O
ano de 2002 promete ser um divisor de águas para o
mercado leiteiro. É que desde junho do ano passado
encontra-se em plena disseminação o Programa
de Modernização do Setor Produtivo de Leite
e Derivados, que proibirá o transporte do leite nos
tradicionais latões da fazenda às indústrias
de beneficiamento. A data é válida para as 1,2
milhão de propriedades leiteiras das regiões
Sul, Sudeste e Centro-Oeste, sendo que o Norte e o Nordeste
desfrutarão de mais dois anos, com um prazo que expira
em 2004, para se adequaram à nova realidade. A iniciativa
visa melhorar a qualidade e competitividade do produto nacional,
exigindo o resfriamento do leite antes de seu deslocamento
aos laticínios. Trata-se da coleta a granel, compreendida
a partir do armazenamento do leite a 4ºC, nas fazendas,
por um período de, no máximo, 48 horas após
a ordenha inicial, depois transportado em caminhões
tanques até as fábricas. A melhoria é
um quesito irreversível e o setor vive um momento propício
para encarar essa tendência. No entanto, ninguém
poderá exigir do produtor se não existirem créditos
compatíveis à atividade, argumenta o chefe
do Departamento de Economia e assessor da Comissão
Nacional da Pecuária de Leite da Confederação
Nacional da Agricultura (CNA), Vicente Nogueira Netto. Nesse
sentido, as reivindicações excedem a necessidade
de energia elétrica estável nas propriedades
e malha viária decente. Da proposta que a CNA encaminhou,
em março, ao governo, solicitou-se alguns ajustes,
que, segundo Netto, promete culminar num acordo de consenso
já no final de junho. Até agora, foi criada
uma linha de crédito no BNDES, com juros de 11,95%aa.
Pelo que consta, o Ministério da Fazenda, na tentativa
de eqüalizar percentuais mais baixos. Acredito
que teremos sucesso junto ao governo, anuncia Netto.
Enquanto essa realidade não traz algo de concreto,
a iniciativa privada não deixou por menos e há
algum tempo, vem contabilizando resultados práticos
com financiamentos próprios, adiantamentos e parcerias
com bancos. Não é à toa, que algumas
empresas, como a Parmalat, Nestlé, Itambé, Batavo
e Vigor contam com a boa parte de sua coleta de leite e regime
granelizado. Cada qual respeitando sua política administrativa,
implementou programas de incentivo tecnológico a produtores
de leite.
Com captação em Minas Gerais, Goiás e
Distrito Federal, a Itambé começou, há
sete anos, o trabalho denominado Programa Itambé
de Aumento da Produtividade do Rebanho Leiteiro. Com
recursos próprios e de terceiros, disponibilizou, de
lá para cá, algo em torno de R$ 70 milhões,
com financiamentos para equipamentos, alimentação
para inverno e verão, melhoria genética, informatização
dos controles de rebanho e consultoria técnica. Uma
iniciativa que garante, hoje, que mais de 70% de sua produção
industrial tenha o leite resfriado como sua principal matéria-prima,
o que representa 44 milhões dos 63,9 milhões
de litros de leite adquiridos mensalmente pela Itambé.
Recursos
próprios
Somente
para a coleta a granel, iniciada há dois anos, a empresa
investiu R$ 35,9 milhões, devidamente repassados aos
pecuaristas para a implantação da nova tecnologia.
O mais de quatro mil produtores que aderiram ao sistema
de granelização contam com uma bonificação
de 9% no preço do leite e com redução
no custo do frete na linha de captação,
adianta o presidente da companhia, José Pereira Campos
Filho. Segundo ele, além do ganho econômico para
a fazenda, o leite granelizado propicia maior rendimento durante
o processo de fabricação, já que apresenta
menor contagem bacteriana. Comparada ao produto em latão,
o índice médio de bactérias cai 3 milhões/ml
para cerca de 500 mil/ml. De acordo com o presidente, a Itambé
tem por meta atingir contagens menores a 100 mil bactérias/ml.
Ainda para este ano, estamos com o objetivo de adotar
a granelização para todos os nossos pontos de
captação de leite.
Para isso, a empresa mantém programas de financiamento
do tanque de expansão com pagamento em moeda leite,
aliada a otimização das rotas de coleta, com
a proposta de reduzir custo do frete. Com o apoio do software
Trucks e do levantamento de campo por GPS, o roteiro
dos caminhões respalda-se dos mais indicados direcionamentos.
Essa é a forma de se obter rotas econômicas
e tecnicamente viáveis, com melhor utilização
do caminhão-tanque, afirma o responsável
pelo Projeto de Coleta a Granel, Francisco Ferreira Sobrinho.
Com uma política diferenciada, a Batavia S/A, detentora
da marca Batavo, que possui três núcleos de captação
de leite no Paraná, situados nas cidades de Arapoti,
Castro e Cambei, deixa a questão de financiamento ao
pecuarista fica a cargo das cooperativas que suprem sua necessidade
leite. Seus produtos lácteos, industrializados em 11
linhas de produção, levam ao mercado 160 mil
toneladas de derivados de leite por ano, exigindo algo em
torno de 800 mil litros de leite/dia em estado de matéria-prima.
A Cooperativa Agropecuária Castrolanda, por exemplo,
que entrega de 5 milhões e 300 mil a 6,5 milhões
de litros de leite/ mês à companhia, utiliza
recursos próprios para incrementar a produção
leiteira no campo. Lá, quatro projetos técnicos
compõem o esquema de empréstimo a produtores:
aquisição de animais até 24 meses; investimento
de tanques de resfriamento, equipamentos para sala de ordenha
e construção de estábulo; compra de insumos
de inverno; e plantio de verão, principalmente milho
e sorgo. Atualmente, dos 230 cooperados, 40 ainda trabalham
com entregas em latão, mas o objetivo é que,
até o final do ano, todos forneçam o leite resfriado.
desde meados de 1998, o produtor que o entrega a temperatura
entre 4ºC e 8ºC recebe uma bonificação
de 5% no preço do litro, comente o gerente de
Pecuária Gilberto Borges da Silveira.
De acordo com lê, a região de Castro apresentou
uma atuação profissional na atividade leiteira.
O processo de granelização vem ocorrendo há
mais de 20 anos e faltam entrar no esquema somente os pequenos
produtores. O montante disponibilizado pela Castrolanda é
parte dos recursos capitalizado ao longo dos anos, que, agora,
retorna ao pecuarista em forma de financiamento. Os juros
são os mesmos do crédito rural, 8,75% aa, com
limite de endividamento de 7% a 15% sobre a produção
mensal do produtor. Para a adesão das 40 propriedades
que ainda faltam, vamos usar entre R$ 1 milhão a R$
1,5 milhão, prevê Silveira.
Atuando com captação no Estado de São
Paulo, sul de Minas Gerais, norte do Paraná e sul do
Mato Grosso do Sul, o Grupo Vigor contabiliza a participação
de sete mil produtores em seu programa de incentivo tecnológico.
Com financiamentos oferecidos para tanques de resfriamento
e ordenhadeira, a empresa também possui linhas para
alimentação em épocas de entressafra.
Todos com recursos de terceiros, provenientes de instituições
financeiras. Segundo o gerente de Relação com
o Mercado, Marco Antônio de Almeida Panza, há
pelo menos 10 anos a companhia desloca técnicos agropecuários
para acompanhar a performance dos animais até a ordenha.
Para esse nosso fornecedor, a propriedade tem de apresentar
condições básicas de higiene, plantel
saudável, qualidade no leite e, claro, estar em uma
das regiões de atuação do Grupo Vigor.
Adoção
de adiantamentos
Detentora
das marcas Leco, Flor da Nata, DanVigor e Vigor, a empresa
começou sua história fabricando leite em pó,
em 1917. Com tempo foi ampliada e passou a distribuir leite
pasteurizado e engarrafado, queijos, cremes e manteiga. Apostamos
no desenvolvimento tecnológico do campo para qualidade
de nosso principal insumo, o leite. É por isso que
damos suporte a fornecedores rurais, no sentido de aumentar
a produtividade, reduzir custos, para sempre melhoramos nossos
produtos já em estado primário.
Não
menos preocupada com o desenvolvimento na pecuária
leiteira, a Parmalat, há três anos, implantou
o Departamento de Assistência ao Produtor Parmalat (DAPP).
Trata-se de um setor que direciona suas atividades à
difusão de tecnologia no campo. Dentre suas ações,
destacam-se as Unidades Demonstrativas. São fazendas
que recebem intenso trabalho de assistência, com o propósito
de transformá-las em casos de sucesso. Quando a propriedade
começa a registrar resultados positivos, a experiência
é apresentada aos produtores das cidades vizinhas.
Graças a essa iniciativa, um produtor da região
de Fernandópolis (SP), que obtinha 130 litros de leite/dia,
há sete meses já está batendo na marca
dos 310 litros, sem mexer no rebanho, apenas aumentando a
eficiência da propriedade.
Para uma captação média de 2,5 milhões
a 3 milhões de litros de leite/dia, a empresa conta
com cerca de 20 mil pecuaristas em todo o País. Aos
interessados em crescer no negócio leiteiro, a Parmalat
disponibiliza recursos para serem utilizados na produção
de volumosos. Segundo o gerente Nacional do DAPP, ligado à
diretoria de Política Leiteira, Edson Gonçalves,
a verba é fornecida como adiantamento e a prestação
mensal não pode ultrapassar 30% da renda líquida
do produtor. Os valores são descontados do pagamento
do volume de leite que cada propriedade entrega à empresa.
No entanto, é importante dizer que, para ter acesso
aos empréstimos, o projeto deve ser aprovado pelo DAPP.
Outro sistema adotado pela companhia são os convênios
com empresas de insumos e equipamentos. Nesses casos, os produtores
adquirem matérias em condições especiais,
cujas parcelas a Parmalat também desconta do montante
referente a cada pecuarista, ficando encarregada de quitar
a dívida com os fornecedores.
Por sua vez, a Nestlé aparece com um importante fomentador
de tecnologia no campo. Dados da empresa indicam que, desde
a década de 50, a companhia tem esse tipo de preocupação
em sua política administrativa. Atualmente, com recursos
próprios, da linha de crédito rural e provenientes
do BNDES, cerca de 25.000 produtores vêm sendo beneficiados
com o programa coordenado pela indústria. Com juros
subsidiados, faz-se adiantamentos para todas as etapas de
produção. O leite representa algo em torno de
22% de toda matéria-prima utilizada pela Nestlé.
A implementação do leite resfriado vem sendo
trabalhada junto a seus 35 mil fornecedores. A previsão
é de que, até o ano 2000, todo o leite processado
nas unidades da empresa seja coletado a granel. Em 1998, 94%
do leite comprado pela companhia foi proveniente de aquisições
diretas a produtores rurais e o restante (6%), de cooperativas.
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