Agricultura

Orgânicos – em nome da saúde

A partir da década de 80 teve uma expansão significativa e, nos anos 90, registra novo incremento com maior representatividade na Europa, América do Norte e do Sul, inclusive com o plantio de uma gama diversificada de produtos.

Entre 1986 e 1996 a conversão para o modelo alternativo teve uma ampliação de 30% ao ano. As vendas no varejo aumentarem 439%, entre 1993 e 2000, no mercado europeu de produtos orgânicos. Porém, apesar das altas taxas de desenvolvimento, o volume comercializado “não ultrapassa 4% do total de vendas de alimentos convencionais e representa apenas 2,9% da área agrícola cultivada na União Européia.”

Os dados constam de um trabalho elaborado por uma equipe de pesquisadores do IEA-Instituto de Economia Agrícola, sob o comando da engenheira agrônoma Ana Maria Montrágio Pires de Camargo. O estudo mostra o mapa mundial da produção ecológica no planeta e acentua que, nos países da Escandinávia e no Mediterrâneo, são verificados os maiores índices de expansão. Aponta, ainda, que a área cultiva com orgânicos, no mundo, em 2003, está avaliada em 24,07 milhões de hectares, “distribuídos em 462,4 mil propriedades partidárias do novo método de produção agrícola.”

Em 2003, a Europa plantou 5,5 milhões de hectares “em cerca de 175 mil pequenas propriedades, deixando evidente a importância desse segmento na produção.” A Alemanha foi o primeiro país do mundo a criar um organismo para inspeção e controle, com a Associação Deméter. Atualmente, tem um dos mais importantes mercados do continente europeu, com vários canais de distribuição. Os países escandinavos também mostram um elevado nível de desenvolvimento, motivado pelo aumento do consumo desse tipo de produto. A França aumentou o número de unidades convertidas e lançou o Plano Plurianual de Desenvolvimento da Agricultura Biológica, pelo qual 25 mil sitiantes devem adotar o modelo e usar 1 milhão de hectares, até o próximo ano.

O levantamento ainda cita o Reino Unido, a Áustria e destaca a atividade na Espanha que, “nos últimos anos, triplicou o número de produtores e a área ocupada, motivada pelo auxílio governamental e pela possibilidade de exportação.” Entre os vários produtos, os de maior importância são os grãos de leguminosas, hortaliças, frutas cítricas, temperadas (maçã, pera, melão, pêssego e nectarina), azeitonas, vinho, ervas aromáticas e medicinais, além de forragem animal.

No Brasil, predomina pastagem

A Suíça, acrescenta, apresenta uma cifra acima da média mundial, pois “9,7% de sua área agrícola são destinados aos orgânicos.” Essa extensão é atribuída a uma estrutura organizada de apoio, fiscalização e comercialização, bem como suporte para pesquisa, assistência técnica e inspeção. No geral, observa, a maioria dos países europeus possui um esquema bem definido de normas de produção e certificação.

A participação da Ásia está estimada em 3,7% da área mundial de plantio, com 13,2% das propriedades. A África tem uma presença mínima, em torno de 1,3% da extensão cultivada e 15,3% do total de produtores. Já a América do Norte é responsável por 6,8% das lavouras do planeta e 13,8% das fazendas aderiram ao modelo. Canadá e Estados Unidos apresentam média maior porque produzem grãos e cereais em grandes extensões.

Na América Latina, exceto o México, a contribuição é de 22% do plantio mundial e 20,9% do número de proprietários, com produtos de pecuária de floresta e cana-de-açúcar em grandes unidades, além de outras culturas desenvolvidas por médios e pequenos agricultores. A Argentina, em 2003, mostrava a maior área orgânica do continente, com cerca de 56% do total local, ocupada por empreendimentos de l,7 ha, em média. A pecuária de carne ou leite, utilizava 98% de toda a extensão convertida. Na área vegetal, a produção não é tão relevante. O Uruguai é o segundo maior produtor da América do Sul, com significativos índices no setor pecuário. Já o Brasil, cultivou, ano passado, 841,8 mil hectares em 19 mil unidades, com uma média de 44,3 ha, por produtor, sendo que 60% da área são ocupados por pastagem.

De acordo com o estudo, o comércio mundial de orgânicos foi intenso entre 1997 e 2001, chegou a movimentar aproximadamente US$ 24 bilhões, em 2003, e, para 2005, as previsões são de que os recursos envolvidos atinjam US$ 30 bilhões. O perfil dessas transações mostra que existem países com importância significativa na produção e exportação. A maioria das frutas e hortaliças é direcionada para o consumo local, embora na condição de pré-cozida, congeladas ou desidratadas, apresentam aumento de demanda mundial. Já o mercado de grãos, de frutas e produtos animais deixa evidente a necessidade de processamento.

De acordo com o levantamento, o panorama da agricultura orgânica, com áreas de pastagens convertidas e florestas certificadas, no Brasil, deixa claro o potencial de desenvolvimento em todas as regiões para abastecer os mercados nacional e internacional. Em 2003, o País teve 876 mil hectares de áreas certificadas de florestas, dos quais 283 mil ha de nativa e 593 mil ha plantada, onde têm sido utilizados os conceitos e procedimentos de sustentabilidade e proteção ambiental.

Entidades de apoio e promoção

A estimativa do número de propriedades brasileiras voltadas para a agropecuária orgânica, em 2001, era de 15 mil, com um total de 275,6 mil hectares cultivados. O aumento em torno de 205%, entre 2001 e 2003, foi decorrência da conversão e incorporação de 500 mil hectares de pastagens. Desse total, o Estado de São Paulo contribuiu com 30 mil ha distribuídos em mil unidades. A área usada com lavoura ‘natural’ não atingiu 0,2% do total utilizado por culturas permanentes e temporárias.

No território paulista, a atividade teve início em 1979, com a Fundação Mokiti Okada, na capital, que começou a desenvolver a agricultura ecológica e hoje atua nas áreas de certificação, pesquisa e associação de produtores. Em 1982, foi fundado o Instituto Biodinâmico de Desenvolvimento Rural (IBD), em Botucatu, para divulgar lavouras orgânica e biodinâmica, através de inspeção, certificação de produção e de processamento. Para a área de consultoria técnica, foi criada a Associação de Agricultores Biodinâmicos (ABD). Em 1989, surge a Associação de Agricultura Orgânica, na capital que trabalha na divulgação do sistema e promove a comercialização e certificação através da AAOCERT.

Na década de 90, continua o estudo, apareceram outras entidades que atuam como associação de produtores e certificadoras: Associação de Agricultura Natural de Campinas (ANC), fundada em 1991, e a Associação dos Produtores de Agricultura Natural (Apan), criada em 1990, na cidade de Mairinque. Por sua vez, a Secretaria de Agricultura e Abastecimento, de São Paulo, criou a Câmara Setorial de Agricultura Ecológica, que funciona como fórum de discussão de política agrícola.

Comércio, o gargalo maior

Porém, a região Sul do País é a que apresenta a maior organização para promoção dos alternativos. O governo de Santa Catarina, com a Secretaria de Agricultura e Política Rural e a Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural (Epagri), além do Instituto de Planejamento e Economia Aplicada (Instituto Cepa/SC), fez levantamentos censitários nos municípios e unidades agrícolas do Estado, elaborando relatórios sobre o diagnóstico de exclusão social e migração rural. Definiu o perfil da produção natural, identificando os produtos, formas e equipamentos na distribuição ao mercado.

Os catarinenses, em 2001, tiveram uma receita de R$ 15,9 milhões com culturas temporárias, permanentes e derivados de origem animal e processados. Esse resultado foi rateado entre 706 unidades que ocupavam uma área total de 16.376 ha. Esse terreno era dividido em 22,7% para pasto, com maioria já convertida; l9% para lavouras; 3,4% em conversão; restando 7,8% para culturas convencionais. A agricultura orgânica usava 53% da área total das propriedades recenseadas.

No Paraná, segundo avaliação da Secretaria da Agricultura, via Deral e Emater-PR, em 2001, existiam 3.478 produtores cultivando 12.991 ha, com a produção de 47.958 t. A divisão da área em uso era a seguinte: 58,5% com soja; 23% outros grãos e cereais; e o restante com café, frutas, hortaliças, plantas medicinais e aromáticas. O Rio Grande do Sul tem tradição em agricultura ecológica e a maioria das ações, nesse sentido, são atribuídas à Cooperativa Coolmeia, que opera com certificação participativa, promove a agricultura familiar e distribuição dos produtos. Segundo o Instituto Biodinâmico, em 2001, foram semeados 13 mil ha em 4.370 estabelecimentos rurais.

O trabalho dos pesquisadores do IEA constata que “o estágio de desenvolvimento da agricultura orgânica, no Brasil, ainda é incipiente”, em comparação às práticas na América do Norte e na Europa. Dessa forma, mesmo admitindo a existência de esforços, defende “a necessidade urgente de ações positivas” do Ministério da Agricultura, Embrapa e secretarias estaduais, para facilitar e agilizar a organização dos integrantes da cadeia produtiva, implementar as atividades, inclusive em colaboração com as certificadoras e associações de produtores.

Sugere, ainda, que para acelerar o desenvolvimento do modelo alternativo, é preciso agir no sentido de dar rapidez e eficiência no funcionamento de canais de comunicação, favorecendo a difusão do método, a organização regional e a regularização do fluxo de informações dentro dos vários segmentos produtivos. Para os pesquisadores, o avanço do cultivo orgânico “tem como obstáculo o mesmo gargalo da agricultura convencional: os canais de comercialização vigentes.”

Para melhorar a distribuição dos produtos, propõem, aos agricultores, investimentos em agregação de valores, ampliar a produção de mercadorias processadas e entrega direta nas redes varejistas. Entendem que isso só é possível “com a formação de associações e profissionalização das operações pós-porteira.” Considerando o Estado de São Paulo como o maior mercado de alimentos da América Latina, afirma que é preciso produzir uma quantidade maior de gêneros com base nos princípios ecológicos, “fato que contribuiria para a sustentabilidade da agricultura paulista, no sentido mais amplo da palavra”, concluem.

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