Presidente
da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança-CTNBio,
Luiz Antônio Barreto de Castro, garante que sempre que
um transgênico é analisado está embutida
a preocupação de que este produto, uma vez em
uso comercial, não prejudique a biodiversidade. O
Brasil, aliás, não tem tantos problemas como
os países onde se localizam os centros de origem das
espécies. A maioria desses centros de origem, de culturas
como milho, soja, trigo, arroz, entre outras, está
fora daqui e localizados na Ásia, na Rússia,
no México, na China. Para ele, os OM`s são bem
mais problemáticos do que para nós, diz
ele. Mas a apreensão sempre existe, ou seja, os transgênicos
têm que trazer vantagens para agricultura, mas sem afetar
a biodiversidade, assinala.
Essa afirmação foi feita durante um seminário
sobre biotecnologia, realizado em São Paulo, em março
último, onde também foram explicados os termos
diversidade biológica ou biodiversidade, usados para
se referirem a variedade, usados para se referirem a variedade
de vida no planeta ou a propriedade dos sistemas vivos de
serem distintos. Restringindo pouco mais, biodiversidade é
definida como uma das propriedades da natureza e base das
atividades agrícola, pecuária, pesqueira e florestal
e, ainda, base para a indústria da biotecnologia.
Brasil,
o maior país tropical
Apenas
17 países possuem, em seus territórios, cerca
de 70% da diversidade biológica, a riqueza natural
do planeta. O Brasil tem posição de destaque,
pois é o maior país tropical do mundo com a
maior quantidade florestas intactas e o maior número
de espécies de plantas, mamíferos e insetos.
Trabalhos científicos em 1987 davam como a certa a
existência de 5 milhões de espécies de
organismos. Estudos mais recentes admitem a amplitude de 10
a 100 milhões de espécies, das quais são
conhecidas apenas 1,7 milhão.
O Brasil é visto como um país mega diverso
por abrigar de 15% a 20% das espécies do planeta. Conta
com a flora mais diversificada do mundo, com 55 mil espécies
descritas ou 22% do total mundial. Possui, ainda, a maior
riqueza de espécies de palmeiras (390 tipos) e de orquídeas
(2.300 tipos). Além disso, conta com uma alta taxa
de endemismo. O Brasil possui em cada onze espécies
de mamíferos (522 conhecidas), com 68 endêmicas;
uma em cada seis espécies de aves (1.622 conhecidas),
com 191 endêmicas; uma em cada quinze espécies
de répteis (468 identificados), com 172 endêmicas;
e uma em cada oito espécies de anfíbios (516
identificados), com 294 endêmicas.
A diversidade biológica também reflete
e com importância na economia do País
e é responsável por 31% das exportações
brasileiras, com destaque para o café, soja e laranja,
com realce em alguns dos principais setores produtivos como
a agroindústria, que representa aproximadamente 40%
do PIB - Produto Interno Bruto, o florestal, cerca de 4%do
PIB, e o pesqueiro, quase 1% de participação
do total da produção nacional.
Para preservar esse acervo natural, o governo federal baixou
a lei 8974 de 05/01/95, conhecida como a Lei da Biossegurança,
que fixa normas de segurança e mecanismos de fiscalização
no uso de técnicas de engenharia genética na
construção, cultivo e manipulação,
circulação, comercialização, consumo,
liberação e descarte de organismos geneticamente
modificados (OGM), visando proteger a vida e a saúde
do homem, do meio ambiente. A legislação também
autoriza o Executivo a criar a Comissão Técnica
Nacional de Biossegurança CTNBio.
Segurança
alimentar e ambiental, duas preocupações
Regulamentada
pelo decreto 1752, de 20/12/95, Barreto de Castro diz que
a Lei da Biossegurança é que rege, administra
o uso de transgênicos no País. A função
da CTNBio, acrescenta, é apenas analisar os aspectos
dessa segurança e não se um cultivar é
bom ou não, se adapta ou não a uma determinada
região, ou mesmo ao País, se tem ou não
maior ou menor produtividade, se é um bom negócio
ou não para o agricultor. A Comissão só
examina se o produto da biotecnologia é seguro ou não.
É seguro para quê?, indaga e responde:
nos vários aspectos de segurança alimentar,
quando houve liberação para a comercialização;
e do ponto de vista da segurança ambiental, desde quando
o produtor começa a ser testado no campo.
Barreto de Castro chama a atenção para o fato
de que o processo tem duas fases importantes. De início,
os produtos são testados no campo, em pequenos experimentos,
cercados de toda segurança, para que não
haja transferência de pólen, de sementes, de
nenhum material propagativo, para fora da área
de teste, ou seja, para o meio ambiente. Nessa etapa, são
feitas observações buscando uma certeza de que
não haverá qualquer problema que afete o ecossistema.
Essa preocupação inicial é basicamente
ambiental, frisa observando que o produto ainda não
será destinado ao consumo.
Na medida que os ensaios são repetidos, os testes de
segurança são refeitos até permitirem
chegar à conclusão de que o produto realmente
não vai oferecer qualquer distúrbio à
segurança ambiental. É freqüente
e a CTNBio não induz a ninguém a isso
que a instituição responsável
pelos testes queria comercializar o cultivar analisado. O
passo ou a fase seguinte, então, é essa instituição
ou empresa ir à Comissão apresentar o produto
e manifestar intenções de comercializá-lo
no Brasil, alegando que, do ponto de vista da biossegurança,
não há qualquer problema, nem ambiental, nem
alimentar e, importante, mostrar as provas. Isso mesmo,
o ôus da prova documentada cabe à
instituição ou empresa interessada, diz
ele.
Produto
aprovado fica cinco anos em observação
A
CTNBio recebe nesse documento, no geral muito extenso, pois
contém informações do desempenho do cultivar
em testes no exterior e no Brasil, analisa e coloca-os à
disposição da sociedade por um período
de 30 dias. Durante esse tempo, qualquer entidade pode ir
à Comissão estudar os papéis, tirar cópias
e pedir quaisquer esclarecimentos à instituição
proprietária do produto em questão. Quando acontece
isso, como foi o caso da soja, em que o Idec, Green-peace
e a SBPC fizeram perguntas, as questões são
enviadas para a empresa que fez o pedido de comercialização.
No caso usado como exemplo, a empresa foi a Monsanto que teve
de responder a todas as perguntas feitas pela sociedade, diz
Barreto de Castro.
A Comissão reúne toda essa documentação
para uma nova análise, na qual examina as perguntas,
as respostas e, se achar conveniente, a própria
CTNBio fará novos questionamentos, diz ele, acrescentando
que quando o assunto está exaustivamente discutido,
com todos elementos que permitem chegar a uma conclusão,
é emitido um parecer conclusivo. Até agora (março/99)
só foi feito um, sobre a soja tolerante ao herbicida
glifosato, revela Barreto de Castro.
Essa espécie de soja é cultivada no mundo, numa
de 15 milhões de hectares. No Brasil, ainda não
tem plantio comercial. Depois desse parecer conclusivo, cessa
a responsabilidade da CTNBio, a não ser no que diz
respeito ao chamado gerenciamento de risco. Nessa fase, é
feito um acompanhamento dos plantios comerciais com observações
adicionais sobre o comportamento desses cultivos em larga
escala, procurando detectar eventuais problemas que não
surgiram durante os experimentos, realizados em áreas
menores. Depois desse período é que o produto
passa a ter um tratamento desregulamentado, ou
seja, será considerado como um não transgênico.
No caso da soja, que está na fase de multiplicações
para avaliação, agora, de valor de cultivo e
uso, no Ministério da Agricultura, depois que entrar
na etapa de multiplicação comercial vamos
acompanhar o produto sob vários aspectos. Dentre eles,
verificar se tem algum efeito contra microorganismos do solo,
insetos benéficos, insetos pragas, ervas daninhas e,
ainda, observar se há um fluxo de genes para outras
espécies de soja. Esse processo demora 5 anos. Depois
disso, se não houver qualquer problema, a soja transgênica
passará a ser tratada como uma planta comum,
sentencia Barreto de Castro.
Ainda segundo o presidente da CTNBio, a autorização
final para o plantio em escala comercial é concedida
pelo Ministério da Agricultura que também é
responsável pela fiscalização, na qual
utiliza toda sua estrutura, inclusive a vigilância sanitária.
No
Congresso, intervenções esporádicas
No
Campo político, o assunto transgênico parece
não atrair muita atenção dos parlamentares.
São raras as intervenções sobre o tema
e, quando feita, a abordagem tem mais um aspecto de denúncia
do que do calor de um debate. Numa das poucas menções
sobre a biotecnologia, o Jornal da Câmara (dos Deputados)
publicou, em 27 de maio último, um aparte do deputado
federal Rubens Bueno (PPS/PR), em que pedia a transcrição
nos anais da Casa de um documento de autoria de Alberto Nobuoki
Momma, doutor em Economia do Desenvolvimento Agrícola,
sobre organismos geneticamente modificados.
No texto, segundo o parlamentar, o economista alerta que
as gigantes do mundo da ciência da vida e do agronegócio,
com fundamentos superiores ao PIB de muitos países,
como a Monsanto, Novartis, Agrevo, Rhône Poulenc, Dupont,
entre outras, orquestram o ritmo da engenharia genética
encetando operações de megafusões e incorporações
bilionárias, independente de posições
nacionalistas, sentimentais ou ideológicas. Diz ainda
que a técnica poderá produzir alimentos
com sérios impactos no meio rural, riscos à
saúde humana e ao meio ambiente, poluição
e erosão genética, redução da
biodiversidade, entre outros males.
Já o deputado Carlos Melles (PFL/MG), num artigo escrito
na seção Opinião, do Jornal da Câmara,
publicado em 25//5, afirma que a biotecnologia é
ferramenta indispensável para garantir a competitividade
da agropecuária brasileira, e neste ponto, desde a
instalação do primeiro laboratório de
engenharia genética de plantas na Embrapa, no início
da década de 80, o desenvolvimento de tecnologias nas
áreas molecular e celular é tarefa gigantesca
que exige implantação de infra-estrutura adequada
e permanente formação de pesquisadores. Os processos
de multiplicação clonal de algumas espécies
de plantas de plantas são hoje rotina no Brasil.
E finaliza afirmado que é necessário discutir,
para que se tome o melhor caminho.
Moratória
e perguntas sem resposta
Em
outra abordagem sobre o tema, o deputado Padre Roque (PT/PR),
publicado na mesma seção, diz que os debates
sobre transgênicos são intensos e calorosos,
mas restritos, colocando 7 perguntas que ainda continuam
sem respostas. Dessas questões duas merecem destaques:
Transgênicos são uma questão econômica
ou política? Dito de outra forma, a sua introdução
na vida das pessoas depende mais de uma exigência do
mercado ou de uma decisão política que leve
em conta interesses não exclusivamente econômicos
e mercadológicos? A segunda: São
os transgênicos uma alternativa tecnológica necessária
e necessariamente tecnológica, com o perdão
do trocadilho? Em outras palavras, ser contra os trangênicos
é sinônimo de avanço ou atraso tecnológico,
pura e simplesmente, ou a questão precisa ser colocada
em outro nível, que leve em conta questões ambientais,
éticas, de saúde pública e política?
Concluindo, o parlamento diz que a relevância
do debate necessário sobre os transgênicos só
será possível e conseqüente se o governo
suspender os experimentos e a comercialização
já autorizados ou os pedidos de autorização
em curso, até que científica, técnica
e politicamente se chegue a um consenso mínimo.
No início de junho, as Comissões de Agricultura
e Política Rural e da Amazônia e Desenvolvimento
Regional, promoveram uma audiência pública com
debates sobre os transgênicos, sobretudo a recente liberação
para o plantio da soja modificada. Em linhas gerais, entre
os participantes predominou a tese de que é preciso
mais discussões nas questões relacionadas com
a segurança alimentar e o impacto desses produtos no
meio ambiente.
A presidente do Idec Instituto Brasileiro de Defesa
do Consumidor, Marilena Lazzarini citou a proposta da SBPC
Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência,
que pede uma moratória, um prazo de 5 anos para o plantio
de organismos geneticamente modificado no País. O deputado
Pompeo de Mattos (PDT/RS) é favorável a uma
quarentena de um ou de dois anos para permitir
avanços nas pesquisas. Para ele, os transgênicos
vieram para ficar. Mas daí a concordar que fiquem do
jeito que estão, há uma grande diferença.
Também Odílio Balbinoti (PSDB/PR), acredita
que o ideal seria uma moratória não muito longa,
embora considere que essa medida é impossível
diante da liberação do plantio.
Fiscalização
deficiente, um dos temores
O
deputado Saulo Pedrosa (PSDB/BA), afirmou que inexistem pesquisas
no Brasil sobre os efeitos dos OGM`s no ser humanos e nos
animais, considerando a liberação uma irresponsabilidade.
Alertou ainda, para os riscos de surgir um monopólio
formado por três ou quatro multinacionais na área
de sementes e defensivos agrícolas, lembrando que a
América Latina possui centenas de milhões de
hectares cultiváveis, que podem ser transformados na
principal área de investimentos dessas empresas. O
parlamentar também criticou a CTNBio por conceder autorização
para lavouras experimentais, afirmando que no oeste
baiano vão plantar 3 mil hectares de transgênicos.
Isso não é pesquisa, é multiplicação
para comercialização futura. Já
Nilton Capixaba (PTB-RO), disse que essas lavouras totalizam
631 plantios no País e quer saber como o ministério
vai controlar essas plantações se nem a febre
aftosa está sob controle.
Luiz Carlos Heinge (PPB-RS), lembrou que, no mundo todo, existem
3.647 experimentos com transgênicos e que, em Cuba,
adotam a transgênese para criar vacinas contra hepatite
B. Segundo ele, a nossa insulina é produzida
com bactérias transgênicas. Por isso, não
podemos ficar na contramão, nem reinventar a roda,
senão pagaremos um preço muito alto.
Bráulio de Souza, funcionário do Ministério
do Meio Ambiente, defendeu mudanças na composição
da CTNBio por considerar que há um risco de perda
de credibilidade devido a participação de representantes
de empresas produtoras de transgênico. Para ele,
o MMA é obrigado a exigir o licenciamento do plantio
de OGM. Sem essa licença, a lavoura é
legal e pode ser embargada por lei.
Também a presidente do Idec, Marilena Lazzarini criticou
e acusou a CTNBio de cometer ilegalidade contra
o Cógigo de Defesa do Consumidor por não elaborar
a Norma de Segurança Alimentar. Assim, desrespeitou
o Código na obrigatoriedade de informação
e na liberdade de escolha do consumidor, por não considerar
necessária a rotulagem. Segundo ele, a Comissão
também não exige o Estudo de Impacto Ambiental
EIA e, com isso, infringe a Constituição.
Marilena Lazzarini disse, ainda, que essa não exigência
fez com que Ibama e o Idec entraram com uma ação
contra o governo, que se posicionou a favor da Monsanto.
Para ela, a CTNBio não teria poder para autorizar
lavouras demonstrativas de pesquisa com transgênicos.
Rotulagem
deve ser obrigatória
Os
representantes do Ministério da Ciência e Tecnologia,
presentes na audiência pública, lembra que a
criação e atribuições do CNTBio
foram definidas pela lei 8974/95 e a atuação
da comissão limita-se à emissão de parecer
técnico sobre biossegurança e não liberação
de produtos. Não obstante, para Fernando Reinach, secretário
de Desenvolvimento Científico, do MCT, é
impossível garantir que qualquer coisa não tenha
risco. Ele acha que há bons e maus transgênicos
e isso deve ser discutido caso a caso.
Ernesto Paterniani, da CTNBio, assegura que os OGM são
analisados com rigor pelos cientistas e são uma
ferramenta nova para agricultura. Diariamente, acrescenta,
comemos em frutas, cereais e vegetais, centenas de genes
que nunca existiriam sem a natureza e foram produzidos artificialmente
há mais de 50 anos. Ricardo Oliva, da Agência
Nacional de Vigilância Sanitária, do Ministério
da Saúde, defendeu obrigatoriedade da rotulagem e os
registros dos alimentos. São instrumentos que
devem ser utilizados. É nossa obrigação
cumprir a lei, afirmou numa referência à
defesa do consumidor. Para ele, a crescente incorporação
de tecnologia ao consumo exige uma atualização
das leis, para que os agentes públicos possam publicá-las
sem conflitos.
Para Marcos Jank, do Ministério do Desenvolvimento,
há ma revolução tecnológica
em curso. Pode-se produzir soja com menos colesterol e há
possibilidades de se criar alimentos com mais vitaminas.
Ao que disse, existem 30 milhões de hectares de transgênicos
no mundo, equivalente toda essa área agrícola
brasileira, que mobilizarão US$ 25 bilhões,
até 2010. Jank sugeriu a realização de
uma pesquisa sobre a demanda real da soja não transgênica
nos países importadores que, a seu ver, é de
300 mil toneladas, que considera um volume pequeno, num universo
como o Brasil que, segundo ele, exporta 20milhões/t
e é o terceiro maior produtor mundial da oleaginosa.
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