Pecuária

Canchim – talhada para ser produtiva!

Os animais (5 touros e 20 fêmeas) foram apresentados durante a 1° Exposição Comemorativa, realizada no Rio de Janeiro, sede do governo na ocasião. Porém, segundo o engenheiro agrônomo e pesquisador da Embrapa Pecuária Sudeste Pedro Franklim Barbosa, essa não foi a primeira vez que a raça francesa tocou em solo brasileiro. “Existem históricos de animais que chegaram ao Brasil no final do século XIX (1894), na cidade de Bagé (RS)”. O Charolês que foi utilizado no projeto de criação da raça Canchim foi o que veio da França em 1922. Depois da exposição, uma parte do rebanho foi levado para Pedro Leopoldo (MG), outra parte para Pinheiral (RJ), e Urutaí (GO),” explica.

No ano de 1917 aos 19 anos de idade e recém formado no curso de medicina veterinária da Escola Superior de Agricultura e Medicina Veterinária do Rio de Janeiro, Antônio Teixeira Vianna foi trabalhar na Escola Agrícola de Urutaí (GO), órgão do antigo Ministério da Agricultura, no mesmo ano que os animais chegaram na fazenda experimental da escola, o pesquisador teve seu primeiro contato com a raça francesa. Nascido na cidade de São Francisco do Conde (BA), no dia 18 de abril de 1899 Antonio Teixeira Vianna era um homem pragmático, de personalidade forte. De acordo com os relatos do pesquisador da Embrapa de São Carlos, “o padrão Vianna” de organização e conduta dos funcionários, imposto por ele durante os anos em que ficou na direção geral da fazenda experimental de São Carlos perpetua até os dias de hoje”, observa.

O trabalho do doutor Vianna na estação experimental de São Carlos começou no ano de 1935, quando o governo federal transferiu a posse de uma fazenda de café ao Ministério da Agricultura. Fazenda essa que pertenceu ao coronel Marcolino Marquez Barreto, que, com a crise de 1929 perdeu a posse das terras para o Banco do Brasil. Com a concessão concretizada, no dia 13 de novembro daquele mesmo ano, o Dr. Vianna iniciou seus trabalhos na fazenda experimental de São Carlos (SP). O pesquisador chegou a cidade em companhia de sua primeira esposa, dona Violeta Miranda de Brito, que por sua vez, acompanhou o trabalho do marido até sua morte em 1960. Barreto conta que quando Vianna veio transferido de Urutaí, foi sob uma única exigência: trazer consigo o gado Charolês para desenvolver seu projeto de composição de uma raça que adapta-se melhor as diferentes condições do clima brasileiro.

Desde o princípio, quando o projeto estava em fase de idealização, o Dr. Vianna teve uma preocupação que até então nenhum pesquisador tinha levado em consideração: desenvolver concomitantemente dois esquemas, um primeiro para obter um animal 5/8 Charolês e um outro que obteve-se um 5/8 zebu. “Isso foi um fato inédito, pois nunca um pesquisador tinha feito nada parecido” reitera o agrônomo. Quando começou trabalhar com o gado Charolês puro, o pesquisador começou a observar que o animal tinha problemas de adaptação. O zebu por sua vez que acabara de chegar ao Brasil vindo da Índia, apresentava uma adaptação bastante satisfatória ao clima brasileiro. Raças como Guzerá, Indubrasíl, Gir que eram as raças de maior volume em comercialização na época impressionavam pela sua rusticidade e o desempenho na criação a campo. Na ocasião, o pesquisador comprou 392 cabeças de gado zebu em Uberaba (MG), sendo a maioria Indubrasil, para iniciar suas primeiras experiências.

A escolha pelo animal 5/8 taurino só foi registrada muitos anos depois, no ano de 1953. De acordo com os escritos do livro “Formação do gado Canchim pelo cruzamento Charolês-Zebu”, de autoria do Dr. Vianna e co-autoria dos professores Frederico Pímentel Gomes e Mário Santiago. “A escolha do animal 5/8 Charolês se deu pelo fato do gado 5/8 zebu não apresentar conformação desejada, serem animais pernaltas e variarem muito a pelagem”.

A partir de 1950, alguns criadores, observando os resultados obtidos no programa de cruzamento do Dr. Vianna, passaram a fazer um trabalho semelhante dentro de suas propriedades, entre eles, Edgar Beolchi, em São José do Rio Preto, e o Francisco Jacinto da Silveira (seu Chichico), em Presidente Prudente.

Em 1969, Vianna, já com 70 anos de idade, recebeu do governo sua aposentadoria compulsória e foi obrigado a deixar suas atividades frente a ainda Estação experimental de São Carlos. Segundo o professor Barreto, um fato que merece destaque é que entre 1935 e 1969, ou seja, durante 34 anos, passaram pelo palácio do Catete, sede do governo, sete presidentes da república e todos confirmaram seu nome como diretor geral da Estação Experimental de São Carlos. Após sua saída, assumiu a chefia o Dr. Mário Santiago, ocorreram alguns fatos que serviram para concretizar o trabalho que o Dr. Vianna fez em pró da raça Canchim. Em 11 de novembro de 1972, o então ministro da agricultura Luís Fernando Cirne Neto realizou o primeiro registro genealógico de um animal Canchim, exatamente 1 ano depois da fundação da Associação Brasileira de Criadores de Canchim (ABCCAN). O animal era uma vaca de nome E-55 e fazia parte do plantei de animais da estação experimental de São Carlos, ou seja, fruto do trabalho realizado desde 1935 por Vianna. Logo em seguida, foi registrado o primeiro touro da raça Canchim: J-450. A partir daí, esse número não parou mais de crescer. Hoje, segundo números da associação, este rebanho já chega a 100 mil animais registrados.

Outro fato importante ocorrido nesta fase foi a criação, pelo Ministério da Agricultura, no dia 26 de agosto de 1975, da atual Embrapa Pecuária Sudeste, sede da fazenda Canchim, por ter sido lá que tudo começou. Na ocasião assumiu a direção geral do órgão o Aliomar Gabriel da Silva, que permanece na direção até hoje. Desde que se iniciaram os trabalho de seleção da raça Canchim, no que se refere ao melhoramento dos padrões de conformação dos animais, as transformações foram muitas, o que permitiu adequar a raça ao que hoje é exigência de mercado. O primeiro padrão estabelecido foi o “padrão Vianna” em 1962 e preconizava um animal de forma mais cilíndrica, de conformação típica de animal de açougue. Em 1972, foi desenvolvido o primeiro padrão ABCCAN. Nesta época ainda não se ouvia menção a circunferência escrotal, embora o item fertilidade já fosse uma preocupação.

No ano de 1976 foi realizada a primeira convenção dos criadores de Canchim, no parque da Água Branca, na capital paulista, sobre a gestão do Dr. Francisco Jacinto da Silveira. Na ocasião, o então diretor de registros genealógicos, Alfonso Gioseppe Angelo Tundisi, propôs um esquema de cruzamento absorvente (ATV) entre a raça Canchim e o Nelore.

Esse modelo permaneceu até 1982, quando a associação promoveu algumas modificações no padrão racial com o objetivo de descrever o tipo morfológico do animal ideal e ainda retirar alguns itens aceitos no padrão anterior. A partir daí, as exposições nacionais passaram a ser realizadas a cada dois anos. Em 1988 o Canchim sofreu uma segunda grande transformação no seu padrão racial. Pedro Frakin conta que, durante um julgamento da raça no parque de exposições de Itapetininga (SP), o professor Randall Groons da Universidade de Agricultura do Texas (EUA), realizou o julgamento dos animais Canchim e transformou o conceito de criação que se buscava até então.

A partir de 1990, as exposições nacionais começaram a ser realizadas anualmente e com uma diferença: os juizes eram trazidos do exterior. A segunda convenção dos criadores da raça realizou-se em Curitiba (PR) e o padrão ideal passou a ser o tipo do novilho moderno de corte, de forma quase cilíndrica, mais volumosa no traseiro e de proporções equilibradas e harmônicas. De acordo com os anais da terceira e a quarta convenção que foram realizadas na Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR), o que se passou a buscar como modelo de padrão racial era um animal de porte médio, com desenvolvimento harmônico, conformação satisfatória e características raciais e sexuais. A quinta convenção dos criadores de Canchim acontece este ano, durante a Feicorte 2003. Segundo o pesquisador da Embrapa”, hoje o mercado busca animais com camada de gordura entre 4 e 6 cm, portanto o enfoque principal desta convenção deve ser o acabamento de carcaça. O objetivo das pesquisas é atingir um nível de acabamento de carcaça entre 7 e 10 cm”, explica.

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