Com
o impeachment de Collor e a ocupação do cargo,
em 1992, pelo vice Itamar Franco, foi adotado um ritmo mais
lento para implementação do processo, até
julho de 1994, quando foi lançado o Plano Real, que
pavimentou os caminhos para a eleição, no mesmo
ano, de Fernando Henrique Cardoso para o presidente. Ao tomar
posse, em janeiro de 95, o novo chefe de governo acelera o
ingresso do País na chamada globalização,
sem dar mostras de estar muito preocupado com as conseqüências
dessa decisão. Seguindo à risca a cartilha neoliberal,
que prega o Estado mínimo, o Estado mínimo dá
maior agilidade ao plano de desestatização e
limita apenas ao necessário a interferência do
poder público na economia.
A
internacionalização econômica do Brasil
foi traumática em setores e sub-setores do comércio,
da indústria e até da agropecuária que,
de resto, serviu como âncora para a estabilidade monetária
prometida pela reformulação da economia. A penalização
do setor agrícola ocorreu porque, ao contrário
do esperado, o neoliberalismo não derrubou o protecionismo
exacerbado existente nos países ricos. Aconteceu inverso,
pois houve uma escalada protecionista houve uma escala protecionista
sem precedentes, prejudicando a agricultura das nações
subdesenvolvidas ou emergentes, na linguagem neoliberal, inclusive
do Brasil.
A pesquisadora Maria Auxiliadora de Carvalho, do IEA - Instituto
de Economia Agrícola, da secretaria de Agricultura
paulista, diz que a PAC- Política Agrícola comum,
da União Européia, foi a grande responsável
pelo crescimento do protecionismo entre os países desenvolvidos.
Os estímulos aos aumentos de produção
e produtividade provocaram acúmulos de excedentes,
com custos elevados para o poder público. Houve tímidas
tentativas de reforma da PAC, mas a pressão efetuada
pelos beneficiários acabou prevalecendo. A continuidade
dos incentivos à produção elevavam os
estoques e, em consequência, as despesas. A solução
foi a desova dessa estocagem no mercado internacional, a preços
subsidiados, comprometendo a competitividade da agricultura
do Terceiro Mundo.
A gestão da primeira ministra Margareth Tatcher, da
Inglaterra, em 1979, é considerada como marco nas divulgações
da teoria neoliberal. Entre 1978 e 1995, o comércio
mundial cresceu a uma taxa média de 7%. Isolada, a
agropecuária teve um crescimento modesto, em torno
de 4,5%. Mas houve diferenças, ainda conforme a pesquisadora.
Nesse período, as exportações dos países
ricos evoluíram em 4,8%, ao ano, e as importações,
em 4,2% aa. As nações emergentes, ao contrário,
registram maior expansão das importações
e uma quase retração nas exportações,
com as receitas aumentando em 2,9% e um acréscimo de
3,7% nas despesas.
Maria Auxiliadora destaca, também, que o desempenho
não foi homogêneo entre os ricos. As vendas da
União Européia cresceram 7% ao ano, em média,
e a importação bateu em 4,8%. Os Estados Unidos,
país considerado o maior exportador agrícola
mundial, registraram uma evolução média
de 2,6% aa, nas exportações, e de 4,1% nas importações.
O desempenho do Brasil também foi desfavorável,
pois entre 78 e 95, as exportações cresceram
2,1% ao ano, enquanto as importações se expandiram
em 4,7% ao ano. Segundo ela, a agropecuária brasileira,
desde 60, registra uma perda significativa de competitividade.
Nos anos 80 não só houve queda nas exportações,
mas também aumentou nas importações.
Não obstante, o setor sempre representou importante
fonte de divisas para o País e, mais recentemente,
tem mostrado um desempenho bastante satisfatório.
Com reforço de argumento, Auxiliadora lembra que as
vendas externas da agroindústria, entre 92 e 93, representaram
34% das receitas totais do comércio internacional e
ficaram próximas de 40% com a estabilidade econômica.
O setor, em 92, participava com 13,7% do total exportado,
situou-se em 16% entre 93 e 96 e caiu para 13,3% em 97. Isso
significa que, no período recente, a agricultura vem
apresentando melhor desempenho nas exportações
que o restante da economia, pondera. Essa superioridade se
deve ao maior crescimento das vendas (12% aa) em relação
aos demais produtos (6%), com uma taxa média de *%
no aumento das receitas.
A pesquisadora chama a atenção para o fato de
que a maior parte dos dólares ainda provêem de
poucos produtos tradicionais da pauta de exportação,
como café e derivados, açúcar, alimentos
para animais, sementes oleginosas e fumo que, juntos, representaram,
em 97, 55, 7% da renda da agroindústria no mercado
internacional. As importações, acrescenta, também
são concentradas pois cereais e algodão representam
quase 30% dos gastos com produtos agroindustriais. Somados
aos papel, pasta celulósica e laticínios, pode-se
constatar um gasto de 44% das despesas totais.
Maria Auxiliadora reitera que a pregação neoliberal
dos ricos não foi suficiente para promover alterações
na política agrícola do mundo desenvolvido.
Houve uma brusca expansão do protecionismo e as chamadas
nações emergentes ou subdesenvolvidas em particular
as mais endividadas foram induzidas a acatar o receituário
do consenso de Washington que implicou, entre outras coisas,
no abandono de suas políticas setoriais e a rápida
abertura de suas economias com custos sociais elevados.
Para ela, o Brasil não fugiu à regra. Especificamente
para a agricultura, a política ambiciosa iniciada em
meados dos anos 60, que visava modernizar o setor e prepará-lo
para sustentar o desenvolvimento econômico do País,
começou a ser desarticulada no final da década
seguinte, processo que foi acelerado após a crise da
dívida externa. Daí em diante predominou, com
algumas exceções impostas pela gravidade dos
problemas, a prática da não intervenção
agravada, nos anos 90, pela maior abertura comercial. Sem
apoio do governo e enfrentando a concorrência dos produtos
subsidiados pela nações ricas, a agropecuária
brasileira perdeu competitividade sentencia.
Além disso, acrescenta, aos preços internacionais
deprimidos pelas barreiras protecionistas, soma-se a valorização
da moeda brasileira, fatores que reduzem os ganhos do setor
em benefício dos consumidores e contribuem, significativamente,
para a estabilidade econômica. Apesar disso, as estatísticas
mostram saldos positivos no comércio agropecuário,
revelando uma grande vantagem comparativa do Brasil nessa
atividade, aponta.
Maria Auxiliadora acredita que as perspectivas de melhoria
imediata são mínimas. Mesmo de melhora imediata
são mínimas. Mesmo porque, as negociações
sobre uma redução do protecionismo só
devem surtir efeito significativo a médio prazo. Nem
a pauta de reuniões da OMC- Organização
Mundial do Comércio, que vai discutir a agricultura
no ano 2000, permite prever algum avanço em termos
de liberalização. Até porque, desemprego
e outros problemas sociais acabam esvaziando expectativas
de sucesso do livre funcionamento do mercado.
No âmbito interno, ainda segundo a pesquisadora, também
fica difícil fazer previsões sobre mudanças
imediatas. Para sustentar o plano de estabilização
econômica é necessário manter baixos os
preços agrícolas, meta que tem sido ajudada
pela abertura comercial. Além disso, a conjuntura atual
impõe sérias restrições, em particular
de natureza orçamentária, o poder público
não está condições de implementar
uma política agrícola capaz de reverter o quadro.
Em função desses constrangimentos, pode-se concluir
que, pelo menos para a agricultura brasileira, a liberdade
de mercado, adotada há algum tempo, terá continuidade,
finaliza.
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