A
polêmica sobre eventuais reações adversas
provocadas pelos alimentos geneticamente modificados, tanto
ao homem como ao meio ambiente, coloca os produtos naturais
em evidência, principalmente porque o sistema produtivo
dispensa o uso dos chamados insumos modernos, ou seja, os
agroquímicos. Essa discussão tem ocasionado
um sensível crescimento na procura dos orgânicos
e uma acentuada expansão na área de produção.
Para
o presidente da Associação de Agricultura Orgânica
(AAO), Eduardo Ribeiro Machado, o incremento da produção
é calculado em até 50% ao ano e a filiação
de novos produtores á entidade que, em 1998, tinha
100, e neste ano conta com mais de 200 associados, serve como
base do cálculo, pois não há estatísticas.
Isso, só na cidade de São Paulo, uma vez que
existem similares no interior paulista e em outros Estados,
onde muita área está sendo convertida. Em geral,
o avanço acontece no País todo, diz. O agrônomo
José Pedro Santiago, da Vidar, assinala que a área
de plantio, no âmbito nacional tem uma extensão
aproximada de 400 hectares, com predominância para as
hortaliças. Quanto ao volume de produção,
dentro do contexto da safra nacional de grãos, diz
que os orgânicos representam um traço, por enquanto.
Exportações
têm faturamentos de US$ 19 milhões
A
conversão de uma área agrícola convencional
para orgânica, segundo o presidente da AAO, que também
é produtor em Santo Antonio de Posse (SP), é
estimado em um ano, para as lavouras de ciclos anuais, e de
18 a 24 meses, para as chamadas cultura perenes. Machado lembra
que as perspectivas dessa não tão nova vertente
da agricultura são imensas, não só pelas
levantadas sobre os transgênicos mas, também,
pelo grau de saturação que o consumidor mostra
em relação á produção rural
tradicional e, acima de tudo, pela farta utilização
de agrotóxicos. A FAO, acrescenta, admite que em cinco
ou seis anos, os orgânicos tomam conta de pelo menos
20% do atual mercado de produtos agrícolas.
Como reforço de argumento afirma que uma ainda minoria
de consumidores internacionais exige, o Brasil já exportar
e tem uma receita bruta de US$ 19 milhões, totalizados
da seguinte forma: US$ 2,5 milhões de café,
idêntico valor em açúcar, US$ 4 milhões
do complexo soja ( óleo, grão e farelo), além
de outros US$ 10 milhões de citros, tudo orgânico.
No Brasil, o mercado de hortifrutigranjeiros, registram um
faturamento de R$ 5 milhões/ano, arremata.
Outra forma de medir o interesse pelo setor, conforme Machado,
é o ingresso de novos produtores. Muitos deles vêm
da agricultura convencional, onde eram classificados como
pequenos. Na verdade, 75% dos agricultores orgânicos
são pequenos e tocam a lavoura com a família.
Porém, ao optarem pela agricultura natural, se pequenos
empreendedores, na medida em que são obrigados a administrar,
não só a propriedade mas, também, o escoamento
da produção que, no geral, é feito através
de feiras livres e cestas, realizadas, na Capital, em bairros
como a Água Branca, Ibirapuera e Alphaville.
Banco
do Brasil abre linha de crédito para agricultura natural
Em
outros casos, partem para conversações com supermercados,
inclusive redes, onde negociam a colocação dos
produtos as gôndolas. Essa operação começou
há três ou quatro anos tem alcançado êxito,
na medida em que os hortigranjeiros, hoje, representam 1%
das vendas totais de hortaliças nesse tipo de comércio.
Atualmente, é comum ver um produtor da agricultura
convencional. Com problemas de endividamento. Já com
o orgânico, ocorre ao contrário, pois no final
da colheita compra um carro, um celular ou faz outra aquisição
qualquer que considera importante para atividade ou até
para uso pessoal, se vangloria Machado.
Esse baixo índice de endividamento, na verdade, quase
inexistente, é apontado, por achado, como decorrência
de falta de crédito oficial e específico para
o setor de orgânicos. O gerente do Banco do Brasil anunciou
hoje (30/9), que a instituição abriu uma linha
de financiamento exclusiva para agricultores de produtos naturais.
Não especificou o montante a ser disponibilizado, mas
garantiu que entre o convencional e o orgânico, nós
teremos a preferência. Eu calculo que, no máximo,
vamos utilizar, se isso acontecer, 1% do total de R$ 3 bilhões
mencionados como destinados ao crédito rural. Segundo
ele, antes do anúncio do bancário, o financiamento
ao produtor orgânico era feito por organizações
não governamentais, como a Mutual, em Botucatu, no
interior paulista, e a Vidar, na capital, com encargos acessíveis
e, no geral, mais baixos que os praticados pelo mercado. Outra
alternativa é o crédito bancário convencional,
pouco utilizado, a não ser em casos de extrema necessidade,
como investimento, por exemplo. A questão creditícia
lembra custos e, neste aspecto, Machado afirma que o custo
de produção varia de acordo com o produtor.
Contra
doenças, homeopatia. Alopatia, só em caso graves
Essas
despesas, acrescenta, dependem das condições
da propriedade e da região em que ela está inserida,
no sentido de quais elementos ou resíduos inclusive
industriais, desde que degradáveis são
oferecidos como ingredientes para a composição
do insumo a ser usado como adubo, o biofertilizante, feito
á base de restos vegetais e excremento de animais que,
fermentados, geram os micronutrientes exigidos pela terra.
É essa integração animal-vegetal que
vai determinar uma parte do peso total do custo de produção,
na medida em que inibe ou até impede o abastecimento
do produtor pelo mercado.
Outro aspecto é a utilização da mão-de-obra,
que é intensiva, apesar da agricultura orgânica
conviver com a mecanização. Dias atrás,
foi feito um dia de campo sobre o plantio direto, diz Machado.
Mas o trabalhador é muito exigido, pois, ano invés
do uso de herbicidas, é feita a roçada como
método de defesa, que inclui até armadilhas,
entre outros. O objetivo, enfatiza, é ter um meio ambiente
equilibrado, uma propriedade sem pragas, com um solo saudável,
vivo. Segundo afirma, um dos diferenciais básicos entre
os naturais e o convencionais, está no uso intensivo
de insumos orgânicos de mão de obra, tanto é
que nunca se ouviu falar em trabalhar intoxicado pela utilização
de agroquímicos. Até porque, esse tipo de acidente
jamais aconteceu, assegura.
Toda essa prática quase artesanal de produção
tem um objetivo, conforme Machado: oferecer um produto de
qualidade e saudável para o consumo. Os cuidados se
estendem a todas as etapas da produção. No caso
do leite, por exemplo, o pasto é tratado de acordo
com as normas vegetais, sem o uso de qualquer composição
química. Além disso, é sugerido que o
gado, tanto de leite como de corte, não tenha pasto
único, ou seja, tenha acesso a uma gama diversificada
de gramíneas. O tratamento de uma eventual enfermidade
do animal é feito com remédios homeopáticos.
Medicamento alopáticos, somente em situações
de gravidade e nas Vacinações anuais de prevenção.
Quando esse tipo de droga é aplicada, o leite produzido
não utilizado. Segundo ele, há uma determinação
sanitária que especifica um prazo de carência,
para que o produto seja posto ao consumo, depois do antibióticos.
Na produção orgânica, o tempo desse determinado
período é atendido em dobro. A medicação
básica é homeopática, demora um pouco
mais, mas funciona, garante.
Sementes
e mudas, obstáculos a um avanço maior
O
mesmo ocorre com o manejo das aves, a ração
convencional não utiliza. O alimento é de modo
geral, feito na propriedade com um mínimo de 20% de
orgânicos na composição. A partir do ano
2000, essa ração terá que ser composta
em 51% - por produtos de origem orgânica. È
uma exigência da AAO, assinala, acrescentando que a
galinhas têm acesso a pasto, um piquete para ciscarem,
muito verde na alimentação, como grama, folhas,
batata-doce, enfim, coisas que não contenham hormônios.
Com esse tipo de alimentação, o frango está
pronto para abate num prazo máximo de 70 a 80 dias,
podendo, no entanto, ser enviado para o consumo ou abate,
num mínimo de 60 dias, arremata.
Para machado, sementes e mudas, atualmente, são considerados
os grandes obstáculos para o setor de orgânicos
ganhar um impulso maior. Na área de sementes, o ideal
seria que elas tivessem origem em unidades orgânicas.
Porém, a oferta desse tipo de insumo é escassa
e obriga a utilização da produção
de unidades convencionais. Existe no Rio Grande do Sul uma
entidade, a Pró-Natura, que produz sementes orgânicas,
mas com oferta limitada, sobretudo em São Paulo, onde
possui algumas filiais. O mesmo raciocínio se aplica
em relação ás mudas. A preferência
recai porque nem todos os produtos têm o plantio a partir
da semente, como é o caso do morango. Sobre esta fruta,
especialmente, o presidente da AAO conta que alguns antigos
pequenos produtores convencionais se comprometeram a oferecer
mudas preparadas organicamente já a partir do próximo
ano, o problema, observa.
Além desses cuidados com a produção,
Machado aponta uma preocupação do setor em rastrear
os produtos oferecidos ao consumidor, que, com a polêmica
sobre os agrotóxicos e transgênicos, quer saber
o que está comendo. Por isso, as várias entidades
de produtores desse ramo agrícola, como o IBD Instituto
Biodinâmico ( de Botucatu/SP), a AAO (de São
Paulo, capital), a ANC Agricultura paulista) entre
outras, criaram um selo de qualidade pelo qual garantem o
produto em consumo está isento de componentes químicos.
Isso, segundo ele, assegura uma demanda crescente a esse tipo
de alimento, admitindo que a baixa oferta, no entanto,
reflete um pouco nos preços, finaliza.
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