiva de 113,08 %. Os sojicultores de Goiás e Mato Grosso do Sul, também tiveram papel importante na contabilidade geral da soja, ampliando suas participações em 121,5% e 122,4%, respectivamente. Já os estados do norte brasileiro, que juntos congregam uma produção de 1,021 milhão t., têm no Tocantins seu maior expoente, com produção de 720.812 t, número que, na safra 1997/98, era de apenas 80 mil t. O Nordeste, por sua vez, com apenas três estados, produzindo, regularmente, têm a Bahia na liderança do ranking, registrando sua colheita uma produção de 2,4 milhões t.
Os estados que compõem a região Sul do país, que têm na soja uma importante fonte de geração de emprego e renda para suas comunidades rurais, está passando por graves problemas causados pela estiagem que castiga a região há vários meses. Os levantamentos iniciais da safra que começa ser colhida, davam conta de uma produção próxima a 11 milhões de toneladas. Entretanto, os analistas já falam em perdas superiores a 30%, podendo chegar a 50% da colheita em algumas regiões. O estado do Paraná deve assumir uma posição de destaque na produção sulista nesta safra, marcando uma participação de 47.9% na volume total da produção da região. Ao Participar de um seminário sobre agronegócio e exportações em São Paulo, Germano Rigotto, governador do RS, partiu em defesa dos agricultores gaúchos, enfatizando a importância da biotecnologia para garantir o crescimento na cultura da soja. Rigotto foi categórico ao afirma, que, não dá mais para o Brasil virar as costas para a biotecnologia, pelo simples fato dela já ser uma realidade na agricultura mundial e ter seus resultados reiteradamente comprovados.
Na opinião do governante riograndense, a aprovação da lei de Biosegurança, aprovada pelo legislativos e esperando sanção presidencial, vem de encontro com muitas das necessidades da cadeia produtiva do agronegócio. Um dos pontos mais contundentes do texto fala sobre a liberação da produção e comercialização de Organismos Geneticamente Modificados (OGM). O estado que responde por 13% da produção nacional de soja nacional, tem 80% de suas lavouras cobertas por variedades transgênicas. Para João de Almeida Sampaio, presidente da Sociedade Rural Brasileira, (SRB), a lei de biossegurança precisa ser mais discutida sobre aspectos científicos, deixando de lado as discussões ideológicas. Segundo ele, o mercado é que vai regular se o produtor vai ou não plantar transgênicos”, declara.
No âmbito mundial, o crescimento da oferta, também está sendo contínua e a prova mais cabal disso foi a safra recorde nos Estados Unidos de 85,5 milhões de toneladas em 2003/04. Os três principais produtores mundiais cresceram em média de 5,5% na última década, Os Estados Unidos, principal produtor mundial da cultura, aumentou sua produção em 32,5% no período, com uma média de crescimento de 3,9% ao ano. Nos casos de Brasil e Argentina, os números da expansão realmente impressionantes, ultrapassando, no primeiro caso, a casa dos 140% e, no segundo o aumento foi ainda maior, superior a 190%, com média anual de 10%.
Na opinião de alguns especialistas e consultores procurados pela Revista Rural, para entender melhor essa evolução, todavia, é preciso voltar um pouco no tempo e analisar os índices de produção, a partir do ano safra 1999/00. A década de 1990, foi um divisor de águas para o setor, pois, a partir da segunda metade dessa década, a cadeia mundial da soja dava indícios claros de que o grão assumiria um papel importante no comércio mundial de commodities agrícolas. Se consideramos todos os problemas fitossanitários e de infra-estrutura que afetam, direta ou indiretamente, o cultivo da soja, os percentuais são expressivos, analisa Silvio Crestana, diretor presidente da Embrapa, Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária. Crestana, fala que esse movimento de expansão na cultura da soja só ganhou viabilidade, graças a atuação singular da Embrapa, através do CNPSO, Centro Nacional de Pesquisa da Soja, de Londrina PR, na elaboração de novas tecnológica e variedades desenvolvidas para adaptação em situações de clima tropical”, declara.
O presidente da entidade que tem reconhecimento mundial na pesquisa da soja, chama atenção para a questão da biotecnologia molecular, enfatizando a relevância fundamental dessa empresa para o crescimento da atividade agrícola no planeta. “Em regiões onde as condições ambientais são inóspitas, caso de algumas regiões brasileiras, a biotecnologia é condição sine qua non para manutenção de resultados na atividade agrícola”, declara. Crestana, destaca ainda, a evolução da soja no cerrado brasileiro, lugar onde as condições de plantio, manejo e colheita da lavoura, possuem especificidades inerentes a cada localidade. É graças as muitas variedades desenvolvidas pela e Embrapa, em parceria com inúmeras empresas privadas, que a soja ocupa hoje um lugar destaque. “Seria impossível plantar soja no Cerrado brasileiro não fosse o elevado estágio das pesquisas com a cultura no Brasil, conclui.
Demanda mundial é crescente
A crescente produção mundial da soja, estimada em 200 milhões de toneladas, tem na indústria de moagem seu principal destino final, absorvendo cerca de 95% do volume colhido para transformação em óleo vegetal e farelo de soja. Só para se ter uma idéia do valor que essa cultura adquiriu para a indústria de transformação, mais de 30% do óleo vegetal produzido no mundo, advém da oleaginosa. Além desse propósito, a soja tem um papel importantíssimo no arraçoamento animal. As vendas do farelo de soja para pecuaristas ou para a indústria de ração animal apresenta crescimento significativo. Os Estados Unidos, principal consumidor mundial de farelo de soja, deve absorver um montante de 78.289 mil t., segundo dados do USDA, Departamento de Agricultura dos Estados Unidos. Já a União Européia, maior importador mundial de soja do Brasil, tem um consumo anual de farelo de soja de 32,1 milhões t., fato este motivado, em ambos os casos pelo sistema de pecuária praticado de confinamento na pecuária. A China outro grande consumidor de produtos primários deve absorver algo em torno de 21,5 milhões t. de farelo de soja em 2005, para utilização na atividade avícola.
Na contabilidade geral do setor, esses dois itens são responsáveis por um plus de 15% no faturamento global das empresas do setor. Levando-se em conta a arrecadação bruta do complexo soja de US$ 56,6 bilhões em 2004 e a manutenção dos preços médios em Chicago na casa dos US$ 6,7/buchel, esse valor beira a casa dos US$ 9 bilhões. Por conta disso, a produção mundial de farelo de soja foi 138,1 milhões de toneladas, em igual período. O crescimento das exportações do farelo de soja, devem ocorrer, fundamentalmente, na forma de proteína animal, dada a utilização cada vez mais freqüente da cultura na suplementação dos rebanhos, observa Marcus Vinícius Pratini de Moraes, presidente da Abiec, Associação das Indústrias Exportadoras de Carne.
O ex-Ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, fala da importância impar do Brasil no comércio mundial da soja, enfatizando a capacidade do setor de gerar superávits. No entanto, ele aponta a má utilização das terras agricultáveis do país, como um problema que precisa ser sanado urgentemente. “O Brasil é a última fronteira agrícola do planeta e conta com uma extensão territorial invejável de 851 milhões hectares, entretanto, apenas 7% dessa área, algo em torno de 47milhões de hectares, é utilizada com lavouras comerciais”, ilustra. Para o líder da entidade que representa a cadeia de exportação da carne, o Brasil é o único país na atualidade que não esgotou seu potencial exportador. “Os EUA, principal exportador da atualidade de bens agrícolas na atualidade, está no limite das suas exportações. A Argentina, outro adversário do Brasil no comércio mundial, mostra sinais claros de estagnação. Isso abre um precedente enorme para que a atividade agrícola brasileira, sobretudo a soja, para ampliar sua participação, atingindo 40 milhões de toneladas de soja para o mundo até 2010”.
Pratini lembra que ao contrário do que convencionou-se anunciar na imprensa, a China não é o principal quintal de consumo da soja brasileira, muito pelo contrário. Os chineses junto com os demais mercados da Ásia ocupam uma posição atrás da União Européia, maior consumidora com 41% do total exportado e Oriente Médio que importa 12% da produção nacional. A Rússia também aparece na frente do países asiático, comprando o equivalente a 10% da produção.
Para o presidente da Câmara de Comércio e Indústria Brasil-China, Charles Tang, o comércio bi-lateral entre os gigantes da Ásia e da América do Sul, deve crescer, nos próximos anos, independentemente do movimento de desaceleração da economia chinesa, que deve ocorrer a partir de 2005. A china, país que possui um PIB, Produto Interno Bruto de US$ 7 trilhões, contabilizou, no último ano, um superávit comercial de US$ 1.540 bilhão no mercado mundial, ressalta o intermediador do comércio Brasil x China. Para ele, o Brasil é um importante parceiro comercial no fornecimento de alimentos e energia para o mercado chinês, entretanto, sua participação é, ainda, demasiadamente, pequena, algo em torno de US$ 6 bilhões ou pouco mais de 1% do volume comercializado pela nação com o resto do mundo. “O Brasil está apenas descobrindo o mercado chinês como um potencial comprador de seus produtos, no entanto, a tendência é que, nos próximos anos, o comércio bi-lateral entre esses países se intensifique devendo superar os US$ 10 bilhões já em 2005” declara. Quanto ao mercado da soja as compras devem se manter, registrando, inclusive crescimento da ordem de 10% a 15% neste ano.