As freqüentes notícias sobre a contaminação dos alimentos e dos próprios agricultores devido a utilização intensa e excessiva de agrotóxicos, têm servido para despertar e estimular na população, de um modo geral, a busca por gêneros alimentícios saudáveis e isentos de resíduos químicos que possam comprometer, principalmente, a saúde de quem os consome, evitando, por extensão, danos ao meio ambiente.
Essa procura da sociedade por qualidade melhor de vida encontra uma resposta, ainda que em termos parciais, na agricultura orgânica, atividade que minimiza o impacto ambiental da produção agrícola, através da eliminação do uso de agroquímicos e outros adubos minerais de alta solubilidade, recorrendo, ainda, ao manejo racional buscando a otimização, num grau máximo, das culturas.
Para Ricardo Cerveira, agrônomo, e Manoel Cabral de Castro, professor, ambos da Esalq – Escola Superior de Agricultura” Luiz de Queiroz”, de Piracicaba (SP), a agricultura orgânica se orienta por critérios de auto-sustentabilidade tendo como motivação uma prática “ambientalmente correta, socialmente justa e economicamente viável. “ Eles fizeram uma pesquisa sobre o perfil dos consumidores de produtos orgânicos em São Paulo, publicada, em dezembro passado, pelo IEA – Instituto de Economia Agrícola, da Secretaria de Agricultura paulista.
Na Europa, selo diferencia orgânico do convencional
A demanda por alimentos “limpos”, com maior qualidade nutricional e biológica, conforme constatam, emana dos vários segmentos que formam a população mundial, impedindo uma classificação homogênea em termos sociais, econômicos e ideológicos, mostrando, inclusive, incoerências quantos as opções de consumo. Porém, esse movimento não passa despercebido, sobretudo, nos países desenvolvidos. Canadá, o continente europeu e os Estados Unidos estão atentos a essas mudanças alimentares e adotam medidas de estímulo a essa modalidade de agricultura.
Na Europa, ganha corpo e força e política que cria selos diferenciado o alimento orgânico e ambientalmente correto do chamado convencional (que é produzido com adubo químico). Nos Estados Unidos existem normas de produção nos padrões da agricultura orgânica e o governo norte-americano estimula o consumo dessa mercadoria. No Brasil, a procura ainda é incipiente. Mas, desde 1990, é registrado um aumento anual de 10%, deixando evidente uma mudança nos hábitos alimentares dos brasileiros, que permite estimar a existência de uma mercado potencial para esse tipo de produto, inclusive pela implantação de gôndolas específicas nas várias redes de supermercados, além de feiras-livres destinadas á comercialização da produção.
Tanto Cerveira quanto Cabral enfatizam que a agricultura orgânica” não é mera proposta de consumidores utópicos, mas um mercado que movimenta US$ 8 bilhões, com expansão de 10% ano, na Europa.” Na Grã-Bretanha, acrescentam, existe uma a meta de converter 20% da agricultura a convencional para o sistema orgânicos até o ano 2000. Nos Estados Unidos, “42% dos supermercados” expõem algum alimento orgânico nas prateleiras e isso também já acontece no Brasil, arrematam.
Evitar impactos ao meio ambiente, um dos objetivos
Na verdade, ponderam, o aumento do nível de consciência no âmbito da sociedade quanto aos problemas ambientais e quanto aos qualidade dos alimentos á disposição dos consumidores recoloca a produção orgânica de alimentos “no centro do debate sobre a crise e as possíveis saídas da agricultura convencional.”
Conceitualizando o tema, Cerveira e Cabral lembram que a agricultura orgânica é reconhecida como um sistema de produção que pressupõe uma preocupação deliberada com a procura de harmonia entre o meio ambiente e a prática agrícola. Neste sentido, é assumido que o agroecossistema seja menos impactante possível ao ambiente, mesmo aceitando que é impossível “zerar”, o choque.
A atividade, acrescentam, procura seguir parâmetros que reduzam ao mínimo a agressão ambiental sem comprometer a eficiência da meta produtiva. O processo tem como orientação normativa produzir alimentos num modelo que seja ambientalmente equilibrado, economicamente viável e socialmente justo. Em suma, acrescentam, é um esforço que busca, ao mesmo tempo, conservar os recursos naturais, garantindo a sustentabilidade do solo, da água, da biodiversidade, melhorando a produtividade, favorecendo a distribuição da renda e oferecendo produtos sadios aos consumidores.
Produtividade pode superar a dos tradicionais
Essa modalidade agrícola, comentam, não é uma tarefas fácil e simples. Sob a ótica técnico-científica, “os desafios são imensos.” Segundo afirmam, é preciso muita pesquisa para o desenvolvimento de tecnologias adequadas e operacionais para aumentar a produtividade das culturas em manejo orgânico. Na Europa, estudos recentes desenvolveram técnicas que equiparam o rendimento/área do trigo orgânico ao do convencional, bem como milho e arroz, inclusive com informações dando conta que, em alguns casos, as lavouras orgânicas superam as convencionais em produtividade.
Cerveira e Cabral chamam a atenção para o fato de que muitas vantagens “alardeadas” pelos defensores da agricultura químico-mecânica decorrem da não incorporação dos “elevados custos ambientais e sociais” que resultam da aplicação do modelo tradicional. Esse aspecto, frisam, “é de extrema importância, pois esses custos, principalmente o ambiental, não são considerados”, significando que é possível pensar num grande retorno econômico. “Porém, ser for computado o custo ambiental, esse retorno se torna baixo ou mesmo negativo. Daí a necessidade de estudos em economia ambiental”, assinalam.
Numa incursão pela história, dizem que a agricultura orgânica começou a ser divulgada em 1905, na Índia, pelo cientista inglês sir Albert Howard, como alternativa as métodos convencionais. O protocolo que define e estabelece regras para prática orgânica veta o uso de pesticidas, de fertilizantes altamente solúveis em água – tóxicos ao meio ambiente e prejudiciais ao organismo humano. Acatando as normas, o sistema procura manejar a fertilidade do solo – tanto os aspectos químicos quanto os biológicos e os físicos – através de adubação orgânicas (composto de resíduos vegetais e animais), adubação verde (leguminosas e outras), fertilizantes minerais de baixa solubilidade em água e outros produtos, visando minimizar o impacto no ecossistema e salvaguardar a saúde humana.
Sistema reduz o consumo de energia fóssil
Graças a esse tipo de manejo, muitas das agressões atuais da agricultura convencional podem ser solucionados ou minimizadas, tendo como resultado maior equilíbrio fitossanitário, melhora do valor nutritivo dos alimentos e redução do consumo de energia fóssil, ressaltam.
Quanto ás conclusões da pesquisas, apontam que o consumidor, apesar de recente, é fiel na adesão ao orgânico e tem conhecimento de que o produto é mais natural e saudável, pois é isento de contaminação por agrotóxico, inclusive aceitando pagar um preço mais alto em comparação ao alimento convencional. Apesar disso, adquirem gêneros tradicionais por falta de opção e reclamam da existência de poucos pontos de vendas.
O levantamento revela, ainda, que a escolha por alimentos biológicos ocorre tão somente em função da saúde da família, pois o consumidor desconhece os fundamentos da agricultura orgânica e sua preocupação com a sus-tentabilidade ecológica e ambiental.