Quando
o Brasil iniciou a implantação da rastreabilidade
bovina - pressionado pela imposição de compradores
externos - estava na verdade dando mais um passo em direção
da instalação de um processo de segurança
alimentar dentro da cadeia da carne bovina. E quando produtores
de frutas em conjunto com o Ministério da Agricultura
implantam o Sistema de Produção Integrada de
Frutas, também estão se engajando na construção
de um processo de segurança alimentar para o seu setor.
O
tema Segurança Alimentar tem basicamente dois vértices
no qual pode ser tratado. Em primeiro, o da qualificação
dos alimentos deste a sua produção até
a colocação do mesmo a disposição
do consumidor. O segundo está, de certa forma, conectado
ao primeiro pela questão da qualidade, mas se direciona
para o lado de oferecer alimentos, em quantidade suficiente,
a toda a população de um país. Para tanto
o governo estabelece estratégias de distribuição
e estoques, a fim de que não ocorra falta de alimentos.
De uma certa forma esta segunda parte o Governo brasileiro
tem conseguido dar conta do recado. Mas quanto a primeira
parte, existem várias iniciativas que estão
ocorrendo, em diversos segmentos do agronegócio, que
buscam atingir os níveis que satisfaçam tanto
as exigências de nossos importadores quanto as dos consumidores
internos. Em países cuja preocupação
não é mais a de acesso de alimento para toda
a população, a questão de segurança
dos alimentos passa a ser o principal item nas negociações
comerciais. Principalmente após a ocorrência
de problemas como o mal da vaca louca ou a gripe do frango.
Também por esta razão, começa a ocorrer,
de forma mais intensa, dentro do Brasil, um movimento que
busca a formulação de uma política de
segurança alimentar, na qual serão estabelecidas
normas e regras gerais para a questão. Ao mesmo tempo
já existem programas e ações práticas
que estão levando este conceito às mais diversas
cadeias produtivas da agropecuária. Um destes programas
que mais chamou a atenção e que mobilizou setores
da cadeia da carne bovina foi a rastreabilidade. O Governo
FHC, na busca de aproveitar a oportunidade de ganhar novos
mercados, principalmente o europeu, decidiu implantar um sistema
de rastreabilidade bovina no qual, através de rígidos
controles seria possível determinar qual a origem de
um determinado lote de cortes ou mesmo de um único
pedaço embalado. Isto porque, até o ano passado,
todo o rebanho de uma propriedade, deveria receber uma identificação,
com números individualizados, que seriam cadastrados
em um grande banco de dados, chamado Sisbov.
O que a rastreabilidade desencadeou foi uma complementação
a um processo de controle de qualidade da carne, que já
existe dentro dos frigoríficos e abatedouros, através
das vigilâncias sanitárias, e que também
tem merecido cuidados no momento do transporte e da colocação
nas gôndolas ou dos açougues.
"Este programa foi estabelecido com a idéia de
melhorar o processo produtivo dentro da propriedade. Cada
empresa certificadora precisa verificar e relatar não
só dados do rebanho, mas também, as condições
de higiene, de alimentação e de condições
sanitárias (vacinas, remédios, etc). Por isto
que nosso trabalho hoje, vai além da simples função
de controle e colocação de identificadores (brincos)",
afirma o presidente da Associação das Empresas
de Certificação e Rastreabilidade Agropecuária,
Acerta, Luciano Antunes.
Luciano acredita que a rastreabilidade como um todo (que pode
ser usada por qualquer setor), tem uma grande função
que é a de poder controlar a qualidade do alimento
desde sua origem, garantindo ao consumidor um alimento mais
seguro. O dirigente da entidade afirma que o processo é
tão extenso e complexo que não dá para
parar dentro da propriedade. É preciso estabelecer
um link de controle inclusive com os fornecedores de insumos
como vacinas, rações, pastagens e muitos outros
setores. Mas para ele há um ponto que pode trazer retrocesso
em tudo o que já foi conquistado até agora.
A modificação na regulamentação
do Sisbov ocorrida no ano passado permitiu ao pecuarista identificar
somente o rebanho que vai para o abate de exportação.
Além disto determinou que haja somente um período
de quarentena de 40 dias o que inviabiliza a certificação
por conformidade, na qual se controla toda a prática
de bom manejo, como as questões sanitárias e
nutricionais.
"Com esta atitude, reduzimos o nível de exigência
das boas práticas de produção, freando
um processo de conscientização no produtor de
que ele também é responsável pela qualidade
do alimento que vai chegar ao consumidor, o que normalmente
não acontece porque a maioria deles não se percebe
como um produtor de alimento e sim criador de gado de corte",
afirma Luciano. Aliás, na opinião dele, é
preciso criar um sistema de normas que estabeleça claramente
as responsabilidades de cada um na elaboração
do alimento. "Porque quando um problema acontece, normalmente
só um dos elos é penalizado, o produtor, normalmente
não sofre sanções", informa. Segundo
o dirigente, na Europa, o controle é feito em todas
as etapas. Assim é possível garantir a eficiência
do processo de segurança alimentar.
Controle
de Qualidade
Sem
dúvida alguma o setor de processamento de alimentos,
agroindústrias em geral, são os que mais desenvolvem
processos de controle de qualidade. Incluindo aí, cursos
e treinamentos constantes em boas práticas de fabricação.
Geralmente os setores de qualidade possuem equipes que estão
sempre atentos para que não aconteçam falhas
que possam provocar problemas alimentares no consumidor. Mas
a questão de segurança alimentar, como já
foi dito antes, é muito extensa e deve ser levada aos
mínimos detalhes.
Para o Secretário de Defesa Agropecuária do
Ministério da Agricultura, Gabriel Maciel, é
preciso que o controle da qualidade e da segurança
seja feito nos mais diversos lugares e dentro de todos os
segmentos da cadeia. "Isto não é fácil
porque as estruturas de governo são pequenas para um
país tão grande", afirma.
Segundo ele, é preciso controlar desde a fabricação
até o local de armazenagem no mercado e depois, as
condições nas quais ele vai ser guardado para
consumo. "Muitas vezes podemos encontrar produtos que
dependem de freezer, mas que o dono do estabelecimento desliga
o equipamento a noite para fazer economia. Isto estraga totalmente
o esforço feito antes do alimento ser fabricado. Mas
para atingir a melhoria neste ponto, será necessário
que o consumidor tenha mais atitudes de cobranças.
Maciel afirma que a secretaria também tem exercido
controle na área de portos e aeroportos, quando do
momento de importação ou exportação
de produtos. "E é também nossa responsabilidade
a questão do controle de aftosa. Hoje, por exemplo,
estamos conseguindo atingir bons níveis de vacinação
em termos de país, o que nos tem garantido um certo
status dentro do mercado.
Exercendo o auto controle - Existem grupos de produtores ou
setores empresariais que tomam para si a ação
de controlar a qualidade do produto a fim de garantir um alimento
seguro. Redes de supermercados, a fim de criarem selos próprios
e uma imagem positiva junto ao consumidor, elaboram programas
de controle de produção junto a propriedades,
que precisam seguir normas pré estabelecidas, para
poderem permanecer no programa e receber melhor remuneração.
O Sindicato das Indústrias de Rações
e Suplementos Animais, Sindirações, vem trabalhando
em conjunto com o Mapa, para elaborar uma nova norma de fabricação
dos seus produtos, a fim de garantir que não haverá
"contaminações" e também criar
um selo de qualidade para os fabricantes que participarem
do programa.
Conforme explica a coordenadora técnica da entidade,
Flavia Castro, este processo está envolvendo todo o
segmento que compõe a fabricação de um
suplemento animal. "Pelo menos poderemos garantir que
quem usar os produtos com nosso selo, não terá
problemas na rastreabilidade", afirma, acrescentando
que pretendem realizar um trabalho que conscientize inclusive,
os revendedores para que mantenham boas práticas de
armazenagem do produto.
Outro programa que trabalha a questão da produção
segura de alimento é o Sistema Agropecuário
de Produção Integrada, SAPI. Este programa é
executado pelo Mapa em conjunto com várias cadeias
produtivas que manifestarem o desejo de ter um selo de qualidade.
Um dos setores que está mais avançado nisto
é o de fruticultura. O programa tem como objetivo manter
o sistema de produção sustentável e atestar
a qualidade das frutas brasileiras, tanto para exportação
como para consumo interno. Além da qualidade das frutas,
o programa prevê a aplicação de normas
de sustentabilidade ambiental e o uso de tecnologias que não
agridam o meio ambiente. "Este mesmo conceito pode ser
praticado por qualquer setor agropecuário", afirma
Juaquim Naka, assessor do Ministério para este programa.
Para ele este é um programa que está implantando
um novo paradigma de produção, exigindo uma
nova postura do produtor.
Nova postura é um requisito básico para que
todo este processo de adquirir um novo estágio na questão
de segurança alimentar e, por conseqüência,
bons mercados de exportação, seja implantado.
Para isto, Naka afirma que em geral, para começar a
discutir o início de um programa de produção
integrada, procurar reunir produtores e empresários
que já estejam sensibilizados sobre a importância
disto e que o resultado será maior ganho para todos.
"A partir da formação de uma boa massa
crítica, conseguimos ampliar o programa para muito
mais propriedades", conclui.
A conquista de um alimento seguro não depende somente
da área de processamento. O Setor de pesquisa tem muito
a colaborar. Segundo a pesquisadora da Embrapa Clima Temperado,
Maria Laura Mattos, a melhoria de resistência à
doenças e o aumento de produtividade são fatores
que a genética, através do processo de seleção
convencional, já garantiu para muitos produtos agrícolas.
"Se você melhora a resistência a doenças
e pragas, por exemplo, você está atuando na questão
de alimento seguro porque está diminuindo a necessidade
de aplicações de agroquímicos",
ressalta. E para ela, se for falar em transgênicos,
os ganhos podem ser, muitas vezes, melhorados pela introdução
de gens que vão enriquecer o alimento em determinada
característica.
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