A
partir da virada do século o Brasil decidiu entrar,
definitivamente, para o "rool" dos grandes fornecedores
mundiais de frutas de mesa. Hoje, as frutas brasileiras já
fazem parte do cardápio de grande parte dos países
da União Européia, Ásia, Oriente Médio
e do Continente Americano. Só que para o país
continuar se mantendo competitivo e fornecendo regularmente
para esses países os fruticultores estão tendo
que operar uma verdadeira revolução nos seus
pomares.
A produção integrada, realidade presente na
maior parte dos países produtores de frutas e que concorrem
com o Brasil no comércio mundial, está entrando
com tudo nas propriedades brasileiras. Como parte integrante
nesse processo a cadeia frutícola está buscando
se adequar, rapidamente, tendo em vista que o prazo para efetivação
das normas internacionais de produção está
acabando e muito produtor que não fez direito o dever
de casa, corre o risco de perder espaço ou até
mesmo ficar de fora desse cobiçado mercado de consumo.
Para que isso não aconteça o Ministério
da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, MAPA, junto
com os principais institutos de pesquisa e extensão
rural, criaram o PIF, Produção Integrada de
Frutas. A CATI, Coordenadoria de Assistência Técnica
Integral, entidade ligada a Secretária de Estado da
Agricultura de São Paulo, desenvolve um trabalho junto
aos fruticultores de Campinas e região para tornar
o programa uma realidade, já a partir dos próximos
anos, destaca Henrique Comte, engenheiro agrônomo do
Conselho Gestor Técnico da Casa da Agricultura de Campinas,
mantida pela CATI.
Comte que faz parte de uma equipe de técnicos extensionistas,
responsáveis pelo acompanhamento de inúmeras
propriedades no interior paulista, fala que o programa ainda
é recente no país e o trabalho da extensão,
nessa primeira fase, tem sido de motivação dos
produtores. Segundo ele, o principal estimulo à produção
integrada, hoje, tem sido a possível colocação
da fruta brasileira em mercados diferenciados que podem remunerar
melhor o produtor. No entanto, a contra partida exigida por
esses mercados é quanto à qualidade e a rastreabilidade
das frutas oferecidas. E essa qualidade, não é
só na aparência visual das frutas não.
Ela se dá também por outros pontos que o consumidor
brasileiro até pouco tempo não se mostrava muito
preocupado. O tipo e a quantidade de agrotóxicos usados
nos pomares, por exemplo, é um dos pontos principais
do acordo de comercio de frutas entre Brasil e União
Européia.
Um estudo do departamento de Fitotecnia da Faculdade de Agronomia
Eliseu Maciel, da Universidade Federal de Pelotas no, RS,
mostra de que forma os produtores de frutas da região
Sul da Itália, acabaram com o problema do uso exagerado
de agrotóxicos nos pomares de frutas. As normas da
produção integrada naquele país reduziram
sensivelmente o uso dos agro-químicos. Só para
se ter uma idéia dos 44 fungicidas que tinham registro
legal, após a implementação das normas
apenas 25 permaneceram na lista. No caso dos inseticidas a
lista dos barrados foi ainda maior. Do total de 71 nomes registrados
apenas 22 foram liberados para aplicação. Entre
os acaricidas e herbicidas, dos 21 nomes com registro, apenas
4 entraram na listagem, respectivamente.
O modelo de produção integrada para fruticultura
de mesa praticado na Europa serviu de inspiração
para o PIF brasileiro. O projeto que nasceu na Embrapa Uva
e Vinho, de Bento Gonçalves, RS, com produtores de
maça, atualmente congrega 13 culturas e existem outras
4 que estão esperando aprovação do ministério
da agricultura para entrarem no programa.
De acordo com o técnico paulista, a criação
de um conselho gestor, formado por técnicos da CATI,
deu início ao trabalho de gerenciamento do programa
junto às propriedades rurais. A área de cobertura
dos técnicos é dividida por regiões produtoras
e supervisionada pela unidade de Campinas que cobre toda as
cidades, desde Sumaré, SP, até Atibaia, SP,
já quase na divisa com o estado de Minas Gerais.
A próxima etapa do programa diz respeito a criação
de políticas públicas que permitam às
certificadoras a emissão dos selos de qualidade para
as novas cultivares que estão entrando na realidade
produção integrada". No caso de São
Paulo, todo esse trabalho será inspecionado pelo governo
através do Instituto Nacional de Pesos e Medidas (Inmetro).
A preservação do Meio Ambiente é outro
ponto forte do acordo de comércio de frutas internacional.
Sendo assim, o PIF tem normas bastante rígidas quanto
à preservação e utilização
dos recursos naturais presentes nas áreas de cultivo.
O protocolo prega ainda uma padronização dos
frutos; a ausência total de danos mecânicos que
prejudiquem o aspecto visual da fruta, além do frescor
e a condição de maturação das
frutas até a gôndola do supermercado.
A
mudança começa na lavoura
O
produtor Aroldo Bruno Lacarini, cultiva figo da variedade
italiana, numa área de cinco hectares, da chácara
Santa Escolástica, em Valinhos, SP. A lavoura que existe
desde 1963, quando foram plantados os primeiros pés,
garantem uma produção, nos 8 mil pés
plantados de 8 a 10 caixas todos os anos. No total a família
Lacarini detém 50 mil figueiras na região de
Campinas, todas com produção regular, segundo
o fruticultor. Como uma parte da sua produção
segue para abastecer o mercado europeu, o PIF já é
uma realidade na lavoura da Chácara Santa Escolástica.
E a cartilha é bastante diversificada. Todos os anos
o manejo da lavoura é feito assim que termina o período
da colheita, em meados de abril, maio. Além da adubação
que é feita de acordo com as exigências do programa
o produtor mantém uma cobertura orgânica formada
com bagaço de laranja. No mês de junho ele faz
a poda dos galhos, mantendo, apenas, um tronco principal.
Segundo ele, com isso a planta consome um quantidade menor
de nutrientes, chegando mais vigorosa a próxima fase
que é a brotação. Os primeiros frutos
que começam a surgir já a partir de agosto,
setembro, dependem de condições favoráveis
para emergir com maior força. "Nessa época
do ano o calor ainda não é tão forte
e os figos ficam mais vistosos", exclama o produtor.
E, é justamente nesta fase que a maior parte da produção
dos Lacarini segue para a exterior, mais de 80% da colheita.
Segundo Lacarini, quando começa a brotação,
o manejo pede que seja feita uma ralhação nos
galhos para eliminar o excesso da planta. Isso acontece porque
na cultura do figo, ao invés de se eliminar o excesso
de frutas do pé como acontece com outras culturas caso
do pêssego, nectarina entre outras que dão seus
frutos de uma só vez, o produtor tem de diminuir o
número de galhos, pois, são neles que os figos
novos vão aparecendo ao longo da floração,
explica. "O ideal é que se deixe entre sete e
oito galhos num pé adulto", explica o produtor.
A colheita é outra etapa que tem um processo todo especial
e que depende, fundamentalmente, da experiência das
pessoas que trabalham na lavoura. Já o controle de
pragas e doenças precisa ser feito com muito critério,
porque o uso de agrotóxicos é extremamente controlado,
explica Lacarini. Para manejar a lavoura contra a ferrugem
da folha e a broca do galho, principais pragas que atacam
a figueira, o produtor usa uma espécie de solução
com cal branco, o mesmo usado na construção
civil e sulfato de cobre, aplicados nas folhas, a partir do
início da fase de maturação, poucos dias
antes de se realizar a colheita
Outro problema comum na colheita e que requer uma atenção
especial dos trabalhadores é não deixar frutas
maduras no pé. Isso é comum porque como os figos
não florescem ao mesmo tempo, eles também não
têm um amadurecimento uniforme. Nesses casos, as frutas
maduras no pé viram banquete para as varias espécies
de passarinhos e para os morcegos que vivem na região,
destaca o fruticultor.
Outro ponto importante nas normas do PIF, diz respeito aos
critérios para a exploração da mão-de-obra
dos trabalhadores rurais e do trabalho infantil na propriedades.
Na produção integrada de frutas dE São
Paulo os trabalhadores são, na sua maioria, meeiros,
dividindo os resultados e os custos da produção
com o dono da lavoura. As famílias fazem um contrato
de prestação de serviços, junto aos sindicatos
rurais da sua região. Reginaldo Antônio Marenetto,
de 23 anos é meeiro há 12 anos nas lavouras
da família Lacarini. Junto com a esposa Glaudinéia
e o filhinho Felipe, de 2 anos, eles recebem moradia e uma
renda média individual de R$ 400,00, por mês.
Durante os meses da entressafra, quando não tem colheita
de figo, o trabalhadores vivem da poupança que fizeram
e alguns adiantamentos. Na Chácara Santa Escolástica
trabalham três as famílias de meeiros. Cada uma
cuida, em média, de 2 a 3 mil pés de figo, explica
Reginaldo. Para o técnico da extensão grande
parte desses trabalhadores, nunca viveram uma situação
tão favorável como está que eles vivem
agora. " Hoje, eles tem contrato de trabalho, garantia
de renda mensal, durante a safra e, se eles trabalharem corretamente,
garantia de trabalho por muitos anos", conclui o agrônomo.
Comércio
de Frutas processadas busca espaço
Além
do comércio de frutas in-natura que já coloca
o Brasil como uns dos principais países do mundo, a
fruticultora brasileira está se organizando no sentido
de buscar novos nichos de consumo. Sylvio Luiz Honório,
professor da Faculdade de Engenharia agrícola, Feagri,
da Unicamp, em Campinas, SP, diz que para entender melhor
como funciona o mercado de frutas semi-processadas é
necessário entender os aspectos que envolvem esse setor.
Em primeiro lugar, em geral, não é um bom caminho
pensar em aproveitamento de sobras, porque a indústria
de alimentos requer produtos com qualidade. Em outras palavras
o agricultor, face às exigências qualitativas
do mercado, deverá se especializar, cada vez mais,
para produzir produtos padronizados para a indústria
ou para o mercado (in natura).
Para ilustra sua colocação o pesquisador idealiza
uma situação hipotética onde uma indústria
de processamento de frutas que tenha que trabalhar com sobras,
cuja qualidade e quantidade podem variar ao longo do tempo.Seguramente
ela se tornará anti-econômica e se quer terá
a garantia da qualidade e constância de oferta dos seus
produtos para os seus clientes, enfatiza. "Ninguém
sobrevive desta forma", conclui o pesquisador.
Segundo Honório, o processo de agregação
de valor às frutas pode acontecer tanto para o produto
(in natura), quanto para o fruto processado. "Um produto
natural bem tratado no campo, com boas práticas agrícolas
desde a etapa de beneficiamento, armazenamento e transporte
pode sim chegar ao mercado mais valorizado". As fases
seguintes como a análise de perigos e de pontos críticos
de controle, APPCC, já estão entre as preocupações
da cadeia da fruticultura.
Atualmente as frutas produzidas no país, chegam ao
mercado na forma de sucos, polpas, nectares, doces, desidratados,
componente de sorvetes e lácteos ou modificadas na
sua apresentação, sem perder as suas características
(in natura), que são produtos conhecidos como processados
minimamente (podem ser cortados, higienizados, colocados em
embalagem adequadas e prontas para o consumo).
Para o professor da Feagro, em todas estas situações
se considerar a aceitação do produto pelo mercado
que é quem paga a conta, é fundamental conhecê-lo,
antes de qualquer iniciativa empresarial. O mercado está
em expansão, ainda que lentamente, mas se vê
no mercado o aumento da diversidade de produtos, principalmente
de sucos, polpas e lácteos com frutas. Há grande
expectativa para o mercado de exportação. O
Estado de São Paulo já tem programa de apoio
ao pequeno exportador, e a freqüência de consulta
de importadores internacionais é crescente verifique
dados com o IBRAF. "Por isso, a exigência pela
qualidade é crescente".
Num futuro muito próximo só se manterá
no mercado as empresas que garantirem a qualidade do seu produto,
ou seja a empresa rural, para a fruta /in natura/, processada
ou processada minimamente, terá que ter melhor domínio
tecnológico para garantir o seu produto no mercado,
destaca Honório.
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