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COLHEITA - Sem perdas na hora da colheita
rev 156 - fevereiro 2011

A velocidade de deslocamento da colheitadeira, o cuidado especial com o funcionamento da plataforma de alimentação, a regulagem do sistema de trilha em função da umidade do produto colhido e o ajuste correto da ventilação são itens que devem ser atentamente observados pelo operador.

O Estado do Paraná é um exemplo positivo de dados de menor índice de perdas de soja do País, cuja média, de acordo com dados oficiais, é de aproximadamente de uma saca de 60 kg por hectare (sc/ha).

A previsão de área de plantio para a safra 2010/2011 é de 48 milhões de hectares (ha) - 1,3% ou 612,2 mil ha superior aos 47,39 milhões de cultivados na temporada 2008/2009, segundo o quarto levantamento da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), divulgado em janeiro deste ano. A produção nacional de grãos, até momento, está estimada em 149,41 milhões de toneladas (t), ou 0,1% (212 mil t) inferior ao volume de 149,2 milhões de t produzido em 2008/2009. A soja é o que realmente deve impulsionar a safra brasileira de grãos, pois segundo a Conab, houve um incremento histórico da área plantada da oleaginosa, cerca de 2,6% (24,08 milhões de ha) - até então, o recorde era da temporada 2004/2005, com 23,3 milhões de ha cultivados.

Com um número maior em termos de área e a possibilidade de isso influir numa quantidade superior de quilos por ha, como é o caso da soja, por exemplo, os cuidados agora se voltam ao correto manejo na hora da colheita para não perder os grãos ao longo da própria lavoura. "No processo de colheita da soja podem ocorrer perdas quantitativas e qualitativas de grãos", explica José Miguel Silveira, pesquisador da Embrapa Soja, localizada em Londrina (PR). "As perdas quantitativas referem-se aos grãos que caem ao solo e, portanto, são considerados irrecuperáveis, enquanto que as qualitativas estão relacionadas a danos físicos (quebras), e (ou) latentes/invisíveis que afetam as estruturas vitais do grão (normalmente o produto que vai para a indústria) ou semente (grão que será utilizado para a semeadura na próxima safra), causando problemas futuros no armazenamento e na viabilidade do lote".

Há também perdas ocasionadas muito antes mesmo de por a máquina para trabalhar. Segundo Silveira, tratam-se das "perdas de pré-colheita", caracterizadas pela abertura das vagens, devido a causas induzidas, como, por exemplo, o atraso no início da colheita, ou de ordem natural ou climática, como a ocorrência de chuva de granizo próxima ao período de colheita, resultando, assim, na debulha dos grãos.

"Durante o processo de colheita, com a utilização de colheitadeiras automotrizes, as perdas estão diretamente relacionadas à operação do equipamento colhedor, ou seja, sua condução e seus ajustes e regulagens. A velocidade de deslocamento da colheitadeira, o cuidado especial com o funcionamento da plataforma de alimentação, a regulagem do sistema de trilha em função da umidade do produto colhido e o ajuste correto da ventilação, são itens, entre outros, que devem ser atentamente observados pelo operador da máquina ou pelo técnico que acompanha a colheita", frisa o pesquisador.

Alimentação do sistema

Especificamente ao que se refere à colheita mecanizada ou, melhor dizendo, a colheitadeira em si, é unânime entre os especialistas e técnicos da área que o sistema de alimentação da máquina é o maior responsável pelas de perdas de grãos. "Dados experimentais, reproduzidos posteriormente em lavouras comerciais de soja nos Estados Unidos (maior produtor mundial) e no Brasil (segundo maior produtor mundial), comprovam que as perdas mais elevadas de grãos que ocorrem durante a colheita mecanizada de soja concentram-se na parte da frente da colhedora, ou seja, na plataforma de alimentação da máquina. Aí podem ser registrados valores entre 80% e 85% de perdas, enquanto que nos mecanismos internos da colheitadeira as perdas situam-se na faixa de 15% a 20%", salienta Silveira.

Em análise semelhante, Roberto Ruppenthal, gerente de Marketing de Produto Colheitadeira da Massey Ferguson, traça um paralelo entre a plataforma de alimentação e a boca um animal qualquer - "é preciso entregar o alimento de forma correta para evitar que a máquina não se engasgue", compara. Nesse processo, Ruppenthal também enfatiza a necessidade de devidas regulagens tanto na máquina como na própria plataforma para evitar as perdas. Além disso, são pontos positivos para o sucesso de rendimento de grãos a atenção do operador da colheitadeira respeitando a velocidade adequada e as condições de umidade favoráveis.

Atualmente, estão disponíveis no mercado plataformas com tecnologia que atenuam os efeitos de perdas nesse componente frontal da máquina. Trata-se da plataforma 'Draper', equipamento importado dos Estados Unidos e que está em praticamente todas as colheitadeiras dispostas no mercado brasileiro. "A partir dessa tecnologia chegamos a um nível de perda de 0,5%", calcula Ruppenthal.

Em plena sincronia

Para Silveira, na plataforma há a ação conjugada de três sistemas independentes, mas que trabalham sincronicamente, e ambos sofrem a ação direta da velocidade de deslocamento do equipamento colhedor. Esses sistemas são (1) a barra de corte, (2) o molinete e (3) o sem-fim da plataforma ou caracol. "O primeiro é o principal elemento de perdas de grãos da plataforma e, dessa maneira, deve-se atentar para a troca de navalhas danificadas, o alinhamento dos dedos das contra-navalhas, o ajuste da folga da barra de corte que, se não justado corretamente, poderá ocasionar o corte irregular ou arrancamento das plantas. Quanto ao molinete, o cuidado principal é que os travessões com os pentes toquem o terço superior das plantas de soja, posicionando-se de tal modo que a projeção do seu eixo fique entre 15 centímetros (cm) e 30 cm à frente da barra de corte. É também importante conferir se a velocidade de trabalho do molinete está um pouco superior à velocidade de deslocamento da colhedora". Uma excessiva velocidade do molinete pode ocasionar queda de vagens na frente da barra de corte. Finalmente, segundo o pesquisador, no caracol deve ser observada a altura em relação ao fundo e a parte posterior da plataforma de alimentação.

Modernização dos sistemas

O constante processo de evolução do maquinário, disposto para o desempenho da tarefa de colheita no campo, foi garantindo menores perdas ao produtor rural, saindo de 5% a 6%, há cerca de 20 anos, para se chegar hoje a índices inferiores a 1%, segundo avalia o gerente de vendas especiais da New Holland, Marcos Arbex. "Com o controle automatizado do sistema de alimentação em alguns equipamentos, hoje já disponível aos produtores rurais, é possível fazer, por exemplo, todas as regulagens a partir da cabine da colheitadeira. O operador só precisará dirigir, enquanto que a máquina controlará a velocidade e a própria regulagem da plataforma ao terreno", afirma.

Outro componente destacado por Arbex é o molinete rotativo que, juntamente com a barra de corte, traz a planta, direcionando-a para frente e, posteriormente, a leva para dentro da máquina, auxiliando o sistema de alimentação. Há modelos equipados com sensores que fazem a própria leitura de perdas no interior da máquina e dão alerta ao operador para que ele faça uma troca de regulagem ou mesmo opte por uma velocidade menor.

A modernização da plataforma permitiu que o material colhido não tivesse muito atrito para não ocasionar a debulha prematura das vagens ainda na "boca" da colheitadeira. Para Eudes Veit, especialista de produtos de mercados da John Deere, as transformações empregadas com a plataforma 'Draper' permitiram que essa debulha prematura não mais ocorresse. "Além disso, a busca por maior produtividade na soja fez com que os produtores optassem por cultivares com maior número de vagens - vagens essas que ficam mais próximas do solo. A partir dessa plataforma mais flexível foi possível fazer esse corte mais rente ao terreno, colhendo as vagens mais baixas da planta", acrescenta. Segundo Veit, o ajuste da máquina é simultâneo, pois há um sistema que faz a leitura do terreno e informa ao operador para que seja feita a devida regulagem.

Para perder menos tem de ser flexível e funcional internamente

Douglas Vincensi, gerente de Marketing de Produto Colheitadeiras da AGCO, detentora da marca Valtra, descreve a flexibilidade da plataforma, feita a partir de braços independentes de inclinação com amortecimento hidráulico, localizados por toda a extensão da plataforma. "Os braços são igualmente espaçados e possuem coxins de flutuação seccionados, fornecendo uma amplitude de deslocamento de 200 milímetros (mm). Na regulagem de mínima pressão, a barra de corte fica totalmente flexível, aumentando a pressão no solo. Já na posição de ajuste de pressão máxima, a força exercida no solo é reduzida, tornando a barra de corte mais rígida e menos flexível. Essas regulagens proporcionam um resultado mais preciso da cultura com menos danos ao solo", diz - e, por consequência, há aí a redução nas perdas.

Medido em quilos por hectare (kg/ha), Vincensi diz que o Estado do Paraná é um exemplo positivo de dados de menor índice de perdas de soja do País, cuja média, de acordo com dados oficiais, é de aproximadamente de uma saca de 60 kg por hectare (sc/ha). "Levando-se em consideração uma produtividade média de 3.300 kg/ha, teríamos uma perda aproximada de 1,8%, sendo que temos médias recentes de perdas pelas nossas colheitadeiras de 30 kg/ha, o que corresponde a aproximadamente 0,9% em relação à produtividade informada", declara.

Para Felipe Dantas, especialista em colheitadeiras da Case IH, itens internos na máquina também fazem o diferencial na hora do processo da colheita. Como é o caso de um sistema opcional específico para cada tipo de grão, como, por exemplo, a soja e o milho. "O rotor e os côncavos são adaptados às condições desses dois grãos, o que auxiliam na hora da colheita", certifica Dantas.

Dentro da máquina todo um processo industrial é feito para separar o grão da palha. Nesse sentido, sistemas de ventilação com fluxo de ar homogêneo e peneiras vão fazendo todo esse trabalho.

Diante dessa tarefa, outro destaque é a presença do bandejão, que funciona como uma mesa vibratória, estratificando o material antes da entrada nas peneiras, ou seja, ele faz com que o grão fique na parte inferior da massa de grãos e a palha na parte superior, resultando em uma maior eficiência na limpeza dos grãos, melhor qualidade do grão e também menores danos mecânicos. "O alimentador, o rotor, o sistema de limpeza, o manuseio do grão, o gerenciamento de resíduos e os sistemas de força são projetados visando otimizar o fluxo do material colhido e maximizar sua produtividade", complementa Dantas.

Operador e medidor de perdas

Na opinião do pesquisador da Embrapa Soja, o principal elemento de minimização das perdas de grãos na colheita mecanizada de soja é o operador da colheitadeira. Se estiver bem treinado e consciente do papel que representa no processo todo, ele será o ponto de equilíbrio e de comando entre a lavoura de soja e o equipamento colhedor. "É dele, juntamente com o técnico que acompanha a colheita, a responsabilidade pelo monitoramento da ceifa, ou seja, acompanhar, por exemplo, as variações nas condições dos grãos, principalmente quanto ao teor de umidade, para fazer os ajustes necessários em todos os sistemas envolvidos, principalmente o de trilha", afirma Silveira.

Outra necessidade de monitoramento é quanto às perdas totais de grãos, aquelas deixadas pela colhedora na área colhida. Para esse caso, a Embrapa Soja desenvolveu a tecnologia do copo medidor - um recipiente plástico transparente, que apresenta uma escala graduada para quantificar as perdas de grãos (em sacos de 60 kg por hectare), por meio de amostras coletadas em uma armação de dois metros quadrados (m²), tendo a largura da plataforma de alimentação como uma das medidas básicas. "Os grãos depositados diretamente no copo medidor dão a informação das perdas de modo rápido, fácil e eficiente, assinalando o nível de tolerância de 1,0 saco como perda aceitável nacional e internacionalmente", explica o pesquisador.

Quanto à idade da colheitadeira, para Silveira, o que importa é o seu estado de conservação e manutenção - estando esses em dia, é possível realizar um trabalho de excelente qualidade. "Erroneamente se pensa que máquinas novas podem realizar a operação de colheita com velocidades elevadas, acima de seis quilômetros por hora (km/h), mantendo baixos os níveis de perdas de grãos. Velocidades de deslocamento entre quatro e seis km/h são recomendadas em função do funcionamento da barra de corte da plataforma de alimentação, além de ter-se experimentalmente, a comprovação de uma correlação direta entre velocidades elevadas e perdas de grãos", testifica.

Quanto à declividade das áreas cultivadas, algumas máquinas modernas possuem sistemas flutuantes (que mantêm um paralelismo em relação ao solo) na plataforma de alimentação e nas bandejas do sistema de limpeza, que possibilitam maior eficiência nestas condições específicas.

O futuro das colheitadeiras

Altas produtividades, na maioria das vezes, estão associadas a maiores volumes de material vegetal que devem ser processados por quase todos os sistemas da colhedora, segundo Silveira. Atualmente, pelo emprego do corte, toda a planta é trabalhada pela máquina, o que requer elevados gastos de energia, principalmente no sistema de trilha. "Em um futuro não muito distante, com sistemas colhedores mais sofisticados, quem sabe possamos poupar energia nas colhedoras e processar somente o produto que nos interessa - no caso, o grão de soja. E aí poderemos usar velocidades de trabalho mais elevadas, o que não se aplica à realidade atual", conclui o pesquisador.

Os especialistas recomendam

1) Treinamento contínuo e intensivo dos operadores de máquinas, quanto à prevenção das perdas de grãos no processo de colheita. Para isso há cursos de regulagem de máquinas e de treinamento e capacitação de mão de obra oferecidos pelas próprias montadoras;
2) Manutenção, revisão e regulagem das máquinas, como os mecanismos de trilha, separação e limpeza da colheitadeira;
3) Monitoração, por parte de técnicos e operadores, da colheita durante todo o tempo, fazendo as regulagens dos componentes de cada sistema da colhedora (como o sistema de corte da plataforma, com a troca de navalha gasta ou quebrada, o ajuste correto da correia de acionamento, ou mesmo a substituição das guias com desgaste excessivo);
4) Monitoramento da velocidade adequada às condições da própria lavoura, isso garantirá o tempo hábil para todo o processamento necessário de debulha e liberação para fora da colheitadeira somente a palha isenta de grãos;
5) Saber que abaixo de 13% e acima de 15% de umidade do grão, as perdas quantitativas e qualitativas se intensificam, se não forem tomados os cuidados necessários no funcionamento dos sistemas da colhedora;
6) Ajuste da rotação do molinete de acordo com a umidade e adensamento de plantas, substituindo dedos por ventura quebrados;
7) Escolha de uma semente de qualidade para o plantio, que resultará em plantas mais vigorosas e produtivas, assegurando o êxito no processo de produção da soja;
8) Dimensionamento do conjunto de máquinas necessário para a operação de colheita, com intuito de não sobrecarregar o equipamento e o operador com muitas horas de trabalho.


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